A Garganta da Serpente
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Dominação Silenciosa

(John Dekowes)

A partir da vigésima terceira zona dimensional, há uma imensa falha composta de fortes distorções eletromagnéticas, lixos cósmicos, peças de naves à deriva, poeira, gelo esverdeado e sugadores eletrostáticos. É um lugar infernal onde todos os fenômenos cosmológicos parecem acontecer. Existindo duas possibilidades para se atravessar com segurança, fugindo da atração do campo gravitacional energético. Não há massa ou conteúdo residual atômico que estabeleçam limites; apenas energia ciclópica dispersa por toda a região do canal: primeiro é através das pontes ondulantes, que na verdade são túneis formados por susceptíveis campos de partículas magnéticas, que dependendo da influência das condições externas, se dispersam surgindo instantes depois em outra direção. É quando o piloto deve manter-se atento a estas variações e desviar rapidamente a rota, pois a nave ainda permanece protegida e estabilizada dentro do campo polarizado. Se vacilar, o túnel se desdobra sendo atraído para outra parte, e a nave fica perdida na falha para sempre; e, segundo, através do espaço intradimensional, direcionando a nave para além da vigésima terceira dimensão. Como a falha possui movimento irregular, fica difícil calcular a entrada ou o pulo hiperdimensional, com o risco de cair numa distorção magnética e ser engolido para outro sistema desconhecido. Na verdade, os dois modos são bastante arriscados quando não se possuem equipamentos aprimorados para tal; o que implica em ter um Sterägon - no que seria impossível para um navegante comum, não pertencente a uma das onze nações ou aos sistemas galácticos representados na O.N.F.I. - Organização das Nações Federativas Intergalácticas. Após atravessar, supõe-se estar na zona dimensional seguinte, isto é, na vigésima quarta, pois inexiste qualquer referência ou astro que indique a chegada. Somente mais adiante, quase sempre à esquerda, e em velocidade normal, é que se nota a presença de um luzir desmesurado, ofuscante, num ritmo pulsante. É a gigante Candor que diferente dos outros astros dos sistemas planetários, gira ao redor do seu único planeta chamado Xvlox, composto de mais três satélites, ou melhor, asteróides.

E nesse momento, centenas de naves surgiam naquela vastidão do Universo. Muitas oriundas pelas pontes ondulantes, outras surgiam em pontos variados vindas intradimensionalmente. Todas se posicionavam ao largo, bem distantes, mas em redor da estrela Candor e seu planeta. E observaram também, quando um brilho cegante, como de um flash gigantesco, explodiu o planeta Xvlox; em seguida, um halo vermelho arroxeado e luminoso, foi se alargando em ondas circulares de energias alaranjadas, numa velocidade muito rápida. As naves próximas, apesar de retrocederem velozmente, foram engolidas pela força destruidora e silenciosa. As que não foram consumidas safaram-se pulando para qualquer outro lugar no hiperespaço, pois ainda haveria outra explosão mais violenta do que aquela. A estrela Candor su-miu no meio daquela força descomunal. Dela, via-se apenas uma luz muito branca e imensa. Uma reação termonuclear estava a ponto de acontecer, desencadeando uma massa energética crítica muito grande e intensa, que afetaria a falha, alargando ainda mais o corredor ou abrin-do diversas fossas eletrônicas, dispersas pelo cosmo. Ninguém estava interessado em saber qual seria o resultado final; só tinham a certeza de que não restaria mais nada por aquele canto do Universo.


MUITO TEMPO ANTES

Xvlox era um mundo dominantemente científico. Um grupo de cientistas procurou pe-lo cosmo um planeta afastado, longe dos olhares curiosos para desenvolverem seus experi-mentos nos mais variados segmentos biogenéticos, bioquímicos, biotecnológicos. Vasculha-ram o Universo até que encontraram um planeta bem distante, além das fronteiras conhecidas, com difícil acesso. Instalaram-se e iniciaram a remodelação da sua superfície. Prédios gigan-tescos foram construídos em estilos diferentes, aproveitando cada um as múltiplas possibili-dades oferecidas pelo planeta: claridade, polaridade e luminosidade. Mas com o tempo, foram descobrindo que os moldes padrões cientificamente aplicados sobre aquela atmosfera não funcionavam como deveria em virtude da influência exercida pela estrela Candor. Uma rees-truturação foi idealizada modificando os parâmetros experimentais a níveis celulares, bioquí-micos. Aprofundaram-se nas bases de cada unidade, e depois de exaustivos fracassos, cientis-tas e equipes chegaram a um denominador comum: era muito mais fácil mudar a órbita do planeta do que estabelecer uma nova metodologia científica de trabalho.

Era consenso para que tudo desse certo, o planeta Xvlox não podia girar ao redor da estrela Candor, pelo simples fato do "continuum temporalis" ser inconstante e desigual; o que impossibilitava o desenvolvimento de qualquer pesquisa mais profunda no campo científico, como desejavam realizar. A disfunção eletromagnética ocorrida, com a inclinação do planeta, prejudicava as experiências baseadas nos estímulos bioeletrônicos. Desta forma, nunca con-seguiriam os resultados pretendidos em pouco tempo. Era unanimidade o pensamento de que a estrela deveria rotacionar em volta do planeta. E, enquanto um grupo investigava a estrela Candor: diâmetro, massa, temperatura, período de rotação, magnitude aparente, radiação, fon-te de energia, composição; outro grupo pesquisava o planeta: velocidade de escape da superfí-cie, velocidade orbital média em torno de Candor, tempo de rotação em torno do próprio eixo, ângulo entre o plano orbital e o plano orbital do planeta em graus, e mais, excentricidade orbi-tal, diâmetro, massa, temperatura média, distância média de Candor, etc. Um trabalho que ocupava um tempo precioso de todos, sendo que, algumas vezes, quase desistiram do intento. Depois, passaram longos períodos de intensas experiências, até que conseguiram determinar como poderiam colocar a gigantesca Candor girando ao redor do pequeno Xvlox. Seria um processo demorado, mas todos estavam dispostos a arcar com as consequências que suposta-mente poderiam ocorrer.

Em princípio injetaram raios de prótons no núcleo da estrela, que foram modificando o processo de fusão interna, assim como a composição; em seguida, criaram uma atmosfera artificial ao redor do planeta. Com a estabilidade do núcleo da estrela, iniciaram a frenagem de Xvlox apoiado num ponto fixo imaginário dentro da própria Candor, enquanto revertiam a sua gravidade externa, tornando-a menor, oposta à do planeta. Havia uma tênue linha impe-dindo que Candor invadisse a superfície do planeta. Para mantê-la em equilíbrio, atraíram três asteróides que passaram a rotacionar ao redor de Xvlox. Neles foram colocados sensores e monitores que alertavam qualquer alteração significativa no campo magnético.

Finalmente, os novos testes indicavam resultados satisfatórios, e com isso, todos esta-vam preparados para darem prosseguimento ao projeto inicial. Reativaram os laboratórios espalhados por Xvlox, as equipes reunidas e as diretrizes do programa original foram passa-das e repassadas exaustivamente. Podiam receber as cobaias sem qualquer problema. Não precisavam mais relutar.

Estabeleceram novo contato com o cargueiro intergaláctico que trazia suprimentos pa-ra o planeta, encarregando seu comandante de iniciar o transporte dos terráqueos e animais o mais rápido possível.

Os primeiros humanos que chegaram, vieram desacordados dentro de caixões lacra-dos. Estavam mortos quando abriram as tampas; faltara ventilação suficiente durante o trans-porte. Alguns animais, entretanto, conseguiram sobreviver. Chipanzés, gorilas, cães, lagartos, crocodilos e uma infinidade de outros bichos desconhecidos, mas que sabidamente por eles, não pertenciam à fauna terrestre. O aspecto comparativo seria de fundamental importância para se avaliar até que ponto o cérebro humano evoluíra, estacionara ou regredira. Descarta-ram-se dos corpos humanos. As massas encefálicas cinzentas foram dispostas em líquidos quimicamente preparados. Quinze cérebros flutuantes dentro de tubos rodeados de filamentos e eletrodos eletrônicos. Ao serem automaticamente estimulados, alguns lobos reagiram pron-tamente. Não foram reflexos induzidos ou mecânicos, mas em todos os monitores surgiam imagens desfocadas, em movimentação constantes. Isso significava que nada se perdera, ou melhor, fariam uma avaliação mais profunda dos cérebros: neocórtex, sistema límbico e me-sencéfalo. Do outro lado do planeta, cientistas e equipes trabalhavam com os animais: chipan-zés e gorilas estavam sendo expostos aos raios contínuos com alto teor radioativos e estímulos elétricos diretos nas amídalas.

Qual era o objetivo desta empreitada toda? O que levava cientistas a se lançarem pelo espaço infinito, depois transformarem um planeta num sólido complexo científico, não sem antes mudarem o seu sistema planetário, para melhor organizarem suas amostras e experiên-cias? Quais objetivos, metas e metodologias implicavam nessas transformações todas? Inclu-sive, o próprio distanciamento da comunidade científica. Por que tamanho isolamento? O que havia para ser oculto? Qual a importância dos seres humanos no projeto? Por que pesquisa-vam somente do cérebro?

A resposta estava justamente na mente dos cinco cientistas que planejaram tudo. E ne-nhum deles ainda havia se disposto a revelar o que pretendiam na realidade. Tudo o que se propuseram em realizar fora concluído com êxito. Sucesso absoluto! Por isso suas equipes mantinham-se fiéis a eles, em todos os empreendimentos desenvolvidos até àquele presente momento. Eram cinco mentes brilhantes que trabalhavam em harmonia e em conjunto. Cada um dedicava-se à sua área de pesquisa, mas obtinham no final, os resultados pretendidos para prosseguimento do plano definido por eles. Todos os integrantes das equipes sabiam apenas os detalhes, mas, como nunca estavam juntos, ficava impossível unir todos os dados. O com-putador central que organizava todos os trabalhos era manipulado apenas pelos cientistas. A credibilidade deles perante suas equipes era impecável. Ainda mais após virem a estrela Can-dor girando ao redor do planeta Xvlox. Muitos consideraram a ideia impossível, até acontecer, depois disso, o respeito deles pelos seus mestres aumentou significativamente.

Com a chegada de novos corpos humanos, agora preservados e vivos, em conservantes plasmáticos, as pesquisas avançaram muito. Os cérebros mantinham-se intactos, sem sequelas aparentes, e estavam prontos para fazerem as conexões comparativas há tanto tempo espera-das. Os cérebros anteriores serviram apenas para determinar que os alcalóides e drogas afeta-vam algumas áreas sobrecarregando os impulsos eletrônicos, por serem parecidas às proteínas cerebrais. A fascinação aumentava na medida em que os cinco cientistas juntavam também as informações realizadas com o cérebro dos animais. Agora haviam chegado a um consenso. Era hora de reunir todas as equipes e trabalhar em conjunto.

Uma reunião geral foi marcada para esclarecer os objetivos futuros e os novos cami-nhos que as pesquisas deveriam tomar, já que estavam bastante avançadas, inclusive, implica-va na mudança dos centros intermediários para o núcleo central, deixando equipes menores na busca de soluções viáveis para as decisões que seriam tomadas. Era a primeira vez que reuni-am todos no Salão Principal. Raramente vinham até ali; cabia a cada cientista coletar informa-ções e adicioná-las ao computador central.

Centenas de seres aguardavam a chegada dos cientistas, e ao adentrarem no Salão Principal, foram ovacionados com alegria e admiração. Sem muita conversa iniciaram a pales-tra:

"Bem. Queremos agradecer a presença de todos aqui. Sabemos que ninguém queria estar nesta reunião, pelos muitos afazeres que possuem, mas será a partir deste raro momen-to em que estamos juntos, que pretendemos mostrar o que trará mais um sucesso para toda a equipe".

"Como todos devem saber, a estrela Candor não vai permanecer para sempre giran-do ao redor do nosso planeta. O seu núcleo está se modificando e retornando ao estado pri-mitivo. O tempo? Acreditamos que o suficiente para concluirmos nossas pesquisas e já es-tarmos em outro planeta. Já temos um em vista, mas... por isso estamos aqui para explanar a situação. A Doutora Virly vai falar a respeito do planeta Terra... Mas antes de iniciar, quero parabenizá-la, mais a Doutora Lsmyg que desenvolveram o nosso biossistema...".

- Não acho necessário comentar o que o Dr. Xytar acabou de dizer. - disse a cientista Virly, se erguendo. - Tudo foi realizado em equipe, e se não fosse o esforço de todos, nunca teríamos alcançado nossos objetivos... Bem, o planeta Terra pertence a um sistema solar com uma estrela que emite luz e calor chamado Sol; e ao seu redor giram mais oito planetas e saté-lites. A Terra em si é o único mundo habitado, isto é, segundo apurei do cérebro dos humanos no laboratório. Possui atmosfera que consiste quase inteiramente de dois gases: nitrogênio e oxigênio, embora existam outros gases em baixas concentrações. Um terço do planeta é co-berto de água, e todas as criaturas, flora, fauna dependem dela para sobreviver. Os corpos dos humanos são constituídos de 78% deste líquido. Existe um processo cíclico essencial para a vida vegetal e animal realizada através da radiação solar, que envolve água, oxigênio, dióxido de carbono e nitrogênio, além de outros gases menores. Como vocês podem ver, é um ecossis-tema variado, completamente diferente do que temos aqui em Xvlox. O Doutor Ortn fez estu-dos genéticos das criaturas que lá vivem. -concluiu ela apontando para outro cientista.

- Na verdade, o Código Químico chamado DNA - Ácido desoxirribonucléico - uma cadeia de moléculas composta de fosfato e açúcar em forma de dupla hélice, é muito simples; levando em consideração que a maioria dos aqui presentes possuem outros modelos genéti-cos estruturais diferentes. Mapeamos os 149.236 mil genes que compõem o corpo humano, sendo que a partir dos 68.343 genes, ocorreram novas ligações fisicoquimicas com leitura de novo sequenciamento dos ácidos nucléicos e infinitas variações celulares. Com essas bases temos condições de criar e desenvolver um ser humano completamente modificado... O Dou-tor Xytar poderá falar mais a respeito... - disse o cientista apresentando a outra colega.

- Quando eu, o Doutor Xytar, mais a Doutora Lsmyg nos encontramos pela primeira vez, depois de muito tempo afastados, percebemos que estivéramos pesquisando algo em co-mum: a raça humana. Logo depois, tivemos a grata surpresa quando aderiu ao nosso grupo os doutores Ortn e Virly... Todos nós sabemos da existência das restrições impostas pela Federa-ção quanto ao envolvimento de outras raças com os seres do planeta Terra, sejam elas quais forem. Um dos motivos do nosso isolamento foi esse: O nosso interesse científico justamente pelos seres humanos. No início conseguimos despistar a Federação Intergaláctica, mas fomos espionados, delatados e proibidos de prosseguirmos com nossas pesquisas... Foi muito triste! Havíamos chegado ao primeiro estágio da evolução, onde todos os embriões se assemelham... Para o ser humano possuir apenas um código químico de dupla hélice, e viver da transforma-ção de dois gases nobres que interagem com outros processos químicos e físicos complexos, precisa passar sempre pelo antigo sistema evolutivo... Toda a sua ontogênese é baseada nesta organização; não existe outra alternativa... A não ser que se desenvolvam seres geneticamente modificados desde o óvulo, onde os centros cerebrais recebam cargas eletrônicas, e sejam automaticamente estimulados a desconhecerem o sistema primitivo (antigo sistema evoluti-vo), e evoluírem com novas informações... Nesse caso, serão implantados nos primeiros, ele-trodos eletrônicos para que o cérebro possa estimular a própria produção de proteínas... - deu uma parada e olhou para todos. - Devem estar se indagando qual o objetivo disso tudo. Como já foi dito, a estrela Candor não permanecerá eternamente girando ao redor de Xvlox, e nin-guém está aqui esperando primeiro acontecer uma tragédia para depois pensar no que fazer... Nós temos um plano e vamos passar para todos vocês. Deixo a cargo do Doutor Xytar a con-clusão desta reunião.

- Como são as coisas. Parece que o destino nos reserva surpresas. Mesmo para men-tes científicas como as nossas, que acreditam somente naquilo que pode ser prático e execu-tado com êxito, às vezes de forma empírica... Quando iniciei meus estudos sobre a raça hu-mana, tinha uma meta clara, que foi compartilhada depois pelos outros colegas, mas de re-pente, me vejo utilizando tudo aquilo que desenvolvemos - em teoria - porém de forma real... Bem, vocês já devem ter percebido que o nosso projeto primordial é a criação de seres hu-manos geneticamente modificados, que serão levados para o Planeta Terra. E pelo grau de inteligência, penetração social e influência nos mais diversos setores tecnológicos, políticos, religiosos; irão reestruturar todo aquele mundo para que possamos habitá-lo. Esses novos humanos serão denominados de: "Xvlox", em homenagem a este planeta. Durante suas vidas na Terra irão se misturar entre os machos e fêmeas da espécie de onde nascerão outras cria-turas com perfis geneticamente alterados. Obtivemos ótimos resultados com as experiências realizadas nos embriões. Essa nova geração de "Xvlox Humanos" irá disseminar em 50 anos mais de 2 milhões de outros seres. O crescimento deles não será igual ao dos humanos co-muns. Em 200 anos terrestres, serão mais de 1 trilhão, e com isso o domínio do planeta dar-se-á como consequência natural, assim como a transformação do seu biossistema para a nos-sa chegada. Observem que em nenhum momento usaremos de violência ou agressividade. O tempo se encarregará da eliminação dos humanos comuns dentro do prazo de no máximo 350 anos... Será uma dominação silenciosa! Então poderemos dar adeus a este nosso querido planeta... Nós não vemos nenhum empecilho para darmos continuidade às nossas pesquisas... Uma equipe continuará o rastreamento de naves nas proximidades, e na busca de soluções viáveis para tudo o que foi dito hoje... Como medida de segurança, para que possamos traba-lhar com tranquilidade, e pelo sucesso do projeto, durante uma das fases experimentais inici-ais neste planeta, onde todos participaram, implantamos em cem elementos das equipes, in-clusive em nós mesmos, eletrodos cerebrais que reagem a determinados impulsos emocionais, e que se encontram conectados a uma bomba Dlux 14, no centro do planeta, com ressonância eletromagnética na estrela Candor. Procedemos assim para evitar que todo o nosso sacrifí-cio, na execução do projeto, caia em mãos erradas. Essa bomba somente será ativada se os cem escolhidos tiverem o mesmo impulso emocional ou reagirem a um mesmo estímulo... Eu acho impossível... Em todo caso, olha lá o que vocês pensam! - brincou ele. - Cada equipe já possui as novas diretrizes, assim como os seus novos setores. Nos laboratórios, observarão os novos equipamentos instalados com os quais irão trabalhar.

Os cinco cientistas deixaram o salão, e todos se dispersaram para os novos locais indi-cados pelas cores fortes nos pisos. Estavam curiosos para conhecerem os novos equipamentos introduzidos nos laboratórios. Uns tinham aspectos ovóides, transparentes, e no interior, pe-quenas bolsas texturizadas unidas a tubos filigranados multicoloridos. Eram milhares dentro de cada equipamento, ligados a diversas máquinas controladoras, que se conectavam ao com-putador central. Outras máquinas chegavam despertando curiosidades. Nestas não havia se-quer entradas, nem conexões aparentes: apenas grandes tubos vitrificados e abaulados. A maioria dos aparelhos que estavam nos laboratórios eram fabricados em materiais translúcidos e extensões, eletrodos e filamentos em fibras semitransparentes. Todos se mantinham ansio-sos e em visíveis expectativas para verem os equipamentos em funcionamento.

*****

Nas máquinas ovaladas, dentro das bolsas texturizadas como úteros, as primeiras es-truturas humanas começaram a surgir. Luzes e energias cintilantes, descargas eletroquímicas bombardeavam cada parte do minúsculo embrião, enquanto no computador central, viam-se em detalhes toda a formação e as mudanças acontecendo. E na medida em que os fetos iam crescendo, eram passados para espécies de manjedouras e imersos em líquidos protéicos e estimuladores cerebrais. Nos estágios seguintes, com o ser formado, tendo já o aspecto com-pleto de criatura humana, era novamente mergulhado em oxigênio hiperbárico sob pressão para aumentar o nível de Quociente Intelectual. Os processos evolutivos iam sendo testados e aprovados imediatamente com êxito. Os Humanos Xvlox começavam a passar pelo último estágio completando a fase de amadurecimento biológico. Os tubos vítreos presos às braçadei-ras se dividiam em dois blocos de compartimentos em cores: o maior se elevava, enquanto o corpo era colocado no seu interior, em seguida, preenchido por um líquido cristalino e lacra-do, tornava-se imediatamente sólido com aparência metalizada, mas transparente. Depois era levado por um elevador para uma sala muito fria, onde se encontravam centenas de outros corpos em igual estado. A fase estava concluída. Esse procedimento se tornara quase mecâni-co, e, decorrido algum tempo, os grupos de Humanos Xvlox estavam prontos para serem en-viados ao planeta Terra. Quando lá chegassem, o processo criogênico seria revertido e estari-am aptos para buscarem a cidadania terráquea e darem sequência ao projeto.

Um dos fatores importantes para o sucesso da operação, foi que os Humanos Xvlox não eram criaturas padronizadas e sim heterogêneas. O processo de miscigenação fora cir-cunstancial e assim, poderiam se infiltrar em todos os segmentos raciais, sem utilizarem quaisquer artifícios que causassem suspeitas. Para a região do planeta onde fossem, falariam o idioma fluentemente sem sotaque. Microeletrodos faziam conexões elétricas nos lobos cere-brais, que facilitariam um rápido aprendizado de até duas línguas, fixando-se naquela que mais fosse proeminente na comunidade.

A nave discoidal pousou no descampado, próximo à saída do salão principal, e cabos extensores flutuantes, se prenderam ao redor da mesma, vindos das diversas salas subterrâ-neas. Em seguida, a partir de uma coordenação primorosa e silenciosa, os tubos enfileirados foram sendo levados para o interior da espaçonave. Uma visão extraordinária sob reflexo da luz roxa alaranjada do entardecer da estrela Candor. Durante o período de duas rotações do planeta Xvlox, os cientistas acompanharam o carregamento. Permaneceram inexpressivos e calados até o momento em que os cabos foram puxados para dentro dos galpões completa-mente vazios. Então suas expressões demonstraram toda a alegria sentida por aquele instante todo especial. Completado o carregamento, a gigantesca nave girou sobre si mesma, e partiu em direção ao cargueiro intergaláctico que a aguardava no outro lado da falha, num ponto estratégico, onde seria acoplada e levada para o planeta Terra em segurança.

*****

E tudo aconteceu tão rápido, que o próprio Comandante do cargueiro nem percebeu quando foi cercado por duas naves da Federação. Elas surgiram do nada. Nem os radares acu-saram a aproximação delas pelo subespaço. Dentro do cargueiro intergaláctico a tripulação agiu imediatamente tentando fugir para o hiperespaço, mas descobriram tardiamente que os controles estavam bloqueados, inoperantes. Não puderam arriscar qualquer outro tipo de rea-ção, pois guardas fortemente armados logo se transferiram para bordo, aprisionando a todos.

*****

O disco veio pela ponte ondulante; percebia-se por uma característica: a matéria em desequilíbrio com a energia. Como se já soubesse da situação, furtou-se rapidamente para a distância, numa fuga desembalada pelo espaço, enquanto tentava acertar a nave da Federação com uma bateria de tiros. Apesar da argumentação do oficial da nave para que se rendesse, mais dois outros tiros foram disparados, e o contra-ataque aconteceu apenas com uma descar-ga do canhão protoplasmático de energia Binósica. O objetivo da Federação não era destruir, mas o disco ficou momentaneamente aprisionado dentro de uma trama fosforescente muito forte, em seguida, evaporou de forma estranha.

*****

Nesse instante, um alarme sonoro soava por todo o planeta Xvlox. Era novidade aque-le som. Ninguém sabia o que estava acontecendo. Imediatamente, os cientistas se reuniram com todas as equipes.

- Recebemos uma mensagem do Comandante da espaçonave Virago. Diz ele que o cargueiro foi detido por uma nave da Federação, e que estava sendo perseguido por outra. Em seguida, silenciou... Isso só tem um significado: a esta hora o Comandante do cargueiro já confessou tudo, e em breve estaremos avistando as naves da Federação próximas ao nosso planeta... Nós decidimos que, aqueles que desejarem partir, antes da chegada da Frota devem fazê-lo agora! Existem naves interpessoais prontas nos subterrâneos. Os eletrodos cerebrais só funcionam no solo do planeta; ao alçarem voo estarão livres, pois perderão o contato.

Naquele instante criava-se um impasse entre todos. Por que fugir? E para onde? Se dedicaram suas vidas a trabalhar para os cientistas? Depois... Nunca encontrariam alguém que tivesse mudado a órbita de uma estrela, ou criado uma nova raça... Observaram diversos pon-tos luminosos numa tela lumínica, que indicavam a presença das naves da Federação. Volta-ram-se para os cientistas que permaneciam impassíveis, fitando-os, aguardando uma decisão. Em seus olhares havia unanimemente uma única determinação, um só pensamento.

Uma faísca elétrica rompeu do imenso salão em forma de flash gigantesco. O planeta estremeceu e se desintegrou num brilho cegante.



Nota do Navegador: Não sei por que existem restrições da Federação com relação ao planeta Terra? É uma situação bastante constrangedora, que vai contra até os próprios princípios da O.N.F.I. que incentiva e esti-mula a exploração espacial. Fico me perguntando: o que leva seres brilhantes, como os cientistas de Xvlox, a ficarem obcecados por uma raça que vive do outro lado do cosmo, em outra dimensão? O que têm os seres hu-manos de tão especial assim? Mas uma coisa me deixou intrigado: Por que em seu Relatório de Bordo, o Oficial da Federação colocou "nave dissimulada" e não "nave destruída?".

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