A Garganta da Serpente
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Retorno às Estrelas

(Flaid Áries)

Parecia que as estrelas brilhavam mais intensamente naquele momento, como se estivessem anunciando a chegada de alguém há muito tempo esquecido.

No interior da enorme cúpula transparente, em meio a superfície tóxica semivulcânica de um planetinha distante, Cetri acordou ofuscado pela intensa luz branca solar que irradiava pela recinto.

As pupilas estreladas se acenderam rapidamente em seus olhos negros. Seu corpo flutuava dentro de uma esfera translúcida rodeada por vários cristais multicoloridos que emanava uma energia vermelha em volta da esfera.

Ele olhou para seu corpo e percebeu que estava completamente diferente do que se lembrava, embora suas lembranças fossem muito vagas. Apenas o formato do corpo e membros parecia com os de um ser humano. Sua pele era de uma tonalidade azul celeste translúcida sem nenhum pêlo em toda a extensão. Várias linhas de energia percorriam por baixo da pele como se fossem vasos sanguíneos, partindo de um ponto do tórax em direção ao resto do corpo. No lugar de pêlos capilares havia centenas de finíssimos filamentos luminosos que se projetavam para cima, lhe dando uma aparência punk.

Estava um pouco confuso devido as lembranças distantes mas sentia que tudo aquilo era familiar como se já estivesse estado ali há muito tempo.

Subitamente, uma grande abertura circular começou a se formar à sua frente na esfera. Sentiu uma poderosa força lhe puxando para fora. Assim que saiu da esfera, avistou uma figura semelhante a si, com o corpo totalmente nu mas que possuia belas formas femininas. De suas costas projetavam-se vários pares de linhas de energia que se moviam lentamente de forma coordenada, parecendo um belo par de asas luminosas. A "mulher alada" flutuava em pleno ar e assim que pousou no chão, suas asas sumiram instantaneamente. Ela pôs Cetri de pé no chão do recinto, a poucos metros da esfera e assim que liberou seu controle sobre ele, se aproximou, lhe dando um forte abraço.

- Bem vindo de volta, meu irmão. Que bom que seu exílio acabou. Mesmo que o tempo dos mortais pareça muito curto aos nossos olhos, para mim ficar sem você foi como uma eternidade !

Ela falou num antigo idioma mistijano; sua voz era forte e radiante mas ao mesmo tempo era tão doce e suave como uma bela sinfonia tocada por miríades de anjos. Seu abraço reconfortante e caloroso lhe trouxe novas lembranças de diferentes épocas de sua vida. Sim, agora lembrava claramente de sua doce irmã Satra e da época que ambos cruzavam os céus da grande galáxia Adaras.

- Satra, que saudade ! - disse no idioma celeste dos serceiD, já ñ precisando usar um idioma mortal, algo que os seres cósmicos ñ apreciavam em nada.

Eles ficaram abraçados por vários segundos, desfrutando o calor de seus corpos até que se desvencilharam lentamente, cada um esboçando um largo sorriso de felicidade. Satra então lhe disse seriamente, fitando os olhos negros de seu irmão mais novo :

- Me diga irmão, depois de todo esse tempo agora já se arrependeu do que fez ? Ou seu amor pelos mortais ainda é grande o suficiente para você sacrificar tudo por eles ? Será que seu amor por eles é maior do que seu amor fraterno ou a grandeza do universo ? - e sem querer deixou escapar um leve tom de ciúmes ao citar os mortais, referindo-se aos povos do planeta Mistijia que seu irmão tanto protegeu no passado.

Ele se virou, olhando fixamente as estrelas, lembrando do que tinha feito que causou seu longo período de exílio. Cerca de pouco mais de duzentos anos terrestres atrás, Cetri era o guardião celestial do sistema solar de Audros, um dos setores mais populosos e importantes da galáxia. O jovem serceiD, ainda inexperiente, ficou fascinado com a riqueza cultural dos povos dos planetas Netron e Mistijia. Mesmo sabendo que as leis celestiais proibiam a simples interferência direta de um serceiD sobre um povo mortal, Cetri se rendeu a paixão e desceu em Mistijia num corpo mortal para sentir de perto o caloroso amor mortal. Como consequência ele foi condenado a ficar preso num corpo mortal, num planeta distante e isolado por cerca de 180 anos, a média de vida de um mistijiano.

- Não, eu ñ estou arrependido de nada do que fiz, minha querida irmã ! - disse Cetri com um leve sorriso, materializando suas recém-formadas "asas" de energia - Para mim o risco valeu a pena mas eu ñ faria isso novamente pois o meu castigo ñ foi terem me afastado das estrelas como pensavam e sim foi terem me afastado dos seres que mais amo no universo : você e os mortais !

Dito isso, Cetri se despediu de Satra e partiu velozmente para o centro da galáxia. Estava ansioso para voltar a vigiar, mesmo que de longe, aqueles seres tão frágeis e minúsculos comparados a ele mas que possuíam sentimentos mais fortes e nobres do que qualquer outra raça do universo, com excessão dos terrestres, que chegou a observar numa única viagem que fez a Via Láctea e achou-os muito parecidos com os mistijianos.

Sua luz cósmica misturou-se as infinitas estrelas do céu por um breve instante e foi se apagando lentamente a medida que se distanciava do planetinha onde Satra permanecia imóvel observando sua partida. A bela serceiD de longos "cabelos" escarlates ficou comovida ao entender as palavras do irmão. Estava muito feliz por tê-lo de volta em sua vida e grata a todos os mortais pelo bem que fizeram a ele.

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