Esperai! esperai! Deixai que eu beba / Esta selvagem, livre poesia,
/ Orquestra é o mar, que ruge pela proa, / E o vento, que nas cordas
assobia... Esses versos de Castro Alves enfatizam o comprometimento
do poeta com o seu tempo. A ira do homem, mesclando-se ao lirismo do poeta resultou
em uma denúncia ao desumano tratamento que o dito ser humano manifestava,
escravizando seu semelhante, de outra origem, de outra cor, mas de natureza
igual e, quem dera, fosse ele igual, também, em direitos e dignidade.
Nos inúmeros versos que compõem O Navio Negreiro,
Castro Alves mostrou-se descontente com a escravidão negra, com a desumana
trajetória de homens subjugando homens. O poeta não estava alheio
aos acontecimentos sociais. A rica obra poética de Castro Alves aborda
questões sociais e a escravidão, usando o mesmo caráter
grandiloqüente da poesia social de Victor Hugo. São versos repletos
de indignação, que tem o objetivo de levar os leitores a compartilhar
esse sentimento e a lutar por uma sociedade menos desumana e mais justa. Não
basta inda de dor, ó Deus terrível? / É, pois, teu peito
eterno, inexaurível / De vingança e rancor?... / E que é
que fiz, Senhor? que torvo crime / Eu cometi jamais que assim me oprime / Teu
gládio vingador?!" Vozes dÁfrica, outro poema de
Castro Alves, reflete o sentimentalismo associado à indignação,
ao inconformismo. Ele também escreveu poemas líricos, inspirados
na figura feminina. A mulher deixava de ser uma donzela inacessível,
tornando-se sensual, concreta, colocando-se, eventualmente, ao alcance: Tu
és a minha vida... o ar que aspiro... / Não há tormentas
quando estás em calma. / Para mim só há raios em teus olhos,
/ Procelas em tua alma! Enganam-se os que dizem que a poesia está
alienada da realidade. Quem pensa assim, de fato, nada conhece de poesia, nada
sabe dos muitos poetas que emprestam seus talentos para, através de seus
versos, exercitarem a crítica social, ousada e dura, translucidamente
disfarçada no lirismo dos poemas. A poesia é, como todas as formas
de arte, a manifestação do artista, engajado no dia-a-dia da humanidade.
Castro Alves nasceu no dia 14 de março de 1847 e morreu novo, aos 24
anos de idade. Seu talento foi reconhecido por escritores consagrados, como
José de Alencar e Machado de Assis. Em sua homenagem, o dia do seu nascimento
foi escolhido para lembrar a poesia, essa manifestação de arte
não devidamente valorizada. Antônio Houaiss definiu poesia como
a arte de excitar a alma com uma visão do mundo, por meio de melhores
palavras em sua melhor ordem, usando-se o poder criativo e a inspiração
para despertar, também, o sentimento do belo e o que há de elevado
e comovente nas pessoas. A poesia tem, portanto, papel importante na preservação
do sentimento, da sensibilidade, possibilitando que o homem tenha, a partir
do hábito da leitura de bons e inspirados poemas, completa visão
crítica da realidade que o cerca. Os valores embutidos na poesia podem
contribuir para a mudança de atitudes, libertando do ser a sensibilidade
nele encarcerada, para que cada homem possa estar mais receptivo ao seu semelhante
e, também, mais disposto a estender as mãos, a abrir os braços
para inúmeros abraços e para as carícias despretensiosas
e puras, sem preconceitos bobos.
A poesia é e será o instrumento adequado à reforma íntima,
ao despertar do ser legítimo, aquele que ansiamos ser, mas que ainda
não sabemos como concretizar essa vontade. Então, é só
uma guinada branda, uma atenção maior à poesia, aos poetas;
esse gesto simples nos causará espanto, que será ainda maior a
partir do contato com diversos poetas e suas produções literárias.
Um bom mergulho na poesia nos transformará; quando retornarmos desse
mergulho, estaremos mais saudáveis, mais otimistas, mais atentos a nós
mesmos, mais preparados para a convivência com outros seres, com a natureza.
No dia 14 de março, Dia da Poesia, quero manifestar aos poetas, a esses
incansáveis, inconformados e atentos sonhadores, o meu profundo e eterno
respeito.