Certa vez, uma pessoa disse-me que sou escritora formada. Absurdo!
Ter estudado teoria literária ou a língua pátria não
faz de ninguém um escritor.
Tenho brilhantes amigos, escritores e poetas, médicos, advogados, jornalistas
e muitos não intelectuais, criativos e talentosos, porque escrever é
dom como desenhar, pintar e fazer música.
A literatura estabelece a comunhão entre os homens, aproxima-os, mesmo
à distância e o tempo não conta. Sou contemporânea
de Shakespeare porque falamos a mesma língua, o amor é exaltado
em qualquer época. Tenho inúmeros amantes noturnos entre autores
clássicos e contemporâneos, que se enfileiram na cabeceira de minha
cama e me visitam à luz do abajur. Ultimamente, tenho lido Quintana,
Augusto dos Anjos, Lettie Cowman, Lya Luft e Ray Silveira .
Alguns sentem que a crônica é a sua praia; outros preferem ver
o mundo poeticamente, outros gostam de argumentar, outros de criar narrativas
curtas ou longas. Assim como um bom violonista também gosta de experimentar
o teclado, um poeta escreverá crônicas, um romancista, textos de
opinião; ou ainda um jornalista, letras de música.
O leitor costuma confundir-se com os textos em primeira pessoa. Com poesia então,
ocorre demais. Se falo de um amor sofrido, impossível, as perguntas são:
"Está tristinha? O que aconteceu? Você anda estranha!"...Já
me chamaram até de "mal-amada". Nem todos entendem que, assim
como nos romances existem personagens, protagonistas e antagonistas, na poesia
existe o "eu" lírico,que é "personagem" da
poesia. O poeta fala por ele, entra em sua pele. Lógico que também
existem as poesias confessionais, onde o poeta descreve suas dores de amores.
Não faz parte da minha vivência, (infelizmente) (risos ou sniff?)
nenhuma paixão arrebatadora... Casada há trinta e dois anos com
o mesmo marido, o fogo da paixão já se extinguiu, o amor se solidificou,
empedrou, não corre riscos...
Aí,o que faz a poeta? Deixa de escrever? Aposenta a caneta e o caderno?
(ainda os uso). Não... O poeta pinta seus pensamentos de azul, deixa
o céu entrar pelos olhos, chega à culminância do sonho,
tem uma sensualidade tempestuosa, uma alegria imaterializada, vê a sombra
de seu vulto na antecâmara do nada. Através do sujeito lírico,
ama, é amado, chora, ri, sofre, tem saudade... Se dá ao luxo de
ser louco! Afinal, um pouco de loucura não faz mal a ninguém!