A Garganta da Serpente
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Sede

(Pam Orbacam)

Lembrei-me de coisas bobas. Do primeiro beijo, da inexperiência sexual refletida na boca salivante transbordando de secreção vaginal por entre as coxas da esposa do vizinho no chão do quintal de terra úmida de chuva, do esguicho de água do dentista daquela única vez em que estive num consultório dentário...

Meus lábios antes secos, agora estavam úmidos de sangue devido às rachaduras. Eu passava a língua áspera pelos lábios e recolhia o sangue vorazmente. Também abria e fechava a boca ao máximo repetidas vezes para que meus lábios secos se rachassem e sangrassem ainda mais, e lambia, lambia vorazmente o sangue. De vem em quando eu parava por alguns minutos para que os lábios voltassem a secar (e torcia muito por isso) e então repetia o ritual de auto vampirismo.

Meus pés descalços pisavam no chão duro de terra seca onde antes era um rio, mas hoje parecia um grande paraíso de pedaços de ovos de chocolate de páscoa. Pascolândia. Bom, muito bom! Meus pés descalços no chão duro e quente provavelmente provocariam o aparecimento de bolhas. Estava ansioso por esse momento, pois a ideia de cravar os dentes nas bolhas e chupar a sua água para saciar a sede só não me fazia salivar porque meu corpo já era uma uva passa.

A língua grossa e seca dentro da boca era como uma serpente a me engolir de dentro para fora e as raras vezes que eu urinava, tinha o cuidado de recolher na cuia empoeirada cada gota do precioso líquido. Era preciso beber de imediato a urina quente, antes que evaporasse.

Quando demorava demais a urinar e a língua grossa estava seca a ponto de sentir cada poro de papila gustativa, punha-me a me masturbar. A ejaculação forçada custava a vir. Era necessário buscar nas gavetas ressequidas do meu cérebro lembranças distantes dos fartos seios cheios de leite de minha esposa já levada pela seca, assim como foram os meus filhos. E a lembrança do mais novo sugando esfomeadamente seus seios que minavam leite viscoso que escorria pelos cantos da pequenina boca facilitavam o escasso gozo, que também era cuidadosamente recolhido na cuia urinada.

Eu me bebia sempre que possível, fosse qual fosse o líquido expelido pelo meu corpo. Eu eliminava líquidos corpóreos que eram imediatamente recolocados de volta no meu corpo através da boca sedenta sem saliva.

Lambuzava-me e regozijava-me com "bebidas" que jamais imaginei beber.

Minha urina tinha o sabor da melhor das cachaças, meu sêmen o sabor do mais rico leite de cabra e degustava meu sangue como se fosse o melhor dos vinhos tintos dos deuses.

E segui, assim como seguiu a seca, até o dia em que eu sequei e caí no chão da Pascolândia junto aos ossos de minhas cabras.

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