Artigo Um
Todo Poeta tem direito de ser feliz para sempre, mesmo além do para sempre
ou quando eventualmente o "para sempre" tenha algum fim.
Artigo Dois
Todo Poeta poderá dividir sua loucura, paixão e sensibilidade
com mil amores, pois a todos amará com o mesmo prelúdio nos olhos,
algumas asas nas algibeiras e muitas cítaras encantadas na alma, ainda
assim, sem lenço e sem documento.
Parágrafo Único
Nenhum Poeta poderá ser traído, a não ser para que a ex-Musa
seja infeliz para todo o resto dos dias que lhe caibam na tábua de carne
desse Planeta Água.
Artigo Três
Nenhum Poeta padecerá de fome, de tristeza ou de solidão, até
porque a tristeza é a identidade do Poeta, a solidão a sua Pátria,
sendo que, a fome pode muito bem ser substituída por rifle ou cianureto.
E depois, um poeta não precisa de solidão para ser sozinho. É
sozinho de si mesmo, pela própria natureza, com seus encantários,
mundo-sombra e baladas de incêndio.
Artigo Quatro
A Mãe do Poeta será o magno santuário terreal de seus dias
de lutas e sonhos contra moinhos e erranças de gracezas e iluminuras.
Filho de Poeta será como caule ao vento, cálice de liturgia, enchente
em rio: deverá adaptar-se ao Pai chamado de louco por falta de lucidez
de comuns mortais ou velado elogio em inveja espúria.
Artigo Quinto
Nenhum Poeta será maior que seu país, mas nenhuma fronteira ou
divisa haverá para o Poeta, pois sua bandeira será a justiça
social, pão, vinho, maná, leite e mel, além de pétalas
e salmos aos que passaram em brancas nuvens pela vida. E depois, uns são,
uns não, uns vão, uns hão, uns grão, uns drão
- e ainda existem outros.
Artigo Sexto
A todo Poeta será dado pão, cerveja, amante e paixão impossível,
o que naturalmente o sustentará mental e fisiologicamente em tempos tenebrosos
ou de vacas magras, de muito ouro e pouco pão.
Artigo Sétimo
Nenhum Poeta será preso, pois sempre existirá, se defenderá
e escreverá em legítima defesa da honra da Legião Estrangeira
do Abandono, à qual sabe pertencer, com seu butim de acontecências,
ou seu não-lugar de, criando, ser, estar, permanecer, feito uma letargia,
um onirismo.
Artigo Oitavo
A infinital solidão do espaço sempre atrairá os Poetas.
Artigo Nono
Caso o Poeta viaje fora do combinado, tome licor de ausência ou vá
morar no sol, nunca será pranteado o suficiente, nem lhe colocarão
tulipas de néon, dálias aurorais, estrelícias de leite
ou dente-de-leão sob o corpo que combateu o bom combate. Será
servido às carpideiras, amigos, parentes, anjonautas e guardiões,
vinho de boa safra por atacado, mais bolinhos de arroz, pão de minuto
e cuque de fubá salgado.
Artigo Décimo
Poeta não precisará mais do que o radar de seus olhos, as suas
mãos de artesão sensorial no traquejo do cinzel interior, criativo,
sua aura abençoada e seu halo com tintas de luz para despojar polimentos
íntimos em verso e prosa, como pertencimentos, questionários e
renúncias.
Artigo Décimo Primeiro
Poeta poderá andar vestido como quiser, lutar contra as misérias
e mentiras do cotidiano (riquezas impunes, lucros injustos), sempre buscando
pela paz social, ou ainda mamando na utopia de uma justiça plural-comunitária.
Quem gosta de revolução de boteco é janota boçal
metido a erudição alcoólica e pseudo-intelectual seboso
e burguês. Poeta gosta mesmo de humanismo de resultados. De pegar no breu.
A luta continua!
Artigo Décimo Segundo
Poeta pode ser Professor, Torneiro-Mecânico, Operário, Jardineiro,
Fabricante de Bonecas, Vigia-Noturno, Engolidor de Fogo, Entregador de Raposas,
Dono de Bar ou Encantador de Freiras Indecisas. Poeta só não poderá
ser passional, insensível, frio ou interesseiro. Ao poeta cabe apenas
o favo de Criar. O poeta escreve torto por linhas tortas (um gauche), poesilhas
(poesia rueira e descalça) e ficção-angústia. Escreve
(despoja-se) para não ficar louco...para livrar do que sente. O Poeta,
afinal, é um "Sentidor"
Artigo Décimo Terceiro
Se algum Poeta for acusado levianamente de alguma eventual infração
ou crime, a dúvida o livrará. E se o Poeta dizer-se inocente isso
superará palavras acima de todos e sua fala será sentença
e lei. A ótica do Poeta está acima de qualquer suspeita, e ele
sempre é de per-si mesmo o local do crime da viagem de existir. Mas pode
colaborar com as autoridades, cometendo um crime perfeito. Afinal, só
os imbecis são felizes.
Parágrafo Único
Poeta não erra. Refaz percursos. Poeta não mente. Inventa o inexistente,
traduz o impossível, delata o devir. Poeta não morre. Estréia
no céu.
Artigo Décimo Quarto
Aos Poetas serão abertas todas as portas, até as invisíveis
aos olhos vesgos e comuns dos mortais anônimos, serão abertos todos
os olhos, todas as almas, todos os caminhos, todas as chamas, todos os cântaros
de lágrimas e desejos, todos os segredos dessa dimensão ou fora
dela, num desespelho de matizes.
Artigo Décimo Quinto
A primeira flor da primeira aurora de cada dia novo, será declarada de
propriedade do Poeta da rua, do bairro, do país ou de qualquer próximo
Poeta a confeitar como louco, como ermitão ou pioneiro, de vanguarda.
Em caso de naufrágio ou incêndio, poetas e grávidas primeiro
Artigo Décimo Sexto
Não existe Poeta moderno, clássico, quadrado, matemático
como pelotão de isolamento, ou só aleijado por dentro, pois as
flores e os rios não nascem nunca iguais aos outros, sósias, nem
os poemas são tijolos formais. Nenhum Poeta poderá produzir só
por estética, rima ou lucro fóssil. Poesia não é
para ser vendida, mas para ser dada de graça. Um troco, um soneto, uma
gorjeta, um haikai, um fiado pago, uns versos brancos, um salário do
pecado, um mantra-banzo-blues. E todo alumbramento é uma meia viagem
pra Pasárgada.
Poeta é tudo a mesma coisa, com maior ou menor grau de sofrimento e lições
de sabedoria dessas sofrências, portanto, com carga maior ou menor de
visão, lucidez, sensoriedade canalizada entre o emocional e o racional,
de acordo com a sua bagagem, seu vivenciar, seu prisma existencialista de bon
vivant. Poeta há entre os que pensam e os que pensam que pensam. Entre
os que são e os que pensam que são. A todos é dado a estrada
de tijolos amarelos para a empreita de uma caminhada que o madurará paulatinamente.
Ou não. Todo poeta é aprendiz de si mesmo, em busca de uma pegada
íntima, e escreve para oxigenar a alma. Afinal, são todos sementes,
e sabem que precisam ser flores e frutos, para recriarem, para sempre, a eterna
primavera.
Todo aquele que se disser Poeta, assim o será, ou assim haverá
de ser
Parágrafo Um
O verdadeiro Poeta não acredita em Arte que não seja Libertação.
Saravá, Manuel Bandeira!
Parágrafo Dois
Poeta bebe porque é líquido. Se fosse sólido comia.
Parágrafo Três
Poeta é como a cana. Mesmo cortado, ralado, amassado, ao ser posto na
moenda dos dias, ainda assim tem que dar açúcar-poesia
Inciso Um
Poeta também bebe para tornar as pessoas mais interessantes.
Parágrafo quatro
Poeta não viaja. Poeta bebe. E todo Poeta sabe, que o fígado faz
mal à bebida.
Artigo Décimo Sétimo
Poeta terá que ser rueiro como pétala de cristal sacro, frequentador
de barzinhos como anjo notívago, freguês de saunas mistas como
recolhedor de essências, plantador de trigais amarelos como iluminador
de cenários, cevador de canteiros entre casebres de bosquíanos,
entre o arado e a estrela, um arauto pós-moderno como declamador de salmos
contemporâneos entre extraterrestres.
Parágrafo Único
Poeta rico deverá ainda mais amar o próximo como se a si mesmo,
ajudando os fracos e oprimidos, os Sem Terra, Sem Teto, Sem Amor, para então
se restar bem-aventurado e poder escrever cânticos sobre a condição
humana no livro da vida. Poeta é antena da época. E o neoholocausto
do liberalismo globalizador é o câncer que ergue e destrói
coisas belas.
Artigo Décimo Oitavo
A todo Poeta andarilho e peregrino como Cristo, São Francisco ou Gandhi,
será dado seu quinhão de afeto, sua porção de Lar,
seu travesseiro de pétalas de luz. Quem negar candeia, azeite e abrigo
ao Poeta, nunca terá paz por séculos de gerações
seguintes abandonadas entre o abismo e a ponte para a Terra do Nunca. Quem abrigar
um Poeta, ganhará mais um anjo-da-guarda no coração do
clã que então será abençoado até os fins
dos tempos.
Parágrafo único
O sábio discute sabedoria com um outro sábio. Com um humilde o
sábio aprende.
Artigo Décimo Nono
Poeta poderá andar vestido como quiser, com chapéus de nuvens,
pés de estrelas binárias ou mantras de ninhos de borboletas. Nenhum
Poeta será criticado por fazer-se de louco pois os loucos herdarão
a terra e são enviados dos deuses. "Deus deve amar os loucos/Criou-os
tão poucos..." - Um Poeta poderá também andar nu,
pois assim viemos e assim nos moldamos ao barro-olaria de nosso eio-Éden
chamado Planeta Água. E a estética para o poeta não significa
muito, somente o conteúdo é essência infinital.
Artigo Vigésimo
Poeta gosta de luxo também, mas deve lutar por uma paz social, sabendo
a real grandeza bela de ser simples como vôo de pássaro, simples
como pouso em hangar fantástico, simples como beira de rio ou vão
de cerca de tabuínha verde. Só há pureza no simples.
Artigo Vigésimo Primeiro
Nenhum Poeta, em tempo algum, por qualquer motivo deverá ser convocado
para qualquer batalha, luta ou guerra. Mas poderá fazer revoluções
sem violência. Poderá também ser solicitado para ser arauto
da paz, enfermeiro de varizes da alma ou envernizador de cicatrizes no coração,
oferecendo, confidente, um ombro amigo, um abraço de ternura, um adeus
escondido feito recolhedor de aprendizados ou visitador de bênçãos,
ou ser circunstancialmente um rascunhador clandestino de alguma ridícula
carta de suicida.
Artigo Vigésimo Segundo
Mentira para o Poeta significa cruz certa. Aliás, poeta na verdade nunca
mente, só inventa verdades tecnicamente inteiras e filosoficamente sistêmicas...
Artigo Vigésimo Terceiro
Musa-Vítima do Poeta será enfermeira, psicóloga, amante,
mulher-bandeira, berço esplêndido, Santa. Terá que ser acima
de todas as convenções formais, pau para toda obra. No amor e
na dor, na alegria e na tristeza, até num possível pacto de morte.
Artigo Vigésimo Quarto
Poeta não paga pensão alimentícia. Ou se está com
ele ou contra ele. Filha e sobrevivente de uma relação qualquer,
ficarão sob sua guarda direta e imediata. Ex-Mulheres serão para
sempre águas passadas que não movem moinhos, como velas ao vento
de uma Nau Catarineta qualquer, como exercícios de abstrações
entre cismas, ou como aprendizados de dezelos íntimos de quem procura
calma para se coçar.
Artigo Vigésimo Quinto
Revogam-se todas as disposições em contrário
CUMPRA-SE - DIVULGUE-SE.