I'm not the man you think I am.
Essa musiquinha toca nos créditos finais de um filme em que o Malkovich,
John se faz passar pelo Kubrick, Stanley e engana os trouxas lá por Londres.
E aí vem a pergunta.
Culpa do trapaceiro, que age, ou aceitação pura por parte dos
iludidos?
Os roubados negam-se a depor na polícia por vergonha. E o enganador segue
sua vida de espertezas.
Vejamos o Reinaldo.
Logo conhecido por Rei Naldo, engraçado, essa história não
é propriamente urbana, localiza-se nas estradas brasileiras.
Naldo sabia-se esperto e envolvente, boa lábia, sabido, conhecido de
todos e, mesmo assim, ele fazia e acontecia.
A Greta, por exemplo, casou-se com ele.
- Por que, guria?
- Por quê? Ora, ele me convenceu, disse que precisava de uma mulher para
tratar suas feridas e eu aceitei. 6 meses depois ...
- E daí, Gretinha?
- Ora, não dava, ele era outra coisa na intimidade. Na rua e na casa
da mãe ele me dava carinho, presentes, dinheiro, depois ... nada. Outro
homem, até eu suspeito que ele ... deixa pra lá.
Ele aplicava golpes lá e cá, sabiam de suas taras: cleptomania,
fazia-se passar por personalidades outras, um anjo matreiro.
O Tavares arranjou-lhe um emprego de despachante no galpão à beira
da BR-..., era receber e despachar, tudo bem, as coisas andavam bem, o Reinaldo
fez notável network, web, essas coisas.
Fazia pequenos trabalhos para muita gente, ora mostrava uma face carrancuda,
outras vezes era flácido, ou duro na queda, bom negociador sempre.
Mas os prejudicados começaram a aparecer e um irritado Tavares apareceu
à sua frente para representar os interesses burlados.
- Mas, meu preclaro Rei, me diga, o caso do Duda.
- Duda? Duda, Duda, ah, sim. Ele queria umas espiroquetas para as suas rebimbelas
e eu consegui. 3 partidas, cada uma com 100. Eu forneci e ele me pagou. Perfeito.
- Sim, a primeira partida, perfeita, peças originais, depois ...
- Depois eu facilitei, o primeiro fornecedor me tratou mal e troquei, não
foi culpa minha.
- E o Cardoso?
- Cardoso? Ele reclamou de quê?
- Você não entregou e não devolveu o dinheiro.
- Não foi assim, eu falei pra ele que havia um risco, a coisa não
era legal, portanto podia dar errado, mas quem correu riscos, arriscou a vida
fui eu, logo eu tinha que ter uma compensação mínima. 50%.
Justo.
- E a Lorna, aquela loirinha da Tia Dulce, como é que você ...
- Eu? Não fui eu, foi o Tavarinho ...
- O quê? Meu filhinho?
- Isso. Ele queria ela, mas é tímido e eu falei, deixa comigo,
te arranjo ela em 2 semanas e cumpri o trato.
- E por que os dois estão insatisfeitos?
- Eu disse, vou amaciar a pequena, namoro, deixo ela arriada dos 4 pneus, faço
uma falseta com ela, ela fica frágil e daí você entra como
o salvador. Dito e feito. Que que eu posso fazer se ele não tem punch?
- Punch, você chama aquilo que você fez com ela de punch?
- Era para deixar a terra bem arrasada, o Tavarinho chegava, com o Rocinante,
e aquela bengalona de D. Quixote que ele tem, e salvava ela, consertava o estrago
e bola pra frente ...
- Consertar como, seu imbecil?
E partiu pra cima.
Hoje ele age na cidade grande, um golpe aqui, outro bem distante.
- Cara, o meu erro é que fazia tudo muito próximo, entende? Aqui
não, tudo é longe, ninguém se conhece, e eu sou um incógnito.
Percebe?