A Garganta da Serpente
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O Pianista

(João Paulo Parisio)

A luz da Lua se esbate num casebre do arrabalde. Ao pé da janela, toca um pianista. Seus dedos carcomidos sujeitam o teclado com violência, suas melenas secas e grisalhas oscilam e reluzem a cada acorde. De onde está ele vê, além do casario pobre, a suntuosa cúpula dourada sob a qual um dia triunfou. De lá vêm as notas que saem dos dedos de um novo gênio inconteste.

Da cadeira de balanço na entrada do corredor, a mãe o ouve menos que observa. Tem os cabelos brancos presos num coque. Ao fim da música seu filho se ergue, faz o clássico gesto de puxar a cauda do fraque, e chega a iniciar a mesura, mas a interrompe e bate com força num castiçal que estivera repousando sobre o piano. A velha estremece, crispa as mãos sobre o peito, lágrimas lhe acorrem.

Ouve-se, vindo das ruas principais, o atroar das carruagens que se dirigem ao espetáculo da casa dourada. Em seu interior, fidalgos de cartola conversam, senhoritas ardem a olhos vistos pela glória e cachos louros do jovem pianista, e damas fiam na roca da maturidade adquirida em anos de astúcia e dissimulação.

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