A Garganta da Serpente

Ana Terra

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Marina e eu. Por que não?

(Ana Terra)

Estava cansada e deitei-me numa cama que achei num quartinho que ficava na passagem do corredor. Ela veio e continuou conversando comigo, não me lembro como, nem quando a minha cabeça encontrou as suas pernas e fez delas um travesseiro. Os seus dedos percorriam suavemente os meus cabelos e assim acho que adormeci ou pelo menos cochilei. A festa continuava, outras pessoas vieram até o quarto e conversavam com ela, Marina. Eu mal a conhecia mas deixava a minha cabeça repousar em seus joelhos e me sentia calma como ao final de uma batalha.

Cheguei antes dela, costumo ser pontual até para uma festa. Chega a ser deselegante. Mas ali não tinha muita importância tudo isso, digo a elegância. Quando ela me viu disse, num gesto teatral mas gracioso 'Professora!` e não me largou mais. Não sei mais de que falamos mas conversamos a noite toda. Os olhos dela brilhavam. Sempre me sinto perdida em festas mas de vez em quando vou. Nessa eu decidi ir por causa de um aluno da escola- não era aluno meu - que estava me paquerando. Aliás a festa era na casa dele. Chegando à festa me desinteressei dele. Acrescento que a minha idade não era muito diferente da dos alunos do curso noturno da escola. Para que não me julguem mal.

Eu já tinha visto Marina na escola porque ela era meio líder, desses estudantes que não passam desapercebidos, mas ela não era minha aluna, era amiga de uma das minhas alunas que me adorava. Era uma escola de periferia, com um público (hum, público?) dito carente. No último dia de aula ela, Marina, entrou na sala e pediu que eu assinasse a sua camiseta. Era o seu último ano na escola e ela queria guardar a camiseta assinada pelos professores e colegas como lembrança. Muitos estudantes fazem isso, ou faziam. Eu mesma tinha uma dessas camisetas assinadas como lembrança da oitava série. Deve ter ido parar no lixo. Minha mãe considera tudo isso frescura ou desperdício. Depois disso só revi Marina na festa. Lá pelas tantas, antes de nos separarmos, eu acho, ela perguntou se eu jogava vôlei. Ai que eu não jogava pôrra nenhuma, sempre fui péssima em esportes, fugia das aulas de educação física como o diabo da cruz, detestava todos os esportes mas em especial os esportes de equipe 'Pega essa bola zé mané!`'Mas que pamonha, é a sua vez de arremessar, de lançar, de..` Nem os termos eu conhecia. Enfim, as minhas experiências na área não tinham sido muito animadoras. Não expliquei tudo isso a Marina, só disse que não sabia jogar e então ela disse 'Eu te ensino` e pegou o meu número de telefone. Telefonou e eu não quis jogar vôlei, disse que tinha que pintar o meu quarto, ela disse que podia me ajudar. Fui buscá-la e pintamos juntas as paredes, dei-lhe um short da minha irmã e fizemos foto da bagunça, ela na escada e eu sentada no degrau logo abaixo, apoiada nas pernas dela. Ela tinha umas pernas muito fortes, de jogadora de vôlei. Nunca mais a esqueci. Quando ela se foi cheirei o short que ela tinha usado e gostei. Viajei e tentei pensar em outras coisas mas ela sempre me vinha a cabeça. Eu tinha vinte e um anos e nunca tinha visto uma mulher de maneira 'erótica`- por assim dizer -. Uma vez eu tinha sonhado que estava transando com uma mulher, eu não via o rosto dela mas era bom. Quando acordei achei estranho mas não pensei mais naquele assunto. Quando era criança eu costumava brincar de casinha com minhas primas, especialmente a Mercedes que hoje é uma jamanta. A minha mãe não nos

permitia brincar com os primos se não fosse sob o seu olhar vigilante, mas aí, quando brincávamos de casinha uma de nós tinha que ser o marido. Algumas vezes levamos a brincadeira adiante e nos tocamos por umas frações de Segundo. Um dia entramos numa furreca velha do meu tio (a gente chamava assim o carro dele que nem andava mais) e Mercedes dirigia, quer dizer, rodava o volante para lá e para cá e eu era a mulherzinha do lado, ou talvez fosse o contrário. Nesse dia, nos beijamos rapidamente, muito rapidamente e

rimos e saímos correndo da furreca do meu tio porque ele odiava crianças e se nos surpreendesse ali, estaríamos fritas. Uma outra vez a gente se deitou, como marido e mulher e nos tocamos os pés, as mãos..Nunca fomos muito longe. Essas eram as minhas únicas experiências eróticas com mulher, quer dizer, não difere muito das outras mocinhas. Nos encontramos, Marina e eu, fomos ao cinema, fui à casa dela muitas vezes. Ela tinha dezessete anos. A mãe dela não gostava desses encontros e quando ficávamos conversando até tarde dentro do carro ela gritava com sua voz esganiçada: 'Marina, vem pra dentro que já é tarde!' No começo ela, a mãe me respeitava um pouco porque eu era 'uma professora`, mas depois, quando entendeu que alguma coisa estava acontecendo ali, mudou de ideia. É certo que Marina ainda era jovem, mas para trabalhar e carregar nas costas quase toda a responsabilidade familiar, ela não era. Ela era muito madura para a idade e muito responsável.

Um dia chovia muito forte e nós estávamos estacionadas em frente a casa dela. Nós apenas nos olhávamos e não falávamos de nada. Toquei os seus dedos, toquei a sua boca e colei levemente os meus lábios aos seus. E assim permanecemos durante quase nove anos.



(.....a seguir, cenas dos próximos capítulos............
"Agora que temos a nossa casa, é a chave que sempre esqueço, vem cá, meu bem, que é bom te ver......)

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