A Garganta da Serpente
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Diário de Piratas

(Coelho de Moraes)

Dia Um, como se nascesse

Perdidos entre beijos e abraços nostálgicos eu e RoseBraga resolvemos comer a pizza do sábado. Assim se começa um conto comum e vulgar. Terá começo meio e fim?

Com quantos dígitos veremos no ar as aves de arribação? Como se conheceram a América e o jovem melindroso perseguido pelo destino? O episódio foi de uma banalidade comovedora, e envolveu uma pulseira perdida e um mal-entendido. Menos irrelevante será talvez relatar como sucedeu a revelação de que eles partilhavam algo mais do que a vontade indomável de transformar a Mogiana (de Pinhal a Mococa) num imenso palco para os trânsitos e brados de Pentesileia e de Aquiles e de toda fauna de Vereadores que já ocuparam, e ocupam, as cadeiras da Câmara... tais cadeiras aceitam quaisquer tipos de bundas... bundas dorminhocas, bundas vagais, vagabundas, bundas perdulárias, bundas de futuros prefeitos e não há nada que tenham construído a não ser a capacidade de observar o tempo passar, pois tudo o que pretendem haver construído existiria assim mesmo, sem interferência dos tais parlamentares. Mas a história é feita desses equívocos, e dessas bundas vazias, ou dessas estórias.

Valha-me Alexandre, o Herculano, que propunha uma bunda como cousa vulgar e nada mais.

Foi quando o povo da cidade, tendo eleito por duas vezes ou três vezes padres e analfabetos, fissos isso e aquilos, pró-rogos e vicariato sem vergonha para um projeto Cura cuja eternidade se desdobra além de nossa lucidez, em piscinas inúteis e adulteradas, em clubinhos populares para agrado da multidão faminta e burra... tardia também, revelou que não saberia o que escolher, caso houvesse escolha: a felicidade ignorante e feia ou a lucidez feliz e desavergonhada, profunda e permanente sobre as razões e timbres da infelicidade. COELHO, não o do Updike, sentia o mesmo, e estas coisas criam um vínculo menos quebradiço do que um passado de banco de escola ou de caserna partilhada. Mas as cousas não se ficam por aqui, há também a paixão comum pela gastronomia do sul de minas, o "segredo mais bem guardado da cozinha mineira", talvez. Perdições entre pamonhas e curaus...



Dia dois, e Kafka na panela

Terça-feira e é dia marcado para o cinema. Eu e RoseBraga, vinte horas pouco mais sairemos do Jardim São Luiz, Cinemateca. A marcar em todas as agendas e datas de passagem: Ver e rever O Cozinheiro, o Ladrão, Sua mulher e Sua amante, mas não se deve passar sem o Bebê Santo de Macon, ou ainda A Tempestade, já que falamos sempre de um Pedro CaminhoVerde, autor de obras primas. Todas suas obras serão primas? Nada disso porém passa pela cabeça de mocoquenses. A eles se permite dormir em música que dizem ser sertanejas... mas, limitam-se a nos deixarem Zen - Zen paciência. A saga das testas cobertas de galhos, as dores de cotovelo, a choradeira de trouxas alcoólicos esparramados nos bares do Descanso, por exemplo, enquanto as vacas mugem ao longe e de longe se vê um pôr-de-sol flagrado entre cambiante de violenta e um sulferino. Isso antes. Agora, hora noturna e pouco fria, nos sentiremos aquecidos no cinema. Enquanto não chega a hora de despejar do trono o alcaide apedeuta e sua corja de lambões e lambe-sacos, enquanto a saga do senhor sem anéis não se der à mostra, contentemo-nos com as glórias passadas, idas e desguarnecidas de qualquer atavio.



Dia três, enquanto as chuvas disparam

Excelente. Eu e RoseBraga na cama. Comíamo-nos!

Por favor, tentem compreender. Ou não! Não julgamos, sim julguemos como cousa de puro oiro, mas, não condenamos, sim, sim, condenemos, enfim para outras terras e exclusões maravilhosas, porém, não pratiquemos o ostracismo, entre estranhos em terras estranhas, contudo enviemos para o exílio as piores de nossas malfadadas ideias. Em Mococa, Macondo e outras terras, ideias não servem para nada. Não é uma questão de fundamentalismo, nem islamismo, nem alcoranismo, nem xiitismo, podendo ser shiitismo dos ingleses em que tudo se transforma em merda, como por exemplo a cultura de uma cidade como a nossa - como orgulhosa cidade do interior, tudo se transforma em bosta; não é uma questão de atropelo a qualquer direito natural. Apenas pedimos respeito e consideração. Reclamamos somente o direito ao nosso quinhão quotidiano de ar relativamente puro. É só isto. Há espaço para todo mundo mas você fica bem de verde, quando engole sua fumaça e se transforma em um saco podre de câncer. Você merece.

Eu RoseBraga chupamos nossos sexos.



Dia quatro, um momento no viés

REPÚBLICA 70 RIACHUELO: Por lá passaram SemiDeus, Bado, Preto, Mandrake, Pancada, o caro CDF, o Zize, o Vasconcelos de São José do Rio Pardo, onde muita gente grada ia mijar nos bailes, e na devolução, o mijo de SanZé vinha em retorno, além da quebradeira de copos, corpos e vidros e janelas... bailes e brigas... esses entre outros. Indicaram-me recentemente dois fatos com relevância republicana assinalável.

Eu e RoseBraga, na manhã, ouvíamos tais histórias, comendo muito requeijão e pão preto.

No sítio de não sei que pessoa duas amigas, íntimas amigas, amantes amigas da mais pura sociedade mocoquense se mataram pois seu amor não era permitido pela sociedade da época... Seria agora?... isso entre outras cousas... entre outras coisas, leio textos cujo teor denota uma das mais louváveis atividades que conheço:hoje vejo que meu partido político se mistura com os demais... Culpa minha? e, se deve perguntar, por que fomos tão cegos? Já não se misturavam antes? Não vimos? Éramos coniventes?... concordata. Para além destes temas de óbvia e lamentável atualidade, muitos outros são abordados, investido de uma grande e magnífica opulência. Falece o comediante mas a piada continua com a laicidade e os valores republicanos (ou as suas violações) como denominador comum.

Tenho ocasião de exprimir desconforto ao vocábulo "partidários" e seus derivados. A lógica de negação partidária, re-fundação de outra vertente, mudando o nome da estrela, ou no mais, nomeado a estrela para SOL, e contestação que lhe está implícita parece-me, em certas ocasiões, poder tornar-se contraproducente, no entanto há um barco para se navegar e é nesse caminho que vamos. Talvez com mais espaço, para desatinos e desvarios e devaneios...



Dia 5, enquanto a água não me chega aos pés

Excelente domingo para nós.

TV a satélite e tudo mais. Muito filme bobo, mas algumas relíquias.

ANÚNCIOS De outros tempos: Este é velho como muita gente da cidade... Parada no tempo antigo como muita gente da cidade... Tem muitos que ainda choram por uma fonte dos Amores que nunca conheceram corretamente... Teriam saudades dos pernilongos? Ou do mal cheiro? Ou ainda dos lacerdinhas que infestavam nossos cabelos? Vá saber!!... antiguinhos. Metade desse se maquiam de jornalistas e desabam palavras nas linhas tortuosas de uma imprensa que odeia concorrentes. Quem se lembra deles ainda?

Mas, o filme continua: Inseticida Banzé, cuidado para não matar o cão também:

E a velha tinha moscas... e as moscas orbitavam... sobre a velha volitavam...lá na casa suja e limpa...Morriam as moscas, matavam a velha... A velha dizia... bradava... ninguém ouvia... banzé, banzai! Flavinho corria no quintal, acorria atrás dos balões e gritava banzai!banzé... Contras as moscas bato o pé! Festa Junina!

Sabem, aquela velha que dá um pontapé no balde?

Esquece, tal velha não existe... velhos são comodistas...

É noite eu e RoseBraga vamos mergulhar em mais uma noite de amor.

Assim acaba nossa história de amor.

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