Difícil tirar os olhos daquelas costas largas de músculos poderosos
que se moviam com ritmo sob a camiseta rasgada e suja enquanto ele batia com o
martelo na talhadeira e paredes iam sendo derrubadas. Difícil deixar de
notar como o suor brotava em sua testa queimada de sol, descia pelo rosto, escorregava
pelo pescoço e desaparecia sob a gola da camiseta puída. Patrícia
imaginou como seria passar de leve os lábios na pele úmida daquele
pescoço, lamber de leve as gotinhas que brotavam em meio à penugem
dourada que cobria a parte de trás da nuca. Que gosto teria aquela pele?
Certamente não o gosto limpo e civilizado da pele de seu marido, não,
algo mais forte e selvagem, gosto de sal, de mar, de tardes quentes e prazeres
esquecidos.
O que mais a impressionava eram as mãos. Não eram mãos enormes,
não eram exageradamente grandes. Era da firmeza delas que Patrícia
gostava. No dia em que o vira pela primeira vez, ele estendera a mão e
apertara a dela e ela sentira por um breve momento aqueles calos, aquela quentura.
Mãos firmes. Olhando para elas, para o movimento rítmico do martelo
golpeando forte a talhadeira, teve vontade de lhe tomar os instrumentos e acariciar
aquelas mãos, lavá-las com água morna e espuma perfumada
de sabonete, ensaboá-las devagar, passar os dedos sobre as veias saltadas,
acompanhando-lhes o desenho, sentir o calor do sangue sob a pele.
Sentindo-se observado, ele virou um pouco o rosto e deu a ela um tímido
bom-dia. O martelo e a talhadeira caíram no chão com um estrondo
e num gesto rápido, quase elegante, ele puxou pela cabeça a camiseta
e enxugou com ela o suor do rosto.
- Ele faz isso de propósito, pensou Patrícia. - Faz para me provocar.
Mas como será que ele reagiria se eu jogasse no chão esses projetos
e o puxasse pela cintura, agora? Será que ele iria gostar de rasgar essa
minha blusa fina de seda, será que iria gostar de arrancar esse jeans que
custa o mesmo que um mês do salário dele? E meu perfume de mulher
fina, será que iria agradá-lo?
- O Dr. Jairo já chegou?, ela perguntou, colocando os projetos em cima
de uma mesa coberta pelo pó fino das paredes recém quebradas, o
único móvel na sala em reforma.
- O engenheiro? Ele passou aqui mais cedo, saiu um pouco antes da senhora chegar...
Senhora. Eu não sou senhora, não, menino, não tenho idade
nem pra ser sua mãe! Nem sou essa mulher chique que você pensa que
eu sou, se você me provocar sabe o que eu faço? Te jogo nesse chão...
- Essa aqui é a última parede que vamos derrubar. Depois começamos
com a parte da pintura. Agora não deve demorar muito mais!
Com entusiasmo de menino ele mostrava a ela o resultado de seu trabalho braçal.
Parecia implorar pela aprovação dela.
- Isso é muito bom, respondeu Patrícia com um meio sorriso cordial.
- Meus clientes querem se mudar antes do natal.
Era o calor daquele dia abafado de quase verão ou ela sentia realmente
que o ar lhe faltava? E aquela sensação absurda, aquele nervosismo,
aquela timidez, o que eram? Medo não podia ser, nem mesmo um leve receio.
Ele era ousado, sim, era jovem e certamente tinha consciência do impacto
que seu corpo firme de macho tinha sobre ela, mas não se atreveria a ir
além de apenas provocá-la com sua presença seminua. Se ela
se aproximasse, ele recuaria.
- É um trabalho muito bom o que a senhora e o Dr. Jairo estão fazendo
aqui.
Um velho sobrado meio arruinado no centro da cidade, duzentos metros quadrados
de quartos e cômodos apertados transformados num loft arejado e cheio de
luz em apenas três meses. O jovem casal de jornalistas famosos ficara encantado
com o projeto.
- O trabalho de vocês também está ótimo, estou muito
satisfeita com a equipe.
Patrícia quase sorriu de satisfação quando o rapaz, o rosto
profundamente vermelho, desviou sem graça o olhar. Se eu avançar,
ele recua.
Quando ele apanhou do chão o martelo e a talhadeira, ela quase sugeriu
que ele parasse um pouco o trabalho, que tomasse um copo de água gelada
ou lavasse um pouco o rosto. Mas deixou que ele continuasse e fingiu trabalhar,
fingiu que se concentrava nos projetos em cima da mesa, abriu cartelas de cores
e examinou-as, tirou da pasta uma trena, mediu paredes, parecendo tão profissional.
Mas mesmo em sua concentração fingida era impossível tirar
os olhos daquele corpo, daquela presença A masculinidade dele era absurda,
enchia toda a sala, de longe ela sentia o cheiro fresco do suor dele. Mais uma
vez ela reparou nas mãos, na firmeza delas, nos dedos longos e fortes,
nas veias azuladas altas como morros. Imaginou aquelas mãos deliciosas,
fortes e rudes, segurando algo delicado, uma taça de vinho, talvez. Imaginou
aquelas mãos entre suas pernas. E sentiu uma moleza nos joelhos, uma quentura
no ventre imaginando com será que ele fazia amor, aquele rosto bem perto
do seu, o cabelo cheio caindo na testa molhada, a boca meio aberta de prazer.
Sentiu-se como uma personagem de Lawrence, com um sol dentro do útero.
E se ele tivesse uma ereção agora? Daria pra ver tudo sob o jeans
apertado, daria pra ver o pau dele crescendo? Eu iria ter vontade de me ajoelhar
na frente dele, ela pensou, de beijar o pau dele.
- Que é isso, dona Patrícia?!
- Cala a boca, menino! Me beija!
As mãos dela atrás da nuca dele, massageando aquele pescoço
bonito, a firmeza das coxas dele de encontro as dela, o peso do corpo dele apertando
o dela de encontro a parede e aquelas mãos, ah, as mãos! onde estariam
elas?
- Olha aqui o que a senhora faz comigo, olha aqui como a senhora me deixa!
O sexo firme dele aninhado de encontro aos quadris dela, as mãos dele guiando
as dela para baixo, de encontro ao pênis crescendo sob o jeans, a voz rouca
de prazer, a boca perto do ouvido dela.
- Olha aqui, olha aqui como eu fico...
Acordando do devaneio, Patrícia viu que o rapaz vestira de volta a camiseta
e apanhava as ferramentas, se preparando para ir embora. Como quem sofre um flagrante,
ela juntou os projetos sobre a mesa, guardou-os na pasta, apanhou na bolsa a chave
do carro.
- Bem, então até amanhã, ela sorriu.
- Até, ele sorriu de volta.
Estranhamente, o marido de Patrícia achou natural chegar em casa naquela
noite e encontrá-la fresca e cheirosa como se tivesse acabado de tomar
um banho de cachoeira. Nem estranhou quando ela o procurou com avidez, quando
tocou o sexo dele com vontade e o engoliu com apetite. Naquela noite ela queria
tudo, queria ser fêmea, queria prazer e orgasmo e não o sexo insípido
que o marido lhe oferecia nas noites tediosas de sábado. Não, ele
não estranhou nada daquilo, Patrícia às vezes era assim mesmo,
um pouco surpreendente. Somente o misterioso sorriso que ela tinha nos lábios
quando se deitou para dormir lhe pareceu um pouco fora de propósito. Ela
adormeceu com aquele sorriso no rosto, um sorriso não inteiramente de desejo
saciado, mas muito mais de pura malícia.
- O nome dele, ela pensou antes de cair num sono satisfeito. - Amanhã preciso
perguntar ao Jairo como é mesmo o nome dele.