O contraponto é sempre o melhor sumo do diálogo, no jogo asseado
das idéias. Já escrevi para revistas de circulação
nacional, sites, jornais e blogs. Aqui e ali lia alguém comentando a
respeito. Sempre vi isso como alimento das minhas idéias. Na verdade,
concordar ou não com algo escrito por outra pessoa pode ser considerado
normal. O que, convenhamos, não é muito normal é quando
o autor do próprio texto acaba não concordando com o que escreveu
e publicou. Não é esse exatamente o caso, mas pensei nisso quando
recebi e-mail do escritor e professor Ítalo Moroconi acerca de um texto
que divulguei no meu blog Pele Sem Pele
e distribuí para alguns e-mails da minha lista de endereços eletrônicos,
recentemente. Na oportunidade me referi a professores que não apenas
desconheciam, mas abominavam a literatura contemporânea.
Na verdade não era exatamente isso que o texto abordava. Esse elemento
foi pinçado pelo escritor que contestou, afirmando que no Rio e São
Paulo existem muitos professores atentos à produção contemporânea.
Não duvido. Eu sei disso. Na verdade, este não é um privilégio
do Rio e São Paulo que, convenhamos, nunca foi e agora mais do que nunca
não é mais o centro nevrálgico do pensamento brasileiro.
Existem professores em Minas (e eu citei Anelito de Oliveira), aqui na Paraíba
(citei Amador ribeiro Neto), no interior de São Paulo, no Pará
e em muitos outros lugares, atentos à produção contemporânea.
Infelizmente, também, existem aqueles que simplesmente abominam qualquer
movimento em direção à literatura contemporânea.
Este é um fato inquestionável. Entrementes, não era este
o foco do artigo. A menos que eu tenha perdido meu próprio foco.
Eu abordava a produção contemporânea a partir da internet
e seus veículos. Não citei, mas, por exemplo, muito me impressionou
um poema de Luciana Marinho no meu Orkut. Por falar nisso, Luciana é
professora do curso de Letras da Universo, em Recife. Uma universidade particular
onde a literatura contemporânea também não é ignorada.
Estarmos vivenciando uma relação midiática cujas reações
são imediatas e o peso que isso tem na própria produção
literária. Foi exatamente isto que aguçou meu pensamento. Para
citar mais um exemplo, recentemente escrevi o prefácio do livro "Solacio",
da poeta Valéria Tarelho, de São José dos Campos-SP. O
livro vai sair em edição nacional, pela editora Landy, dentro
da coleção Alguidar, organizada pelo poeta Frederico Barbosa.
Minha reflexão partia de conversas com amigos na própria internet.
Valéria, por exemplo, escreve poemas há sete anos apenas. É
uma leitora voraz dos clássicos, uma pessoa culta, mas também
é leitora da produção que circula na internet. Até
mesmo a produção inédita como a sua. Será que isso
não teve e não tem influência alguma na sua poesia? Duvido
muito. Para os poetas que freqüentam o Orkut e o twitter, por exemplo,
estes são também excelentes instrumentos para a veiculação
de boa poesia e idéias sobre poesia. No meu Orkut, por exemplo, afloram
textos de Helberto Helder, Nuno Júdice, Hopkins, João Cabral e
outros poetas. Presentes deixados por amigos e amigas, cuja sensibilidade não
foi suprimida pela tecnologia. São meus amigos de Orkut, nomes representativos
da poesia brasileira contemporânea, como Ricardo Silvestrin, Ronald Augusto,
Cláudio Daniel, Frederico Barbosa, Antônio Mariano, Lucila Nogueira,
a própria Valéria Tarelho e outros bons poetas da rede e da cama
de palhas da realidade. Este artigo, bem como o anterior, tem como veículo
o blog Pele Sem Pele e algumas colunas que possuo em sites, como El Theatro .
Na verdade, creio que precisamos estar atentos ao que está em movimento.
A internet, com certeza, revolucionou os métodos de divulgação
da literatura contemporânea. E sem desconstruir o que os cordelistas já
faziam há cem anos ou mais. Até mesmo as grandes editoras e as
grandes redes de livrarias usam a web para a afirmação dos seus
negócios e para a ampliação da sua lucratividade. Mas,
não era exatamente a isto que eu me referia. Logicamente, sem a pretensão
de esgotar o assunto num artigo de duas laudas e meia, no máximo três,
um assunto de tamanha densidade e relevância, eu abordava a repercussão
desse processo na própria linguagem poética do século XXI.
Este é o fato central do meu raciocínio que, posso concordar,
talvez não estivesse muito bem colocado. É certo que abomino a
ignorância como método de estudo. O fato de alguém estudar
Camões, por exemplo, não o impede de conhecer e admirar, por exemplo,
as vanguardas que despontavam em regiões fora do eixo. Cito aqui a importância
quase desconhecida do Rio Grande do Norte para a poesia de vanguarda brasileira,
nos anos 60, 70 e mesmo nos dias de hoje.
Penso que a evolução da linguagem poética deve-se, muito
especialmente, à capacidade de atenção dos pensadores desta
produção aos menores movimentos da língua e seus afluentes
na cadeia produtiva do conhecimento. Recentemente li uma reportagem sobre a
influência do chamado "internetês" no ensino da língua
portuguesa. Ou será que alguma espécie de germe erudito impede
os professores de língua portuguesa do ensino fundamental, principalmente,
de avaliar o fato de seus alunos passarem boa parte do dia no MSN, escrevendo
coisas como vc tc de onde? (você tecla de onde?). É certo que as
pesquisas ainda apontam opiniões desfavoráveis ao enriquecimento
da língua com fatos desta natureza. No entanto, sinto uma vontade enorme
de questionar as pesquisas (78% é o índice desfavorável)
se não houver uma capitulação ao internetês. O que
seria mais prejudicial ao estudo da língua portuguesa? O internetês
ou a supressão do estudo do Latim nas escolas brasileiras?
Logicamente que outras oportunidades deverão me remeter ao tema que,
cá pra nós, muito me agrada pela sua capacidade de convulsionar
o pensamento. Quando se trata de pesquisa da linguagem poética (ou de
qualquer linguagem artística), não se pode suprimir absolutamente
nada. Mesmo as questões ditas abomináveis. Neste tempo de velocidades
no qual estamos mergulhados, muito especialmente as certezas são questionáveis.
As verdades absolutas são atestados de incompetência teórica.
Idéias calcadas em preconceito de qualquer espécie, penso eu,
não combinam com o distanciamento histórico (e não estético)
das idéias de Aristóteles, Longino e Horácio. Estamos praticamente
concluindo a primeira década do século XXI. Posso estar enganado,
mas tenho visto ainda uma preocupação despreocupada das universidades
com o pensamento contemporâneo. Ou pelo menos, penso que a universidade
continua com a velha mania de produzir para seus próprios ambientes.
Não sei se isso é bom ou ruim, mas a produção do
pensamento contemporâneo já não possui tanto assim o campus
como limite geográfico da produção intelectual.
Antes que me submetam a uma pregação metodológica, este
texto - tanto quanto o anterior -não tem pretensões ensaísticas.
Apenas levanto uma lebre sem pele sobre as agonias que perpassam um mundo que
vive hoje outros dramas, outras inquisições. Uma delas é
a abolição do pensamento enquanto vetor principal para o trem
da história.