A Garganta da Serpente
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O primeiro momento literário do Brasil

(Madalena Barranco)

O que pensas Pero Vaz
da natureza que vês?
Suspira o anjo dos inocentes
de peitos fortes e nus.

São vermelhos
e querem ser nossos espelhos!

E vós o que fazeis?!
Queremos ouro em troca
para urdir a toga
do rei.

(Madalena Barranco)

Pero Vaz de Caminha, escrivão da frota de Pedro Álvares Cabral foi responsável pelo marco zero da Literatura Brasileira, quando escreveu ao rei de Portugal, D. Manuel no dia 1º de maio de 1500 a "Carta de Achamento" do nosso Brasil. Essa relíquia da literatura só foi publicada em 1817 por Manuel Aires do Casal que a anexou à sua "Corografia Brasílica" no Rio de Janeiro.

Em vinte e sete folhas de uma crônica histórica, o escrivão contou ao rei as impressões sobre esta exótica terra. Seu texto é corrido e percebe-se nele os traços de um ficcionista nato, mas ainda com algumas palavras para lapidar.

Sintam neste trecho a emoção do primeiro documento histórico que se conhece sobre nossa natureza original:

"Esta terra, Senhor, me parece que da ponta que mais contra o sul vimos até outra ponta que contra o norte vem, de que em nós deste porto houvemos vista, será tamanha que haverá nela bem vinte ou vinte e cinco léguas por costa. Tem, ao longo do mar, nalgumas partes, grandes barreiras, delas vermelhas, delas brancas, e a terra por cima toda chã e muito cheia de grandes arvoredos. De ponta a ponta, é tudo praia-palma, muito chã e muito formosa (...) Nela, até agora, não pudemos saber que haja ouro, nem prata, nem coisa alguma de metal ou ferro; nem lho vimos. Porém a terra em si é de muito bons ares, assim frios e temperados, como os de Entre-Doiro e Minho, porque neste tempo de agora os achávamos como os de lá. Águas são muitas; infindas. E em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo, por bem das águas que tem, porém o melhor fruto que nela se pode fazer me parece que será salvar essa gente e esta deve ser a principal semente que vossa alteza em ela deve lançar."

Nota da Madalena: A primeira impressão permanece até agora, quando ao longe se avista a extensão de nosso povo. O verde domina em seu amplo significado.

"Essa gente (...)" - refere-se aos índios, do qual destaco mais um trecho:

"A feição deles é serem pardos maneiras d'avermelhados de bons rostros e bons narizes bem feitos. Andam nus sem nenhuma cobertura, nem estimam nenhuma cousa cobrir nem mostrar suas vergonhas e estão acerca disso com tanta inocência como têm de mostrar o rosto.(...)"

Nota da Madalena: deles herdamos os peitos abertos.

Ele disse "terra graciosa; muito formosa" e acertou.

A partir daí nossa literatura restringiu-se aos chamados "textos de informação" que viajantes e missionários europeus observaram sobre a natureza e o povo brasileiro incipiente. Porém isso é só o princípio, porque ainda há muito o que falar sobre os textos dos jesuítas, que fizeram parte do primeiro centenário do Brasil, dos quais tratarei em outra ocasião.

É mister demorar-se um pouco mais com as caravelas ancoradas nesse momento do passado...

...e sentir as ondas de meio milênio
quebrarem nas costas fortes do Brasil.
Sua natureza palpita na mata que avista,
replanta o ipê amarelo no mapa da fé
e toca o céu com suas montanhas.
Por isso, as estrelas lhe são brancas
sob a magia do anil...
...nas asas do anjo verde.

(Madalena Barranco)


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.:
  • "A literatura brasileira através dos textos" - 23ª edição, Massaud Moisés, Editora Cultrix;
  • "História concisa da literatura brasileira", Alfredo Bosi, Editora Cultrix.
  • Publicado em: 17/11/2006
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