A Garganta da Serpente
  • aumentar a fonte
  • diminuir a fonte
  • versão para impressão
  • recomende esta página

Um caminho de prazer

(Miguel Eduardo Gonçalves)

Ao me situar no campo subjetivo, explorando o emocional, o fictício, sempre deparo com prazerosa excitação, quando o jogo com as palavras vem dar no papel!

Quem, diante de uma bela paisagem, diante de um pôr-do-sol, da noite enluarada, não se enche de ideias e pensamentos? A naturalidade com que isso ocorre, a dimensão sentida, a sua extensão, exigem uma substância sutil para traduzir tudo isso para o mundo: a sensibilidade apurada, para que essas ideias e pensamentos, quando passados para

vocábulos, orações, transmitam a intensidade do nosso senso estético, lógico e, por que não, da nossa cadência, musicalidade, possibilidade poética, enfim. Temos arte quando conseguimos dar sentido a tudo quanto vemos ou imaginamos, seja através da pintura, da música, da linguagem. Claro sinal de que esse vestígio de tudo o que se acha espalhado pelo mundo é reunido, muito caracteristicamente, pelo artista, vamos encontrar se, exemplificando, escolhido por tema uma floresta, um bosque, ou o infinito, deixamos que a nossa alma traduza, numa descrição maravilhada, toda a felicidade de estarmos separados do mundo, como nas montanhas, bem assim a alegria de se estender sobre ele, como à beira-mar, onde divisamos o

infinito, lá onde o céu se junta com o mar. E para dizer da lua, do amor, das horas, do silêncio que fala, do isolamento que entristece e que enche nossos sonhos de poesia, e do firmamento, há que ser artista, porque somente ele é que consegue captar através da imaginação o invisível, o imaginário e indizível, para mostrar ao mundo de forma clara o que o impossível representa, pelo sentido que lhe é conferido, provando, assim, suas verdades.

Esta minha aparição inaugural, assim como a imensa satisfação de que certamente serei acometido pelas futuras, dão-me a grata sensação da felicidade que ora encontro na presença de todos os navegantes.

O poder que faz o sentido das palavras é que me levou, modestamente, a pretender dar-lhes um caráter puro, brincalhão e infantil no versinho seguinte, para, depois de decorado, ser recitado teatralmente:

O PASSARALHO PIOPARDO

E CHOVIA...CHOVIA...CHOVIA...,
A FLORESTA ENCHIA...ENCHIA...ENCHIA.
A ONÇALINA TINHA ROMISETA,
A ÁGUAFONTE JÁ NA CAMISETA
RODOU, DOBROU, SUBIU, DESCEU;
NADA, ESTAVA SEM SABER O QUE FAZER.
FOI QUANDO CHEGOU NA SUA ÁRVORE
COM PORTINHOLA E ELEVADOR,
ENTROU DE ROMISETA E SUBIU
SUBIU, SUBIU TÉTÉLÁ NO PICOMONTE,
BRINCALHANTE ONÇA FELINOLHETA,
BISTROCO DE CARACOCONHA
DE NHANHA COM CREME DE BIJULHETA
DE CARÁ CARÁ JARARACEROMA
DE PIRA PIRA MANGARÁ TROMBETA,
E DE LÁ VISTOVISOU OS PASSARALHOS,
RODAVOTRENTES ASSUADOS,
AFASTANDO AZIAGOLOUCO TRESLOUCADOS,
INDO E VINDO ÀS REBATINHAS.

GRILAFANGOS ABELHUDOS
BICUDAVAM QUAL CHELEME,
PICUDEJAVAM CARRANCUDOS
FLORESTIANDO MALFERIDOS,
TATIANDO SUGISMUNDOS
TRELELECO TREMETREME .

UM, DOIS, TRÊS
COMEÇAR OUTRA VEZ
MANDINGA NEGROFANTE
SETATENSA TREBUNDÊ
ZUNZUNFIDANTE QUERROMPANTE
FRETEMULAM PASSARALHOS
NO REINO DO PIOPARDO.

  • Publicado em: 20/05/2003
menu
Lista dos 2201 contos em ordem alfabética por:
Prenome do autor:
Título do conto:

Últimos contos inseridos:
Copyright © 1999-2020 - A Garganta da Serpente
http://www.gargantadaserpente.com.br