As mãos trêmulas seguram o envelope. Correram ligeiros os olhos
sobre o papel. Procuram algum sinal, qualquer coisa que a faça entender
o que há escrito ali.
Finalmente.
Amassou o envelope. Fechou os olhos numa tentativa de anular aquela sensação.
Um negro líquido espesso percorrendo o interior de seu corpo, afogando
na garganta.
Foi para casa, nem chorar conseguiu. Ela toda água, náufraga em
si,e não podia, não podia ser fraca, pálidas suas faces
e secas. Ela cinza e seca.
Ainda não assimilara o que ocorria com ela. Vertiginosamente passara.
Como uma sombra que não se vê, apenas se sente seu hálito
frio.
Telefone. Liga para o namorado. Uma voz surda e embaçada na garganta.
Ainda o líquido, sempre ele a afogá-la.
- Venha aqui em casa.
Sentou-se no sofá. Espera. Liga o abajur. Só ela, imersa na penumbra
da sala. Flutuando dentro da escuridão. Entregue ao seu mundo misterioso
e tubulento.
- Como falarei? Se ele não aceitar? Certamente dirá "tudo
bem", abre a porta e sai. Adeus. Eu posso realmente adoecer, piorar. Um
dia acordo e... não acordo. Não quero morrer! Se doer? Pior que
a morte é a dor. Pensará ele que a culpa é minha?
Toca campainha. Ela estremece. Calculadamente se dige à porta. Cada passo
no azulejo, uma eternidade. Contando cada um. Abre. Ele em pé, sereno
olham-se.
- Quer entrar?