As piores armas,
são as que os violentos
tem nos corações.
A reunião dos animais, era presidida pelo velho, carrancudo, e aborrecido
leão. Os bichos já tinham se reunido outras vezes, na tentativa
de resolver o problema da violência na mata. E na última dessas
reuniões, tinham resolvido eleger um Ministro Para Assuntos da Paz na
Mata.
O pombo, conceituado em todo mundo como símbolo da paz, aceitou o convite
para participar, mas como convidado de honra, e por isso seu nome não
foi incluído na lista dos oradores. Esteve no palanque, mas assim que
o primeiro orador ia começar o seu discurso, voou para um lugar mais
alto, onde seu filhinho já estava pousado.
O leão com seu conhecido rugido de mau humor, disse:
- Vamos ouvir agora a primeira candidata a ministra. A dona cobra.
O réptil arrastou-se até o púlpito, e falou:
- Eu represento o PR, ou Partido dos Répteis, e acredito que só
nós podemos comandar este novo ministério, porque somente nós,
podemos analisar a terra tão de perto. E é porque conhecemos o
chão como ninguém, que queremos os votos de todos...
O discurso foi interrompido por aplausos, mas logo as aves começaram
a vaiar, e foram seguidas pelos mamíferos, e logo todos os que não
se davam com as cobras estavam vaiando.
A inda no meio do barulho, o pombinho inclinou-se e perguntou ao pai:
- Que acha da cobra como candidata, pai?
- A paz meu filho, não vem nunca de quem rasteja, é surdo, e tem
veneno na boca.
No palanque, o leão rugiu sua raiva, e a vaia cessou. E com um gesto
irritado, chamou a onça, que passou a falar:
- Senhores animais moradores desta floresta!... Só mesmo o PF, Partido
dos Felinos, vai garantir a paz neste lugar, porque só nós temos
o pulso forte necessário para manter a ordem. Somente nós temos
condições de fazer cumprir as leis, que são boas, mas não
são cumpridas...
Os aplausos começaram fracos, e foram abafados pelas vaias.
Do alto, o filhote do pombo perguntou ao pai:
- Você concorda com esse discurso, pai?
- Pulso forte e leis, meu filho, é uma combinação que até
hoje só resultou em tirania, e legalizaram os crimes dos poderosos.
Como prova de força, o leão rugiu sua impaciência, e ninguém
mais teve coragem de vaiar. E chamou o tatu, que falou:
- Senhores animais da mata. Nós do PP, Partido das Profundezas, coligados
com o PM, Partido das Minhocas, conhecemos a terra a fundo, e por isso mesmo,
podemos ver os problemas pela raiz. E com os nossos conhecimentos profundos,
temos condições...
- Nem chegou a completar, e já chovia objetos acompanhados das vaias.
O pombinho disse ao pai:
- Parecia ir bem, não pai?
- Não, filho. Conhecer o avesso do mundo, não é conhecer
o mundo com profundidade. E quem se alimenta de terra, não sabe o gosto
do azedo...
O leão mostrou os caninos, e a plateia calou. Então chamou
a águia, e ela falou:
- Amigos todos da floresta!... O P.A.R , Partido das Aves de Rapina, representado
por mim, trás uma mensagem encorajadora a todos, porque nós de
fato temos todas as condições de assumir o novo ministério,
porque além da força, vemos as coisas do alto, e enxergamos longe...
E acima de tudo, temos o apoio do P.O.A, o famoso Partidos das Outras Aves,
que são todas as que não voam, e são especialistas na terra,
e na água... Por isso pedimos seu voto...
Desta vez a vaia começou do lado dos batráquios.
O filho do pombo comentou com o pai:
- Pareceu a mim que esta última coligação era a melhor,
não pai?
- Muitos que se dizem do céu filho, são os predadores mais perigosos...
Lá embaixo, o leão pôs fim à bagunça, com
seu rugido sinistro... E chamou a ema para falar:
- Senhores, eu sou contra partidos políticos, e compreendo perfeitamente
porque é que vocês vaiaram todos os outros que falarem aqui. Tenho
certeza que eleição nenhuma vai resolver o problema da violência
na mata. O que todos estes político querem, é o poder, e nada
mais que isso... A solução, está em começarmos conscientizar
a todos, com faixas e cartazes, campanhas nos meios de comunicação
da floresta... E também, temos que promover o Dia Mundial da Paz dos
Animais, como os humanos que não devoram uns aos outros, tem...
Desta vez, houve aplausos. E enquanto aplaudiam, o sapo levantou o braço
e coaxou bem alto:
- Protesto, senhor presidente!...
O leão virou-se feroz, mas chamou o sapo, que continuou:
- Nem eleição, nem campanha resolve coisa nenhuma. Tenham um pouco
de inteligência, e vejam o que é que nos metem medo aqui na floresta!...
São as armas. Desarmem a todos, e acabam todos os conflitos, dentro e
fora das matas.
Desta vez o aplauso foi maciço. Todos aplaudiam de pé. E desta
vez, até o leão rugiu mais manso, e disse:
- Continue, senhor sapo!... E o sapo gaguejou:
- ...Quê?... continuar?... não, eu já terminei. Agora é
só colocar em prática o que eu disse...
- E qual a sugestão que o senhor tem para colocar seu sábio discurso
em prática seu sapo? - perguntou o leão.
- Ué!... é só cortar os bicos, as garras, os dentes de
todos os que nos atacam, e pronto, será mantida a paz!... Assim, leões,
cobras, águias, onças...e todos os outros predadores, serão
inofensivos!...
A confusão que se seguiu, foi muito grande. E a violência tomou
conta de todos, e o sapo só não foi linchado, porque de um salto
só, pulou do palanque direto na lagoa que estava perto, e se escondeu.
De longe, o velho pombo comentou com o filho:
- As piores armas,meu filho, são as que os violentos escondem dentro
de seus corações. Não adianta desarmar um violento, porque
ele criará novas armas. Se forem destruídas todas as fábricas
de armas, os violentos construirão novas, e enquanto isso, usarão
as pedras e os punhos, ou mesmo os venenos de suas línguas. A guerra
se faz por decreto, filho, mas a paz não. Por enquanto filhinho, nos
mantenhamos longe do tumulto dos violentos, como um exercício de prudência.
O tumulto lá em baixo continuava. Nisso, o lobo saiu do meio dos outros
animais, todo ferido. Quando passava, viu os pombos, e uivou:
- Que é que vocês fazem pela paz, seus covardes!... Ficam de longe,
e ainda dizem que são o símbolo da paz seus covardes!.. Desçam
daí que vocês vão ver se hoje não tenho ensopados
de pombos!...
Os pombos continuaram calados como estavam.
O lobo saiu furioso, decidido que um dia, ainda jantaria os dois.
Então o pombo disse ao filho:
- Vamos, filhinho!...
- Para onde, pai?...
- Visitar um nosso amigo que não tem nada com essa confusão.
E voaram para a casa do carneiro. Lá, não falaram da violência
que viram. Nem mesmo de paz, precisavam falar.
O carneiro estava mastigando sossegado, e eles pousaram perto em paz, e o pombo
ficou roronando:
"Não se discute a paz onde ela reina. A paz é como as joias
de um tesouro descoberto. Mas se mostradas aos violentos, eles pensam que é
bijuteria."