Quase dezembro. Uma estranha agitação se apodera das pessoas.
Há repentina explosão de luzes e de vermelho e verde. Foi dada
a largada para os preparativos do natal. Ninguém mais anda. Todos correm,
entrando e saindo dos shopping-centers, carregados de sacolas e embrulhos. Parece
que, de repente, todos redescobrem a família, querem estar juntos e trocar
presentes.
Nada é diferente na casa de Henrique e Juçara. Um imenso pinheiro
é erguido num canto do varandão do apartamento. Os contornos do
prédio são decorados com minúsculas lâmpadas em série,
como tantos outros da rua, naquele mágico clima de natal.
Naquele lar, como todas as crianças, os cinco netos do casal esperam
ansiosos os presentes de papai noel, mas são criados sabendo que o grande
motivo da festa é o nascimento de Jesus. Cada um deles, já foi
o menino , no presépio vivo, na hora das orações.
Antes da ceia, a família celebra com orações e cânticos,
que culminam com a montagem do presépio, ao pé da árvore.
Camilla, de cinco anos é Maria, Pedro, de sete, é José,
Rafaella, de dois e Tiago de 1 são anjinhos e Gabriella, de apenas três
meses é o recém-nascido, Jesus..
Pouco depois, meio cansadinhos da posição de estátua,
um anjo joga-se no chão e tira o sapato que incomoda, o outro, toca a
trombeta. Maria se irrita de ajeitar o manto de cetim, que escorrega ombros
abaixo. Desiste dele e solta os longos cabelos. José faz do cajado uma
espingarda e "atira" para todos os lados. Só o "menino"
dorme tranquilamente. Diante da falta de concentração infantil,
o fim da cerimônia é antecipado.
Alguns minutos depois, Henrique desaparece. "Onde está o vovô?"
pergunta Pedro. "Foi desejar feliz natal à vizinha do andar de cima",
explica a vovó. Na verdade, Henrique estava no escritório, envolvido
pela falsa barriga, fazendo maquiagem e ajeitando a barba postiça. Chegou
a vez do papai noel. Ele sai pela porta da cozinha e toca a campainha da entrada,
tocando um sininho. As crianças emudecem, os maiores, emocionados, os
menores, com medo.
Papai noel senta no sofá e começa a tirar do enorme saco, os
presentes da criançada. Pedro se detém em agarrar o bom velhinho
pelo pescoço, mexe no gorro, ajeita os óculos. Procura no meio
dos pêlos brancos, a orelha de noel. Henrique disfarça, tira as
mãos do menino, mas o pequeno não desvia a atenção
de seu rosto.
O avô se apressa na distribuição dos presentes e, na saída,
ainda uma vez é agarrado por Pedro, pelas pernas: "Espera o vovô
chegar! Ele já vem!". Papai noel, olhando de banda, explica que
tem muitos presentes para entregar. e se vai.
Dez minutos depois, Henrique está de volta. Há papéis
rasgados por todos os lados, as crianças parecem pintinhos ciscando no
lixo. Camilla conta a novidade: "Papai noel chegou, vô!".
Pedro olha atentamente para o avô e grita: "Descobri uma coisa!"
Todos olham atônitos para o menino.Certamente, descobriu a identidade
de papai noel. O menino completa: " O vovô, quando ficar velhinho,
vai ser papai noel...Sabe por quê? Eu fiquei olhando bem para ele. Essa
pinta do vovô, perto da orelha é igualzinha a dele!" Todos
riram.
Na televisão, já anunciavam a proximidade da meia-noite. Começará
a missa do galo. Todos se abraçam e por fim, as delícias preparadas
para a ceia. As crianças brincam no chão e não demonstram
o menor sinal de sono. Os olhos fundos da dona da casa, denotam cansaço
pelo dia exaustivo.
A campainha é tocada e pela varanda veem um mendigo no portão
do prédio. Alguém replica: "Deve querer dinheiro para a pinga
natalina". Pedro retruca: "Nada disso! Vai abrir o portão,
vô! É Jesus! Olha a barba dele! Ele chegou para cantar o parabéns!"
A avó explica que é um pobre pedindo esmolas. Pedro, simplesmente
responde:
"Ora! Se Jesus quando bebê, era pobrezinho, nasceu no capim, perto
do boi e do burro, agora, depois de grande, também é pobrezinho!"