Domingo. O sol prenunciava um belo dia. Fúlgidos raios surgiam ao leste
e como um menino que procura aventuras, joguei na mochila meu canivete (presente
do meu amigo Osmar-pescador), minha velha fotográfica e uma garrafa de
água. Saltei sobre a "magrela" e iniciei minhas pedaladas.
Destino: Glicério.
O vento nordeste, embora suave, parecia querer me ajudar por todo o trajeto.
Logo que cheguei próximo ao bairro da Aroeira, rua Alcides Mourão,
já sentia a falta que faz uma ciclovia. Com bastante energia e entusiasmo
alcanço o trevo de Macaé/BR-101. Logo percebi que meus problemas
começavam. Um gole de água. A meia xícara de café
que eu havia tomado à 01:45h me dava uma vontade desgraçada de
fumar. Resisto.
A mochila começava incomodar. Parei a uns 500 metros após o
trevo. Retirei o cadarço do meu "bamba" e amarrei como pude
ao guidão. Melhorou. Ao menos minhas costas não suavam mais tanto.
A cada 30 minutos, uma pausa, já procurando a sombra dos bambuzais, ipês,
canafístulas, aroeiras e araçás. Araçá. Minha
sorte: araçás... Voltei ao passado quando deparei com um pé
ao longo da estrada Macaé-Glicério. Depois outros e mais outros.
Delícia de fruta!
Após um incessante esforço para subir uma ladeira, o comando de
marcha quebra. Legal! Pensei. Agora é que estou ferrado mesmo. Paro na
sombra e pra minha surpresa: goiabas! Dou um solavanco no galho, caem três.
Todas bichadas e só se prestavam mesmo a matar a fome dos sanhaços
e muitos outros pássaros que ainda podemos ver por aquelas paragens.
Retiro o cadarço que amarrava a mochila e travo o comando de marcha.
Resolvido!
O sol bate forte do lado direito do meu rosto. Sigo em frente e logo após
a fazenda Airís, descubro uma fonte brotando da terra, mas para a minha
surpresa, a fonte é artificial. Metálica. Um cano dágua
jorra e ao sol das 09:20 faz um belo arco-íris. Jogo a "camela"
no canto da estrada e aproveito o banho. Mas um pé de araçá.
Estou feito. Banho tomado. Alimentado. Feliz eu prossigo, mas Glicério
parece cada vez mais distante.
O movimento de carros vai se intensificando. A cada subida, um martírio.
A descida um alívio. E ainda o short molhado e a cueca que cola na bunda
e ainda se têm que dar aquela levantada para retirá-la do local
inconveniente. Avisto as serras, o Frade parece estar logo ali...Pedalo. Carros
passam. E muitos. Não sei que lado da estrada seria mais perigoso. Sem
nenhum acostamento. Fraquejo se devo prosseguir. O risco é grande!
Com os olhos findos no horizonte, penso no almoço no bar do Serginho,
um banho antes no chuveirão em Glicério e aquele pedaço
de frango assado. Talvez carne. A fome aumenta. Cadê os araçás?
Mais uma hora pedalando e meu objetivo parece distante. O ímpeto de prosseguir
definha com o cansaço. Foi o cigarro! Maldito cigarro!
O vento nordeste não concorda que eu volte e agora sopra contra.
Pedalo mais devagar. Percebo a beira da estrada coberta de capim-guiné
como o moderno mata. Pássaros esmagados e cobras-coral (não me
perguntem se eram as falsas) estão na beira da pista. Minhas paradas
para descanso são mais frequentes e quando avisto o "famoso"
Memorial da cidade, penso em solicitar meu enterro. Mas hoje é domingo...