Era segunda-feira, o expediente ocorria normalmente, Ísis trabalhava
na empresa fazia três meses, era jovem, vinte e sete anos de idade, mas
aparentava ter menos, era introspectiva, pensava demais, falava pouco. Usava
óculos, tinha pele muito clara, cabelos lisos, sem franja, castanhos,
quase loiros, olhar compenetrado e olhos arregalados quando assustada, era baixinha
e de corpo cheio, gordinha, mas longe de ser obesa, quadril largo e pernas grossas.
Trabalhava no setor administrativo de um supermercado, era uma rede grande e
bem conhecida no país inteiro. Dividia a sala com mais seis pessoas,
cada qual com sua mesa e seu computador, três homens e três mulheres,
eram quatro com ela. Zuleica, já era de meia idade, quarenta e dois,
alta cabelos curtos, cacheados, mas alisados com escova e chapina, estilo chanel
pele bem morena, extrovertida, extravagante, magra, quadril estreito, conversava
e ria com Jorge, um sujeito trintão, gorducho e careca, com pouquíssimo
cabelo, ria e fazia piada de tudo. Ísis o considerava um "mala"
tremendo chato, com Zuleica, vez ou outra trocava algumas palavras.
Jorge exibia em sua mesa desorganizada e cheia de papéis as fotos dos
filhos e da esposa em porta-retratos, era linda demais para ele, que de bonito,
não tinha nada, os filhos, com certeza haviam puxado a mãe, com
exceção da primogênita que além de não ser
nada bonita, era a cara do pai.
Zuleica fava mal de seu ex-marido, transformando-o em alvo de chacota para os
colegas de trabalho, aquela atitude deixava Ísis enojada, como uma mulher
poderia fazer aquilo com o homem que era pai de seus filhos? Era repugnante.
Jorge o defendia, tomando as dores do colega ridicularizado que nem estava presente
para se defender.
Cláudia ria do ex- marido de Zuleica, ela era bondosa, ajudava todo mundo,
mas era infeliz no amor, havia se decepcionado muito com os homens, por isso
sentia prazer em ridicularizá-los. Era loira oxigenada, olhos claros,
cabelos longos e lisos, pele rosada, corpo esbelto, um pouco mais alta do que
Ísis e mais baixa do que Zuleica. Era solteira e tinha vinte e seis anos,
não tinha filhos e morava sozinha. Daniela tinha o temperamento mais
parecido com o de Ísis, era introvertida e pouco se manifestava, era
rápida e prática. Estatura média, negra, cabelos longos
e trançados, tinha trancinhas finas e soltas, batiam na cintura. Vaidosa
ao estremo, só usava perfume francês e uma consumista nata, como
Zuleica, ambas tinham mania de gastar muito dinheiro com coisas que nem sempre
eram úteis.
Daniela e Ísis eram amigas, andavam sempre juntas e sentavam sempre próximas.
Ricardo e Leonel eram primos, muito parecidos fisicamente, os dois eram morenos
e esbeltos, tinham olhos castanhos e cabelos cacheados, Leonel era dez anos
mais velho do que Ricardo, era casado e pai de dois filhos adolescentes. Leonel
também defendia o marido de Zuleica, Daniela e Ísis ignoravam
e discussão, para ambas, era algo fútil demais. Cláudia
aproveitava para falar mal de seu ex-namorado e era duramente criticado por
Ricardo.
De repente, eis que alguém gira maçaneta da porta, Ísis
olha apreensiva, quem seria? O que queria? A porta se abre bruscamente, era
Vítor, sujeito assustador, tinha olhar perverso, obscuro, expressão
tão sisuda que inspirava horror, testa franzida, parecia estar sempre
irritado, se enfezava muito facilmente com qualquer pessoa e por qualquer motivo.
Em momentos de extrema fúria, seus berros fariam qualquer um tremer.
Era alto, moreno claro, cabelos lisos e castanhos, feições finas
e lábios carnudos, era um rapaz de boa aparência, apesar de ter
um gênio horrendo, fumante inveterado, tinha vinte e três cinco
anos, formado em administração de empresas, pós-graduado
em economia. Ísis tinha tanto medo de Vítor que sentia um frio
na boca do estômago sempre que o via. Ele era gerente daquele setor, mas
mesmo fora do ambiente de trabalho, Ísis não desejava encontrá-lo,
pois sua atitude estranha e perversa se perpetuava, mesmo estando fora dali.
Vítor entrou na sala feito um furacão, todos se calaram imediatamente
ao vê-lo, estarrecidos, não era comum ele ir lá, com certeza
algo terrível estava pra acontecer. O rapaz também era famoso
na empresa, pela frieza e praticidade com que demitia funcionários, nem
lágrimas o comoviam, não levava mais do que cinco minutos.
- Ísis! - Chamou Vítor, com todo o autoritarismo com que tinha
direito, era algo espantoso. Como um rapaz tão jovem podia ser tão
tirano? E será que ele não tinha alguns lapsos de bondade de vez
em quando?
Ísis se levantou da cadeira, olhou para os colegas, estavam todos apreensivos,
olhou para Vítor e o acompanhou deixando a sala. Os dois caminhavam pelo
vasto corredor, numa penumbra fria e silenciosa, só se ouvia o barulho
dos sapatos pisando no chão, Vítor além de não olhar
para Ísis, não dizia uma só palavra, ela, por sua vez,
já esperava pelo pior, ser demitida, dura e friamente, ou ser repreendida
por algo errado que havia feito, ou sofrer algum tipo de assédio moral,
pior, assédio sexual! Não, Vítor nunca havia demostrado
nenhum interesse por ela, seria um contra senso muito grande. Mas da demissão
e do assédio moral não estava livre, suas mãos suavam de
medo, estavam geladas, como de um defunto, Ísis nem ousava perguntar
o porquê de tê-la chamado. O que será que ele queria? O corredor
parecia infinito, Ísis tinha a sensação de que nunca iria
chegar o que aumentava ainda mais sua angústia, respirava fundo, arriscou
uma olhada para Vítor. Como de costume, apresentava a testa franzida,
expressão carrancuda, como se estivesse pronto a dar um murro em alguém,
olhar frio e controlador, era algo horrendo, apavorante, tirou rapidamente os
olhos de Vítor, seu coração batia cada vez mais forte.
Começaram a subir as escadas, degrau por degrau, Vítor ia na frente,
Ísis o seguia, se sentia como um boi no matadouro, caminhando para a
morte, parecia que aquele ia ser seu último dia de vida. Os passos de
ambos, lentos, barulhentos e cada vez mais pesados. Ísis sentia suas
pernas cada vez mais pesadas, os passos cada vez mais difíceis de serem
dados, sua respiração cada vez mais ofegante. Vítor, por
sua vez, estava tranquilo, seus batimentos cardíacos, estavam normais.
A moça, percebendo a calma do rapaz, sentiu mais medo ainda, era uma
frieza estarrecedora, ele era voraz, mordaz, mas um excelente profissional esse
fato era indiscutível, o sonho do rapaz era um dia ser acionista majoritário
da empresa e chegar a presidência, e do jeito que ele era, Ísis
não duvidava que ele conseguiria chegar a esse patamar, ele era capaz
de conseguir coisas absurdas, fazia o diabo para atingir seus objetivos e não
desistia facilmente, seu poder de persuasão era fantástico, convencia
qualquer um, e se precisasse, se tornava doce, meigo e carinhoso. Ísis
sentia vontade de matá-lo, possuía em sua casa uma arma calibre
trinta e oito, carregada, nunca havia usado para nada, só para o curso
de tiro ao alvo, sabia atirar e possuía arma e ela servia para fazer
exatamente o que ela tinha vontade naquele momento, havia também na jovem,
uma grande dose de inveja, como alguém tão horrendo conseguia
ter tanto sucesso na vida, ela não se sentia bem sucedida, tinha tanta
ambição quanto ele, mas não era ousada o suficiente para
se lançar como ele fazia.
O primeiro lance de escadas terminou, viram a direita, mais um corredor, só
que menor, a sala era logo ali perto, caminhavam, ele na frente, Ísis
já podia ver a sala, na porta, estava escrito gerência, Ísis
diminuiu os passos, queria adiar o sofrimento,Vítor se distanciava, chegou
primeiro a sala abriu a porta e entrou Ísis não recuou e continuou
a caminhada, chegou à sala e viu Vítor sentado a mesa na cadeira
giratória, bem à vontade, a esperar por ela.
- Pode entrar moça! Eu não mordo não. - Disse em tom sarcástico.
Ísis entrou, fechou a porta e se sentou à mesa, de frente para
o chefe.
- Ísis, o negócio é o seguinte, eu to precisando de uma
secretária, uma pessoa pra cuidar dos meus compromissos e outras coisas
mais, você no meu ver é a pessoa mais indicada pra isso. Agora
sua sala será ao lado da minha, com o tempo eu vou te passando o serviço
e você vai entender melhor como as coisas funcionam por aqui. Esse cargo
interessa pra você?
Ísis respirou fundo, aliviada, achou que seria demitida e não
hesito em dar sua resposta.
- Sim.
- Ótimo.
A moça olhou para o lado, apenas uma divisória separava a sala
de Vítor da sua e nem havia porta, na verdade era a mesma sala dividida
em duas, o acesso era muito fácil. Ísis temeu, mas não
estava disposta a fugir da raia, queria encarar o desafio.
- Pode voltar pra sua sala. Você começa a partir de amanhã.