Quem constrói a língua somos nós, portanto, se as regras
gramaticais são complicadas, nós mesmos é que as complicamos.
Os estudiosos descobrem a estrutura da língua num momento e tenta congelá-las,
por isso os gramáticos são conservadores, demoram para incorporar
uma mudança que há muito já foi assumida pelos usuários
da língua.
Exemplo disso é a regência do verbo preferir:
Prefiro mais leite do que refrigerante. (Regência popular.)
Prefiro leite a refrigerante. (Regência culta, padrão.)
Além disso, há a coerência do sistema, que é uma luta
dos gramáticos. Exemplo de violação do sistema, que já
foi incorporada à gramática culta, é o pronome de tratamento
"Vossa Senhoria" (e outros, com vossa) ter o verbo na 3ª pessoa,
enquanto "vossa" é pronome possessivo de "vós",
2ª pessoa do plural.
Este medo das regras gramaticais não acontece só no português.
Veja o que Donald Weiss, professor norte-americano, escreveu a respeito:
"Embora o simples pensamento de usar as regras de gramática amedronte
muita gente, elas não percebem que as empregam o tempo todo. As regras,
de fato, refletem como os indivíduos se comunicam eficazmente. Mesmo a
gíria de ruas possui suas formas gramaticais próprias.
As regras gramaticais não passam de um esquema, um método para organizar
as palavras em padrões que unificam as intenções de um indivíduo
com a interpretação de outro. Ao contrário dos bichos-papões
inventados pelos profesores na infância, as regras não são
inflexíveis, rígidas e elitistas, mas se modificam com o tempo e
as pessoas. Sofrem modificações mas não se rompem a ponto
de se transformarem em algo completamente diferente do que eram.
Só menciono as regras gramaticais porque formam o elemento básico
da organização de qualquer forma de comunicação escrita
ou oral, e também para salientar que quase todos nós crescemos usando
regras mesmo sem conhecê-las. Costumamos falar com sentenças gramaticalmente
corretas e, às vezes, com outras complexas. Utilizamos substantivos, verbos,
adjetivos e advérbios colocados numa seqüência adequada de sujeito
e predicado, e nunca paramos para pensar sobre isso. Somente quando paramos para
pensar é que sentimos medo. É o mesmo que tentar dizer em vez de
mostrar como fazer um nó de gravata ou amarrar os sapatos."