A estiagem prolongou-se levando o brinquedo preferido. O Mandacaru alimenta
e fere os olhos verdes da inocente infância. Lágrimas secas rolam
de semblantes amarelos. A esperança é uma nuvem d'água,
mas essa migrou para um povoado distante.
O alazão voador está aprisionado no solo ressequido, seu olhar
pede um pouco de carinho - não consigo mais sonhar.
Meus amigos brincam de esconde-esconde, uns na jardineira engolidora de pais
e, enquanto aos outros, a fome fechou os olhos.
Zezinho e Antônio são companheiros de caminhada para a escola -
e esta é nossa única sombra de um futuro melhor.
Na volta da aula uma momentânea alegria me acalma. Perco-me propositadamente
de meus colegas e sigo Ana: flor que nunca vi, a estranha e mais bela nestes
sertões. Seu perfume é só meu. Para minha sorte, eles a
ignoram.
Nossa caminhada é prazerosa, embora o tempo imponha seu curso impiedosamente:
sol, mugido de gado extinto.
Ana me carrega e seu sorriso brilha como uma manhã nunca vista. Promete
desvendar-me seu segredo, assim que chegarmos em sua morada. O caminho parece
diferente, as aventuras ficaram para trás.
Debaixo de uma grande árvore, com galhos de folhas mortas, ela revela
de forma enigmática:
- Voltarás a sonhar. O teu caminho será verde. O céu te
dará asas. Amanhã não voltarei.
Naquele dia de setembro, como em muitos outros dias do ano, Zezinho e Antônio
foram à minha casa. A notícia dada por minha mãe não
os assustou, fazia parte do cotidiano da região:
- Ele só esperou a primavera, parece estar sonhando.
O silêncio apoderou-se de meus amigos e assim se retiraram de casa.
De volta à peregrinação, Antônio acrescentou:
- Aquela flor que ele segurava, eu nunca vi aqui no sertão.