(Para Tatiana Branco, minha menina)
Era só eu olhar para ela e Tatiana vinha com essa pergunta. Eu encabulava
e abaixava os olhos. Foi assim desde o começo do ano passado. Na sala,
na merenda, na fila e nas festividades.
Ela veio de outra escola. Toda faceira e cheirosa, Tatiana entrou na minha sala
de nariz erguido, chacoalhando os cabelos castanhos da mesma cor dos olhos gigantes
e curiosos. Lembro também dos brincos de coração e das
meias listradas de rosa e azul que saíam dos sapatos de boneca dela.
Eu, que não sou bobo nem nada, vi que surgia ali uma forte candidata
a rainha da primavera. Ou melhor, queria Tatiana como primeira-dama quando eu
fosse presidente. Mas já no primeiro dia, na primeira olhada, ela sentou
do meu lado, virou e disse:
- O que que foi?
- Nada. - respondi assustado.
Assim o ano foi passando, sem que eu pudesse me aproximar de maneira alguma.
Quando chegaram as provas finais, eu estava com problemas na Matemática,
porém no resto das matérias eu me dava muito bem. E foi na aula
de História que eu encontrei uma oportunidade de ajudar aquela encantadora
menina. Ela precisava de um sete para passar e a professora podia perguntar
qualquer coisa estudada durante o ano todo no teste do dia seguinte.
Tomei coragem e me ofereci:
- Se quiser, eu posso ajudar você em História. Já estou
aprovado faz um tempão.
Tatiana me olhou de um jeito diferente, pensou, olhou mais um pouco e finalmente
falou:
- Então tá! Amanhã de manhã na biblioteca.
Oito horas eu já estava lá. De banho tomado, rosto lavado, cabelos
penteados e dentes escovados. Mamãe até se surpreendeu porque
não precisou pedir para eu fazer nada disso.
Esperei, esperei e quase dez horas ela apareceu:
- Oi. Será que ainda dá tempo?
- Claro. - respondi com segurança.
Daí expliquei a ela sobre os assírios, os fenícios, os
gregos e os romanos. Também sobre as conquistas marítimas e a
Revolução Francesa. Ela prestou a maior atenção
em mim e aqueles olhos enormes fizeram com que eu me apaixonasse completamente.
Tatiana levou nota oito e foi aprovada. Já eu, que precisava de apenas
um quatro em Matemática, quase rodei porque não consegui estudar
direito de tanto pensar nela.
Neste ano estamos em turmas diferentes. E na primeira chance que tive de me
aproximar, ela veio com essa:
- O que que foi?
Não aguentei.
- Foi que você é a menina mais linda que eu já vi.
Tatiana corou e fugiu.
Depois desse dia, ela passou a me evitar pelo pátio. Mas tudo bem. Se
eu posso esperar para ser presidente, por que não poderia esperar até
as provas finais?
(Volta Redonda, 04/05/2006)