Eliane e sua filha Telma de 8 anos estavam na praça principal do bairro,
tendo saído do centro comercial onde a mãe havia realizado algumas
compras. Como já passavam das 13 horas, Eliane sugeriu que ambas almoçassem
naquele momento antes de irem ao cinema. Telma concordou com a ideia,
tendo em vista que desta vez ela escolheria o filme.
Eliane puxou a garota pela mão e sentaram-se na 1ª. mesa do estabelecimento,
bem perto da janela onde tinham uma ampla visão da rua.
- Mamãe! Aqui tem bife com fritas?
- Creio que sim. Mas vou pedir um gostoso canelone com bastante carne moída
para você derramar extrato de tomate! À noite lhe servirei bife
em casa.
- Mamãe, eu não aprecio estas comidas italianas. Coloca bem pouquinho
no prato que depois eu desconto na banana caramelada.
- Quem come pouca comida salgada não deve entupir o estômago com
muito doce. Isto ajuda na criação das lombrigas!
Mal o garçom se afastou depois de deixar os pratos, Telma deu 3 garfadas
na comida estacionada em seu prato. Sua fisionomia não era de satisfação,
com certeza.
- Já comi bastante, mamãe?
- Ainda não chegou nem à metade. Feche os olhos e imagine estar
saboreando um pudim de chocolate!
Repentinamente o vidro da janela estilhaçou sem ferir a dupla, pois os
cacos foram contidos pela cortina. Os tiros ecoaram como se fossem de metralhadora,
atingindo várias lâmpadas do ambiente. O garçom gritou:
- Estão assaltando o banco aqui do lado!
Os clientes da frente da loja derrubaram os pratos e se abrigaram debaixo das
mesas. Os que estavam mais no fundo, correram para a cozinha, chegando a derrubar
algumas iguarias sobre suas roupas. Eliane deitou por cima de Telma, num gesto
natural de proteção. Foram eternos 3 minutos de gritos histéricos
naquele cenário devastado.
Durante os gritos dos policiais que ecoavam na calçada esclarecendo que
os bandidos já haviam sido dominados, Eliane tremendo todo o esqueleto,
imaginava alguma frase para dizer à filha no sentido de aliviar o pânico
da menina e reduzir o impacto da situação sobre o aspecto psicológico
futuro na mente de sua filha. Aquela era uma situação capaz de
arrasar até mesmo pessoas habituadas a conviver dentro do universo policial.
Quanto mais crianças que mal sabiam soletrar a palavra "violência".
Enquanto alguns clientes escapuliam do local sem pagar a conta, Telma levantou-se,
ajeitou os cabelos e colocando as mãos tranquilas sobre os ombros
da mãe ajoelhada e pálida, disse com muita calma:
- Este incidente teve seu lado positivo. Não precisarei comer o resto
do canelone que se espalhou pelo chão! Nem quero pedir a banana caramelada.
Lá no cinema tomarei uma vitamina de abacate com um sanduba de atum.
Vamos logo que já pode ter fila para comprar ingressos! Quero assistir
"Sexta-feira 13 versão 27"!
Eliane desmaiou talvez pela tensão acumulada nos últimos minutos
dentro daquele restaurante.
(4º. lugar na AMBEP-RJ set/2008)