A Garganta da Serpente
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A Complexa Rede de Inter-relações Culturais e Literárias Estabelecidas por Meio da Internet

(Abilio Terra Junior)

Já há alguns anos venho participando de um fértil intercâmbio cultural e, em particular, literário, através do virtual, complexo e ágil espaço cibernético.

Nesse ínterim, conheci autores, leitores, editores, webmasters, divulgadores culturais, travei novas amizades, participei de grupos de discussão e de fóruns literários, estudei em um curso on-line, desenvolvo a minha homepage ou site pessoal, escrevi quatro e-books ou livros virtuais de poesia e dois de contos e crônicas, publiquei um livro de poesia impresso, e continuo escrevendo, principalmente, poemas, tendo já material para um novo livro.

É, sem dúvida, uma vasta experiência, propiciada por esta imensa rede, complexa e fascinante, que nos foi trazida pelo computador.

Não pretendo fazer aqui, perante esta seleta platéia, composta por professores, estudiosos de várias áreas do conhecimento, autores, editores e pesquisadores, a apologia do computador.

Creio que este já se impôs por si mesmo, sendo hoje utilizado por profissionais de todas as áreas, empresas de pequeno, médio e grande porte, intelectuais, alunos, e, em geral, milhões de internautas de todas as partes do mundo, que o usam com objetivos, desde os mais elevados, até os mais escusos, diga-se de passagem.

Sim, pois trata-se de gente, de carne e osso, frente à "telinha", de todas as faixas etárias e níveis de conhecimento e experiência, que utilizam este meio para expressar a sua sapiência, assim como as suas emoções, sentimentos, ideais, anseios, expectativas, sem o que, o computador quedaria inerte, surdo e mudo.

Com relação ao tópico literatura, objeto do interesse de todos nós aqui presentes, há uma efervescência na Internet, digna de nota, e já objeto do estudo e do interesse de muitos estudiosos e pesquisadores, que discutem todos os seus aspectos.

Há milhares de sites literários, blogs, livros virtuais, grupos de discussão, fóruns, que se multiplicam a cada dia que passa.

Através dos blogs, em que o autor expressa os seus pontos de vista cotidianos sobre os mais variados assuntos, já se destacaram alguns autores, que, inclusive, publicaram livros no formato impresso e já ocupam o seu lugar no amplo universo literário nacional.

Os e-books ou livros virtuais também constituem um capítulo à parte.

O autor escreve o seu livro e, após concluí-lo, o envia por e-mail para o webmaster do site literário do qual participa.

Em alguns dias, recebe o e-book em fase de pré-edição eletrônica.

Após dar o seu "de acordo", o e-book entra na rede, ou seja, é inserido no site literário.

Ali, estará disponível, a partir daí, para leitores de todo o mundo.

Bastará um simples "download", ou seja, baixar o arquivo para o computador do leitor, e o livro poderá ser lido e relido a vontade, na maioria das vezes, gratuitamente.

O custo da edição eletrônica é irrisório, se comparado ao de uma publicação impressa.

Neste ponto, surgem diversas indagações.

Vale a pena a edição eletrônica, tendo em vista que não se venderá o livro, ou seja, não haverá um retorno financeiro, geralmente?

A resposta, evidentemente, é individual.

Outra questão: o livro virtual é lido?

Posso afirmar que sim, pois já tive a oportunidade de participar, durante anos, de um site literário, o Hotbook, que, na época, apresentava, ao fim de cada mês, a contagem do número de downloads, e constatei que os e-books da minha autoria, assim como os de outros autores, alcançaram números expressivos, com milhares de downloads.

Com relação ao retorno financeiro, proporcionado pela venda do livro impresso, creio ser este muito relativo, no caso de um autor iniciante e/ou pouco conhecido, em razão de, regra geral, a estrutura de distribuição de livros ainda deixar muito a desejar.

Sem contar que os custos de uma edição impressa, em geral, e os da publicidade, para que o livro se torne "visível" ao público, ainda são muito elevados, em nosso país, para grande parte dos autores.

Para os que se cansam ao ler o livro na "telinha" do computador, há a opção de imprimir o livro.

Sem dúvida, são apenas folhas impressas, sem o inegável "charme" do livro impresso.

Quanto a isto, não há discussão.

A propósito, não acredito que o livro virtual surgiu com o fim de "desbancar" o livro impresso.

Acredito mesmo que ambos podem conviver em plena harmonia e que cada autor escolhe aquele meio que lhe for mais acessível e do seu interesse.

Da mesma forma que a televisão não substituiu o rádio, apesar dos prognósticos neste sentido, nos primeiros tempos, quando esta surgiu.

Ambos continuam pujantes e em franco progresso: está surgindo agora o rádio digital , ao lado da TV digital.

Cabe mencionar que também há a opção de editar o e-book na versão "palm e-book", um "e-book reader", que permite que este seja lido em qualquer local, independente do computador: em uma viagem, em uma sala de espera de um consultório, e assim por diante.

Isto permite a mobilidade do leitor, mesmo ainda usando o meio eletrônico ou virtual, ou seja, o "palm", um "e-book reader".

Como já mencionei, diversos autores expressaram as suas opiniões sobre este complexo assunto.

Gostaria de transcrever o artigo "Efeito E-Book", de Juliana Simão, editado pelo site "Dinheiro na Web" em 14/09/2000, pois este apresenta uma visão lúcida desta questão.

Assinalo que quando a autora menciona "e-book", está se referindo, na verdade, ao "e-book reader".

"Desde os tempos dos gregos, quando os livros eram escritos em pele animal, o mundo editorial não se deparava com tamanha agitação".

No epicentro desta revolução está o e-book ou livro virtual, um computador portátil de leitura que tomou conta do mundo, ameaçando o reinado do papel e tinta.

Na indústria de tecnologia, ele é sinônimo de lucros - está entre as novidades mais vendidas do ano.

Para editoras, um aliado na tentativa de aumentar o faturamento.

E para os leitores, significa economia de tempo e dinheiro.

O e-book parece livro, tem formato de livro, mas não é livro.

Trata-se de um leitor digital que armazena até quatro mil páginas, algo em torno de dez obras, em sua memória...

Baixar um livro inteiro da rede não costuma durar mais de cinco minutos.

O furacão digital já criou no Brasil uma rede de pequenas editoras on-line.

A iEditora foi pioneira.

Lançada no mês passado, ela edita, distribui e vende livros digitalizados, via Internet.

São 1.400 títulos de 30 editoras, entre elas Nobel e Melhoramentos.

Em poucas semanas, vendeu 1.200 livros...

Nos EUA, o e-book virou febre.

Lançado em julho de 1998, e custando entre US$200 e US$600, o aparelho vende muito.

Por aqui, quem tem comprou em viagens ou em lojas virtuais.

Os principais fabricantes, Nuvo media e SoftPress, não divulgam números, mas se dizem "surpresos com as vendas".

Eufemismo para dizer que, sim, venderam acima da expectativa.

Se o sucesso dos aparelhos ainda tem números, pode-se ter uma idéia do tamanho do mercado que o circunda: o das e-editoras que fornecem conteúdo digital.

Só as americanas jogarão na Internet este ano, 150 mil novos títulos - batendo os lançamentos em papel. Hoje, o mercado editorial é o maior interessado em popularizar o e-book.

Grandes editoras, como Penguin, RandomHouse, Simon & Schuster e HarperCollins descobriram um novo, e barato, canal de distribuição de literatura.

Basta transformar palavras impressas em pixels (a linguagem digital).

Para o mercado editorial brasileiro, cujo faturamento despencou 21% em 99, não poderia existir notícia melhor.

Levantamento da Câmara Brasileira de Livros mostra que as vendas caíram de R$369 milhões para R$295 milhões.

O diagnóstico?

"O livro concorre com a Internet, uma forma de informação a custos mais baixos", afirma o relatório.

Só por aqui, acreditam algumas editoras, o livro digital poderá alavancar em 30% o faturamento da indústria.

"Se esta for a evolução do livro, seguiremos a tendência", pondera Pedro Herz, da Editora e Livraria Cultura.

Parte do sucesso do e-book são os custos envolvidos.

Bem menores, é claro.

Tome-se como exemplo um editor tradicional.

Para lançar 3 mil exemplares gasta-se R$10 mil.

No sistema eletrônico, cada livro é digitalizado uma única vez, ao custo de R$100.

E acabaram-se os gastos!

Se ele vender dez livros ou dez mil livros, seus custos físicos são iguais.

"Na edição tradicional, tenho de vender 50% do total apenas para cobrir meus gastos", compara Sérgio Benclowicz, diretor de marketing da Nobel, a terceira maior editora brasileira, com faturamento anual de R$40 milhões.

Rompendo a tradição familiar, de 58 anos de mercado, a Nobel começa a vender literatura digital nos sites de editoras virtuais.

"Meus custos vão cair muito", diz Bruno Lerner, diretor-geral da Editora Melhoramentos, que também apostou no segmento.

"Não é competição. É um novo canal de distribuição".

Apesar disso, ninguém é louco de dizer que os e-books substituirão o livro de verdade.

As telas dos equipamentos não têm boa definição.

Falta cor e há problemas gravíssimos de bateria - o livro "funciona" entre 4 e 9 horas por dia...

E há o principal dos problemas: alterar o hábito ancestral da leitura em papel.

"Existe uma ligação emocional entre o leitor e os livros físicos que não vai acabar tão cedo", lembra Luiz Schwarz, da Companhia das Letras.

É uma mudança que certamente não pegará entre os mais velhos.

Mas as crianças de hoje poderão crescer com um único "livro" - e ainda ter uma biblioteca maior que a de seus avós".

O site Hotbook, dirigido pelo casal Roberta Rizzo e Johnny Câmara Oliveira, é também pioneiro em e-book no Brasil, lançado em 25/02/2000. Possui o recurso "palm e-book", sendo que o meu livro de poesia "Os Homens Pássaros" está disponível ao público neste formato.

Já o site Portal Cá Estamos Nós - CEN, fundado em 15/07/98, é dirigido pelo jornalista português Carlos Leite Ribeiro, que me designou Representante desse Portal neste Encontro de Escritores. Estou às ordens de todos para quaisquer informações que desejarem saber sobre o CEN.

O CEN possui a sua Biblioteca Virtual, composta por livros virtuais de diversos autores brasileiros e portugueses.

Estes livros são acessados por leitores de todos os países de língua portuguesa, bem como, de núcleos lusófonos espalhados por todo o mundo.

Venho participando, também, do Movimento Poético Internacional "Poetas Del Mundo", cujo Secretário-Geral é o poeta Ariasmanzo e a Embaixadora no Brasil a poetisa Delasnieve Daspet; exerço a função de Cônsul em Belo Horizonte - MG.

O escritor Urariano Mota escreveu em "Questões sobre literatura e Internet", publicado em "La Insignia", em resposta à pergunta "existe uma literatura que se tornou possível pela Internet?":

-Sim, existe uma literatura que se tornou possível pela Internet.

Ela vem nos blogs, nos diários eletrônicos, nos mais diversos nomes com que se abre na rede.

Sim, existe, porque a Internet abriu e fendeu e fez incisão no mundo fechado das comunicações.

Ela, Internet, é um extraordinário avanço nas diversas tentativas que a criação fez para demolir o espaço antidemocrático de jornais, livros e editoras."

Ele termina seu artigo, respondendo à pergunta: "o que mudou na sua forma de escrever, ao passar da máquina ao computador?"

-Eu não sei bem se foi a passagem da máquina de escrever ao computador, da máquina à Internet. Eu não sei, amigos.

Mas depois de 30 anos entre uma coisa e outra, eu posso dizer da excelência da qualidade que nunca tive.

Acreditem, amigos, acreditem como acreditam nas possibilidades infinitas do inferno: creiam-me, este autor que lhes fala já foi muito pior."

A globalização provocou, ao lado de fatos positivos, inúmeras distorções nas relações culturais, econômicas e sociais, em todo o mundo.

Penso que a Internet, apesar de pertencer, também a este processo, atenuou, de certa forma, estas distorções.

Assim, está permitindo que membros das classes menos favorecidas encontrem meios para se desenvolverem em uma profissão, através dos cursos na área de informática, hoje existentes em profusão, e, assim, ascendam, econômica e socialmente.

Alunos de escolas da periferia das grandes cidades estão tendo seus contatos com computadores de baixo custo, desenvolvidos por faculdades de informática, aqui mesmo, em nosso Estado de Minas Gerais.

Isto está lhes abrindo novas portas ao conhecimento e à experiência, que os livrará do caminho do crime e do vício, encaminhando-os a novos rumos e perspectivas em suas vidas.

No México, já há alguns anos, todos os alunos de escolas públicas utilizam computadores do sistema Linux, de sinal aberto, e o mesmo está ocorrendo em diversos outros países, tanto periféricos como desenvolvidos; em parte, inclusive, em nosso País, e em nosso Estado.

Isto lhes permitirá desenvolver seus próprios programas de computador e trocar informações com outros usuários do mesmo sistema.

Penso que, a médio e a longo prazo, se acentuará esta tendência, das editoras convencionais utilizarem a Internet para difusão dos seus livros, reduzindo os seus custos, em intercâmbio com as editoras virtuais.

Assim como se aumentará o uso dos "e-books readers" em todo o mundo, acentuando, igualmente, a expansão das editoras virtuais.

As livrarias também utilizarão cada vez mais os recursos virtuais, seja para aumentarem a sua produtividade como empresas, seja para divulgação e venda dos seus livros.

No Festival de Poesia de Goyaz, realizado de 23 a 26/03/2006, na cidade de mesmo nome, o poeta Ivan Junqueira, ex-presidente da Academia Brasileira de Letras, indagou a uma mesa-redonda de editores, o porquê desta incrível distorção que há no Brasil, de existir um número muito maior de editoras do que de livrarias.

Não sei se a Internet conseguirá também atenuar esta distorção.

Mas, sem dúvida, precisamos, urgentemente, de um maior número de livrarias em nosso País.

E que o livro se torne acessível a um número cada vez mais expressivo de cidadãos.

Com a Internet, sem dúvida, há a possibilidade de se acrescer este número, através do acesso aos livros virtuais.

Bem como, através da Internet, um autor brasileiro poderá ter o grato prazer de ter o seu livro virtual lido na China, por um brasileiro ou por um chinês que, porventura, tenha aprendido o português.

(9º. Encontro Estadual de Escritores - São Lourenço, Minas Gerais, 08/07/2006)

  • Publicado em: 18/07/2006
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