Ela era morena clara, de sedosos cabelos negros e intrigantes olhos verdes.
Seu nome era Cleide e, com seus treze anos, já destruía os corações
masculinos. Usava o fato de já parecer uma mulher feita para assistir
aos filmes proibidos para menores de 18 anos, para ir aos bailes sem a escolta
dos pais e, principalmente, para namorar.
Quando Cleide colocava seus lindos vestidos rodados e prendia os cabelos semilongos
num arremedo de rabo-de-cavalo, seus belos olhos verdes se destacavam ainda
mais. Não perdia uma brincadeira-dançante, como eram chamadas
as baladas naqueles anos dourados.
Aquela noite de um novembro enluarado marcou para sempre a vida de Cleide nos
seus catorze anos. Marcou também a vida de todos os que acompanhavam
sua paixão por Kaleb, um moreno bonito, descendente de árabes,
que agia como um Don Juan.
Kaleb namorava, ao mesmo tempo, Cleide e Zuka, melhor amiga de Cleide. No início,
era segredo. Zuka era "a outra" e Cleide, a titular. Mas um belo dia,
Cleide descobriu tudo. Ela e Zuka pegaram-se a tapas e juraram nunca mais se
falar. No entanto, a amizade de tantos anos falou mais alto e, não demorou
muito, as duas voltavam às boas. Kaleb nem se abalou. Continuou com as
duas, agora em situação confortável, namorando às
claras.
Naquela noite, Cleide e Zuka estavam juntas, apreciando os que dançavam
freneticamente o rock'n'roll, já que nenhuma das duas tinha grandes habilidades
no campo da dança. Bebiam disfarçadamente sua cuba-libre, uma
mistura de coca-cola e rum, bebida da moda. Não tiravam os olhos de Kaleb,
que se fazia de difícil, conversando tranquilamente com os amigos.
Quando na vitrola começou a tocar "Only you" com os Platters,
Cleide e Zuka tiveram um sobressalto. Era a música deles! Qual das duas
ele iria tirar para dançar? E a atenção geral voltava-se
para os três. Kaleb esperava uns minutos antes de caminhar em direção
às duas namoradas. Quase se podia ouvir o som das batidas do coração
de Cleide e Zuka.
Kaleb parou diante das duas. Fez uma longa pausa, com pose de quem sabia do
frisson que esse triângulo causava. Olhou bem dentro dos olhos
verdes de Cleide, desafiadores. Olhou nos olhos negros de Zuka, marejados. Voltou-se,
olhou para o público por um instante e, sedutor, tirou Cleide para dançar.
Zuka, coitada, não conseguiu segurar a barra e desfez-se em prantos.