Eric deitara-se na cama e ficara observando o teto daquele cômodo. Duvidava
que o sono pudesse vir naquela noite. Sua vida, virada de cabeça para
baixo. Todas as pessoas que conhecia estavam mortas. O mundo havia mudado. A
última coisa que poderia querer era uma note tranquila de sono.
Virou-se para a esquerda, para a direita, nada. Passaram-se uma hora, duas...
Parece que sofreria de insônia aquela noite. Virou-se para o lado: Christian
não estava mais sobre o colchão. Teria saído ou finalmente
pegado no sono e virado pó? Calafrios tomavam conta do corpo dele. Pegou
no espectro e ficou olhando aquela joia. Feia. Escura. Fria. Vital...
As pálpebras ficaram pesadas. Logo, Eric não sentiu mais o seu
corpo, que se reduziu ao mínimo.
Ficou muito tempo assim, inerte, quando percebeu que estava caindo. Abriu os
olhos: apenas as trevas o cercavam. Estava caindo para trás. Sem saber
o motivo, começou a mexer os braços, como se estivesse nadando
de costas.
Lentamente, sentiu uma áspera superfície se formar do lado direito
de seu corpo. Talvez, tivesse caído nessa posição. Permaneceu
com os olhos fechados.
Uma forte luz, entretanto, obrigou-o a abri-los. Não pôde acreditar
no que estava vendo. Assustado, levantou-se: estava em meio a um grande campo,
repleto de tulipas amarelas. Olhou para cima: o céu azul, com poucas
nuvens. As tulipas, em filas intermináveis, infinitas. O perfume das
flores o fez esquecer de todos os seus problemas. Ele não parava de girar
sobre si mesmo e, alegre, contemplar aquela bela obra da Natureza. Num giro,
percebeu uma abelha que pousou sobre uma das flores. Maravilhado, tocou o caule
desta.
A abelha saiu voando. A tulipa foi murchando e tornou-se preta, desaparecendo
em seguida. Isso foi o começo de uma reação em cadeia.
Um vento quente atravessou o corpo do menino, todas as outras plantas murcharam,
o céu ficou nublado, com nuvens vermelhas que soltavam relâmpagos
enfurecidos. Onde antes havia um maravilhoso jardim, agora havia um vasto deserto,
em tonalidades escarlates.
A terra começou a tremer, o que o fez cair por terra. Uma parte do terreno
desmoronou, criando um grande abismo, de onde ele ouviu muitos gritos de dor
e sentiu um desagradável cheiro de enxofre. A cratera tomou proporções
gigantescas, que logo revelou uma civilização que ali habitava.
Uma das fraquezas de Eric era sua curiosidade. Em muitas ocasiões ele
se meteu em pesadas encrencas só por não ficar em seu lugar. Concordou
que, ali, não havia nada melhor a fazer do que observar o que estava
acontecendo naquele recém-criado sítio. Assim, ele lentamente
caminhou para lá e, do alto, espantou-se com o que viu.
Eis que ele viu uma legião de pessoas pequenas alimentando pessoas maiores.
E as pessoas pequenas, que eram em maior número, muitas vezes sacrificavam
seu próprio alimento para dar de comer aos gigantes. Dentre os pequenos,
um grande grupo gritava protestos contra aquela prática, mas os gigantes
providenciavam para que ninguém os ouvisse.
De repente, houve grande temor de terra e duas Torres ergueram-se do solo. Eis
que elas eram tão grandes que iam da terra ao Céu. E os gigantes
postaram-se em adoração às Torres, e obrigaram os pequenos
a também adorá-las. Inesperadamente, duas bolas de fogo rasgaram
as nuvens e colidiram, cada uma, contra uma Torre, e eis que estes monumentos
caíram.
Eis que muitos gigantes e pequenos padeceram sobre a queda, mas o fogo e a fumaça
encobriram a visão de qualquer pessoa. Aquilo queimou por um longo tempo
e, aos poucos, os gritos de dor, medo e angústia, foram se calando.
Eric presenciou o silêncio absoluto que emanava da neblina da morte. Então,
inesperadamente, houve outro temor de terra e, da fumaça, ergueu-se uma
Besta. Eis que a Besta tinha asas de águia e possuía duas cabeças,
sendo que, em uma delas, uma coroa. A Besta era a maior das criaturas ali presentes.
Das suas bocas, saíam labaredas e as unhas de seus dedos eram espadas
afiadas. Todos os grandes e pequenos foram submetidos à Besta, que perguntava
incessantemente onde estava o Responsável por aquela desgraça,
pois seu nome já era conhecido.
A Besta varreu a civilização, massacrando muitos dos pequenos,
mas o Responsável não foi encontrado entre eles. Os fortes clamores
para que a Besta cessasse eram ignorados. Os líderes dos pequenos, então,
invocaram suas forças e, do meio deles, surgiu uma outra besta, porém
menor. A segunda besta pôs-se a desafiar a primeira. E um grande e acirrado
conflito aconteceu. A primeira Besta, no entanto, arrebatou a segunda e os líderes
dos pequenos entregaram-se a ela. A Besta assentou-se em seu trono e os pequenos
depositaram todas as riquezas que possuíam aos seus pés.
Eric tentou chegar mais perto, para ver o que aconteceria a seguir, mas sem
querer escorregou em uma pedra e veio rolando precipício abaixo. O medo
obrigou-o a fechar os olhos, mas ele não sentiu dor. Quando finalmente
chegou a um solo firme, abriu os olhos e ergueu-se: estava entre as pessoas
que depositavam seus pertences aos pés da Besta. Disfarçadamente,
tentou sair dali, mas eis que a Besta o viu e proferiu um grande rugido. De
longe, o menino encarava-a, repleto de pavor.
A Besta ergueu-se de seu trono e veio na direção de Eric, esmagando
muitos grandes e pequenos com os seus pés; Eric começou a correr
desesperado para qualquer lugar. A Besta fincava suas unhas, que eram espadas,
no solo, tentando partir o corpo do garoto ao meio, mas Eric, milagrosamente,
foi mais rápido que a Luz, com uma tamanha velocidade que lhe pareceu
ser câmera lenta, e passava por entre as garras do monstro. Eis que as
garras arrancavam muitas habitações e padeciam muitas pessoas.
Em certo momento, a Besta conseguiu passar uma garra pelas costas de Eric, o
que o fez gritar, mas este virou á direita. Sem saber, pisou em uma armadilha,
que fez seu corpo cair em um grande e negro buraco. Lentamente, os incessantes
e ensurdecedores rugidos da Besta foram se tornando distantes.
Novamente, Eric perdeu os sentidos do seu corpo. Quando acordou, estava deitado
de bruços em um grande deserto. Levantou-se lentamente. Olhou o panorama:
nenhum sinal daquele ser abominável. À sua frente, entretanto,
viu dois garotos, um indo em direção ao outro. Eric correu para
alcançá-los. Ao chegar mais ou menos perto deles, notou que eles
caminhavam com dificuldade, pois tinha, cada um, uma grande bola de aço
amarrada ao pé direito. Em cada bola, havia uma letra, cuja soma era
5. Eis que cada bola estava amarrada ao pé por uma grande corrente, a
qual tinha um cadeado que ninguém conseguia abrir. O garoto que vinha
pela direita caiu e começou a engatinhar. O da esquerda apressou os passos,
mas também caiu. Os dois se encontraram e o da direita ajudou o outro
se erguer, dizendo-o:
- A sua bola é mais recente...
- Ela é mais pesada, isso sim.
Os dois olharam para trás e viram, ao longe, uma menina, sem nada que
a prendesse, correndo pelo deserto. Curiosos, gritaram para que ela os esperasse
e passaram a caminhar em sua direção. A menina parou e, percebendo
que os dois tinham dificuldade para cegar a ela, pôs-se a ir até
eles. Ao encontrarem-se, um dos garotos a indaga:
- Diz-nos: como pode correr por aí, sem nada que a prenda? Como pode
não ter uma bola amarrada ao vosso pé?
A menina, sorrindo, põe a mão no bolso de sua calça e diz:
- Eu sou Livre.
E estendeu sua mão a eles. Abre a mão, mostrando uma grande e
brilhante chave, cujo chaveiro tinha a forma de um animal polar.
Uma lágrima tímida formou-se no canto do olho esquerdo de Eric
e logo escorreu por sua face. Antes, porém, que visse o desfecho daquela
cena, as três crianças desapareceram, bem como todo o deserto,
ficando Eric num imenso lugar branco. Fechou os olhos. Ao abri-los, já
estava, novamente em outro local.
Era como se aquilo fosse a cratera de um vulcão. Um lugar extremamente
quente, delimitado por altas paredes de pedras irregulares. O chão tinha
piso de mármore e, acima, negras nuvens que soltavam furiosos raios e
trovões. Não havia luz naquele local: o que o iluminava eram tochas,
espalhadas por todo o lugar. À frente de Eric, havia uma larga escada
com seis degraus. Eric a desceu e viu várias pessoas caminhando sem rumo.
Elas tinham feridas de todas as espécies em todos os lugares. Atrás
dessas pessoas, havia um imenso lago e, no seu centro, uma tocha que ardia incessantemente.
Eric desceu do último degrau e começou a abordar as pessoas. Já
estava cansado daquela viagem.
- Moço... senhora... que lugar é esse? Onde fica a saída?
Mas as pessoas continuavam em seus caminhos, ignorando completamente a presença
dele. Ele tentou perguntar para muitas outras pessoas, mas a resposta era sempre
a mesma: o silêncio. Desviou seu olhar para o lago: ao longe, um barco
passava. Em sua proa, havia um ser, vestido com uma túnica preta com
um capuz, que remava e, em sua popa, várias pessoas sentadas. Eric entrou
no rio e correu até aquele barquinho. Ele sabia nadar, mas não
estava sendo necessário: a água era baixa, outrossim, a cada instante
que avançava, ficava mais alta.
Cada vez mais perto do barco...
A água já estava batendo em sua cintura, quando um par de braços
o puxou para baixo. Com o susto, o menino respirou fundo. Um pouco de água
entrou-lhe pela boca, mas ele não se afogou. Tentou nadar para cima,
mas os braços o puxavam para baixo. Baixou sua cabeça para ver
quem estava fazendo aquilo: viu que era uma mulher, em avançado estado
de putrefação. Sentiu nojo daquilo. Tentou se libertar, mas ela
o puxada com mais força. Por fim, teve uma ideia.
Deixou-se ser levado. A mulher chegou mais perto dele. Abriu sua boca, da qual
saiu um verme. Eric segurou-se para não vomitar. O rosto dela estava
cada vez mais perto. Eric tocou-o com sua mão direita. A mulher o largou
e paralisou sua face, a qual foi secando e a transformou num esqueleto e, depois,
em cinzas.
Livre, Eric nadou para cima. Procurou um lugar alto e ficou de pé. A
água bateu em seus joelhos. Olhou para frente: o barco não estava
mais lá. Girou o seu corpo e avistou-o navegando perto dali. Correu em
sua direção.
- Hei! Espere! Que lugar é esse? Como é que eu saio daqui?
O homem com a túnica volveu sua face para o garoto, revelando-se um esqueleto.
Eric, assustado, impulsionou-se para trás. O esqueleto disse:
- Isso é o Inferno, garoto. Ninguém pode sair daqui.
Eric ficou paralisado. O barco terminou de passar à sua frente. As pessoas,
machucadas, olharam para ele. O garoto sentiu uma ligeira sensação
de mal-estar em seu estômago. Respirou fundo e virou-se para sair do rio.
Enquanto saia, uma forte voz metálica gritou atrás dele:
- Você não vai sair daqui tão cedo...
Eric não queria olhar para trás, mas foi obrigado.
- Quem é você?
Um homem envolto em sombras continuou:
- Você tem algo que me pertence...
- Tenho?
- Em 1799... Ele roubou de mim...
- Desculpe, não sei do que está falando...
- Não se faça de tolo. Como acha que um anjo pôde lhe fornecer
um espectro? Ele não pode ter um. Então ele roubou. - O homem
caminhou para frente, revelando seu corpo carbonizado - Ele roubou de mim.
- AAAAAAAAAA......
- Eu o quero de volta. E você vai morrer. Definitivamente...
- Olha, deve estar havendo algum engano é... pode ser outra pessoa, sabe?
Tem certeza que não é ninguém parecido comigo?
O homem corre na direção de Eric, que corre para sair do rio.
As pessoas o observam. Eric chega à terra e corre. Olha para o homem
cada vez mais perto. Tenta desviar, não consegue. Bate em carias pessoas,
que morrem. Sem saber como, passa por cima de um carrinho de madeira, cheio
de frutas podres, como se caminhasse no ar. O homem, entretanto, o arremessa
longe, seguindo seu caminho. Olha para todos os lados, procurando algo que o
salve. Vê um muro de madeira. Corre até ele e passa a escalá-lo.
O homem faz o mesmo. Eric sobe, só com o horizonte à sua frente.
Ele precisa chegar ao topo. O homem está cada vez mais perto. Eric não
desiste de escalar. O homem segura o seu calcanhar. Eric o balança. Os
dois caem. Eric chuta o peito dele e consegue impulsionar-se para frente, O
outro exterminador cai num campo cheio de agulhas. Ergue-se e continua a perseguição.
Eric olha para trás: Será que ele não desiste? Desvia seu
olhar para frente. Vários lençóis brancos pendurados em
varais. Eric e o outro passam a correr em meio a estes lençóis.
O menino os desvia com os braços e mãos. O outro deixa uma mancha
de sangue em cada um. Aquilo parece não ter fim. Parece que a vida de
Eric vai terminar ali. Naquele instante.
Os lençóis acabam. Eric continua correndo. Atrás dele,
apenas os gritos de um louco. Nada à sua frente, até que... um
abismo, O garoto pára assustado. É uma grande distância.
Olha para trás: o outro exterminador está cada vez mais próximo.
A respiração de Eric torna-se forte e rápida. Ele dá
uns três passos para trás e corre. Como um milagre, chega ao outro
lado, como se não houvesse abismo: ele correra no ar. Cai, incrédulo.
- Meu Deus, eu consegui?
- Acha isso incrível? Iniciantes....
Asas de morcego brotam das costas do exterminador, que sai voando na direção
do garoto. Eric volta a correr. À sua frente, mais uma escada. Ele a
desce sem ver e corre naquele imenso local, com chão de mármore
e várias nuvens escarlates, disparando raios e trovões no firmamento.
- Onde está você? Não pode se esconder de mim!
Eric estava bem na a fronteira da sanidade e a loucura. Precisava fugir de alguma
forma. Passa a clamar por socorro. O homem replica:
- Aqui não há ninguém que possa ouvi-lo!
Eric corria. O ar começava a faltar-lhe. O homem surge do lado. O garoto
grita. E corre.
- Não vai escapar dessa vez.
À sua frente, bem distante, uma cerca de arame farpado. Eric chega até
ela com um único objetivo: chegar do outro lado. Põe a mão
no arame e sente uma dor imensa. Olha para as suas mãos, sujas de sangue.
O homem lhe explica:
- Aposto que não contava com isso... Trilítio, a única
coisa que pode ferir um Exterminador de Almas.
Realmente, não sabia. O homem chegou cada vez mais perto. Eric manteve-se
imóvel. O carbonizado estava preste a tocá-lo quando o garoto,
em menos de um segundo, o pega pelos braços e o lança sobre a
cerca. O homem grita, Eric corre. Ele se levanta furioso. Nesse momento, as
palavras de Christian vêm à mente de Eric: "Lembre-se de uma
coisa: a vida é quente". O que ele quis dizer com isso? Eric tropeça
numa pedra e cai por terra. O homem pisa nas suas pernas, impedindo que ele
fuja. Ergue os braços para socá-lo. Eric, instintivamente, transforma-se
num esqueleto e vê, no frio corpo daquele ser terrível, apenas
um ponto de calor, perto de onde deveria ser o coração.
O garoto volta à forma humana. O adversário começa o seu
golpe. Eric profere um soco forte contra o local onde viu o foco. A sua mão
atravessa aquele corpo nojento. O homem grita de dor, transforma-se em um esqueleto
e, depois, em cinzas. Eric cai, cansado. Fecha os olhos. Quando os abre, está
novamente em sua cama.
Levanta-se suado e suspirando forte. Christian surge ao seu lado.
- E aí?
Eric olha para ele, respirando pelo nariz. Olha para as suas mãos, manchadas
de sangue. Olha-as atentamente: o sangue seca e as feridas cicatrizam, bem como
a dor diminui. Lança-se sobre o albino e lhe dá um tapa na cara.
- O que foi que eu fiz?
- O que foi que você fez? Acho que você sabe!
- Não fui eu quem te levou pra lá!!! Muito pelo contrário!!!
Se eu não tivesse te falado que a vida é quente, há essa
hora, você já seria um... um sabe lá o quê!!!
- É. Eu sei. Quantas vezes eu vou ter que voltar pra lá, hein?
- Foi só essa. Não se preocupe. Eu também passei por isso.
Todos os Exterminadores cuidados por anjos passam, porque os anjos...
- Eu já sei dessa história. E digo mais: se a intenção
de vocês, a intenção sua e a do Gabriel era que eu me tornasse
um ser cruel, insensível, sanguinário, frio, calculista... Se
vocês queriam que eu me tornasse um assassino como vocês... Então
vocês falharam. Porque eu nunca vou deixar que os outros decidam como
vai ser o meu futuro. Eu nunca, nunca, ouviu bem? Nunca permitirei que uma pessoa
controle o meu destino.
- Você quem sabe.
Eric suspira fundo, olhando friamente para Christian.
- Estive no limite da sanidade e da loucura e consegui voltar. Percebi uma coisa:
vocês são todos malucos.
- Eric, escute... Muitas pessoas dariam tudo que possuem somente para ter um
pouco do poder que você tem...
- É. Mas acontece que eu não quero esse poder. Não quero
nem uma migalha dele.
- Eric, você pode sair ao Sol, você não sente dor, pode controlar
mentes, ler pensamentos, entrar em lugares protegidos com a mais alta segurança
sem que ninguém perceba...
Eric agarra o espectro e fala, mostrando-o a Christian:
- Tudo isso, mas eu estou preso a essa joia. Isso é uma prisão.
Sem isso, eu morro!
- Você precisa entender que essa joia não é a sua
dona. Pelo contrário: você é o dono dela. Escute... - diz
pegando na mão esquerda de Eric, que estava sobre a cama - Você
está assustado e com raiva agora. Isso é normal. Eu também
me senti assim. Mas quando você descobrir tudo que pode fazer, vai gostar
e isso - aponta para a joia - vai ser apenas um detalhe sem importância.
Permita que eu lhe ensine tudo que você precisa aprender. Dê-me
esta chance. Por favor...
Eric olha para Christian por longos segundos. Por fim, suspira e fala:
- O que eu tenho a perder... além de tudo aquilo que eu já perdi?
Christian sorri, como se tivesse conseguido algo que há muito tempo desejava.
Era o dia seguinte. O Sol inundava aquela sala, pelas janelas. Em lados opostos
do cômodo, Christian e Eric, cada um segurando um bastão de madeira.
- Muito bem, Eric... Tente me atacar...
- Mas, eu não quero bater em você...
- Eric, é só uma brincadeira para treinar os seus reflexos. Agora,
tente.
Eric ergue o bastão. Olha fixamente para ele e para Christian. O que
o albino estaria planejando? Sai correndo em direção a Christian,
gritando. Quando vai dar-lhe um golpe pela esquerda, Christian se desmancha
e se reconstrói atrás dele. Eric vira-se furioso:
- Assim não vale!
- Claro que vale! Acha o quê? Que o inimigo vai ficar parado, esperando
você bater nele?
Refletiu e concordou. Tentou novamente. De novo, a mesma coisa.
- Eu nunca vou conseguir.
- Nunca é uma palavra muito forte. Só vou lhe dar uma dica: o
que eu estou fazendo, você também pode fazer.
Eric olha fixamente para Christian. Bate o bastão pela esquerda. A realidade
fica em câmera lenta: o pó de Christian passa para trás
de Eric, que se desfaz e atravessa Christian, ainda em formação.
Christian se reconstrói e Eric, atrás do albino, bate com o bastão
em seu pescoço. Christian diz somente uma palavra:
- Excelente...
E, após isso, desmaia.
E Eric e Christian aprenderam muitas coisas, um com o outro, por um longo tempo.