A Garganta da Serpente
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Jardim vazio

(André Luis Aquino)

Lembro de uma vez no tempo em que ainda era uma criança que havia perto do lugar onde brincava um grande e alto muro todo branco que se estendia por toda uma calçada da rua.

Com aquela já enorme curiosidade que tinha em minha infância queria saber o que tinha por trás daquele muro, mas ele era tão alto que sempre desistia da ideia.

Num belo dia resolvi matar de vez minha curiosidade e subi no banco de minha bicicleta para alcançar o alto daquele muro só que nem assim era capaz de conseguir subir até seu topo, mesmo diante dessa dificuldade pensei em não desistir facilmente do meu objetivo e resolvi me arriscar, saltei do banco da bicicleta com os braços esticados para agarrar na extremidade mais alta do muro e deu certo, poderia ter escorregado e caído ao chão, ter quebrado o braço ou qualquer outro osso, mas naquela época adorava me arriscar nessas aventuras acrobáticas e na maioria das vezes elas davam certo.

Mas todo o meu esforço não me valeu de nada, quando meus olhos pela primeira vez puderam fitar o outro lado daquele muro fiquei deveras decepcionado, estava tudo abandonado e não havia nada de interessante ali, era apenas um grande jardim abandonado com o mato crescendo em volta dos canteiros, as flores estavam secas e mortas os arbustos murchos e tinha uma pequena arvore no centro quase sem folhas mais ainda viva e no fundo havia ainda uma casa igualmente abandonada e deserta.

Fiquei ali no alto daquele muro apenas por um minuto, pois já estava preocupado em como iria descer dali, por sorte alguns amigos passavam por perto naquele momento e me ajudaram a descer em segurança.

Mesmo tendo sido na época uma aventura decepcionante jamais me esqueci daquele jardim abandonado que naquele tempo não significava muito pra mim, com a imagem guardada na memória hoje aquele mesmo jardim ganhou um outro sentido.

Com os anos passados a vida emprestou ao meu coração um pouco de poesia e aquela imagem guardada ganhou uma nova dimensão no meu pensamento e imaginei uma história que explicasse o motivo da existência daquele jardim vazio.

Um dia aquele jardim tinha sido belo, verde e florido e enfeitava o quintal de uma casa que abrigava uma família feliz, ao mesmo tempo que um homem era o pai da família era também jardineiro daquele imenso jardim.

E assim foi durante muito tempo, as flores e o colorido daquele jardim refletiam o que era aquela família, o pai e jardineiro viveu seus melhores dias naquele espaço, dedicou muita alma para tornar aquela família e aquele jardim as melhores partes de si.

O tempo passou, os filhos cresceram e deixaram a casa vazia para viverem suas próprias vidas em outro lugar e o pai ficou sozinho com a mãe e desta feita já estava mais velho e mesmo assim cuidava com todo carinho de seu jardim que cuidava dele de volta.

Mas um dia sua mulher morreu subitamente e ele ficou viúvo, perdeu um pedaço de si e nunca mais foi o mesmo, ela foi cremada e suas cinzas foram jogadas no jardim e fertilizam até hoje a árvore no centro do jardim que ainda teimosa permanecia viva.

O homem viveu até os seus últimos dias naquela casa e ficou conhecido naquela época como o jardineiro que regava as plantas e molhava a terra com suas próprias lágrimas.

Seu ultimo desejo teria sido ter suas cinzas jogadas igualmente no jardim e assim foi feito, misteriosamente algum tempo depois o jardim que estava quase morto voltou a florir e um tempo depois a casa foi vendida para uma nova família e para um novo pai de família e jardineiro.

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