A palavra é o melhor e o mais impreciso meio de representar o real. E
o real é fluido. A palavra representa o esforço do homem para
aprisionar, traduzir, decodificar e até reinventar a fluidez do real.
É instrumento precário e, ao mesmo tempo, único, original,
deslumbrante.
O poeta é um ser solitário, sensível e diferente, que se
torna cúmplice do processo através do qual a palavra impera sobre
o homem, ao mesmo tempo em que precisa ser por ele domada, conhecida, vencida.
O poema nasce do esforço de obter da palavra o máximo de precisão,
expressão, submissão e, ao mesmo tempo, beleza, variedade, ambigüidade
e semitons. O poema, se alimenta da relação entre essas duas ambigüidades
resolvidas quando há a conquista da clareza. Mas é busca interminável
luta para conciliar o caráter escorregadio da palavra com o sentido das
coisas. Para o poeta a palavra deve ser deusa e serva.
O poeta é também imperador e servo no reinado de palavras em busca
do sentido. Do sentido oculto principalmente. A vida inteira dedica-se a garimpar
palavras e a fazer perguntas inquietantes - mas esclarecedoras - sobre o sentido
da vida. Para tal, nada mais preciso e penetrante que a poesia porque ela opera
com o "verso" das coisas através do sentido das palavras. Através
do sentido, do sentimento e da beleza, abrem-se o espírito e a razão
para os clarões das fugidias verdades. Apenas com isso podemos contar,
pois somos seres afundados de modo irremediável na dúvida sobre
a vida, a morte, o tempo e o universo. Para tal, só essa forma inusitada
de humor que é a poesia. Por isso, costumo dizer que o poeta é
o humorista da estranheza. Seu estranhar o mundo, as coisas e o homem determina
uma forma de humor, às vezes amargo, ora metafísico ou filosófico
que reflete a percepção sempre fugidia do mistério e a
apreensão sempre imperfeita da exatidão ou da diafania da palavra.
Que tal comprar um livro de Artur da Távola? O Jugo das Palavras |