Foi num sábado. Logo de manhã, o céu já estava
coberto de nuvens escuras com desenhos horripilantes, e pelo barulho, parecia
ter uma baita confusão lá em cima. Depois do almoço, Afonsinho
tocou a campainha. Eu pensava que ele já tinha desistido, mas o meu amigo
era doente por futebol e jogava muito bem. Abri a porta e encontrei Afonsinho
animadíssimo:
- Vamos! Na chuva é mais divertido ainda. - disse ele, com a bola embaixo
do braço.
- E raio? - eu perguntei.
- Raio só cai longe.
- A mãe não vai deixar.
- Fuja. Eu fugi.
- Será? - eu pensei por segundos. - Tudo bem, espera aí fora.
Menos de um minuto e a gente já corria pro campo, que era de terra com
traves de madeira. O pai do Tião guardava duas redes que nossa turma comprou,
com a ajuda dos parentes e dos vizinhos.
Para jogar ali tinha que ter boa mira, porque se errasse o gol, a bola ia parar
no mato e quem chutava é que ia buscar. Alguns moleques não chutavam
no gol só para não ter que buscar a bola. Eu achava que jogar futebol
sem fazer gol não era tão bom, por isso fui bastante vezes no mato,
mas também fiz muitos gols e isso que era legal. Afonsinho fazia muitos
mais e jogava sempre no meu time.
Assim que a partida começou, a chuva caiu forte. A terra foi virando barro
e depois lama. Todos nós ficamos imundos. Era muito legal quando a bola
parava em alguma poça. Espirrava água para todos os lados e encharcava
o tênis. A bola ia ficando cada vez mais pesada.
Nosso time ganhava por três a um. Daí a mãe do Beto chegou
e fez ele ir para casa. No dois ou um eu fui para o gol porque o Beto era nosso
goleiro. Ainda dava para ouvir a bronca que o Beto levava e eu já me cobria
de lama voando atrás da bola.
Ganhamos por seis a quatro. Depois do jogo, fomos tomar refrigerante e conversar
sobre a partida. A lama começou a secar no corpo. Eu tinha riscos pretos
embaixo das unhas e minha roupa estava toda molhada. E era hora do drama: chegar
em casa.