Logo que cheguei ao campo, quis conhecer o lugar. Fui com o meu cãozinho
vira-lata passear pelas redondezas. O esplendor verdejante das árvores
ofuscava-me. Subimos e descemos por todos os lugares que não tinham cercas,
até que topamos com uma encruzilhada. A terra era batida e vermelha e
só de olhar o lugar em volta, quieto, um arrepio percorreu o meu corpo.
De repente meu cãozinho assombrou-se com alguma coisa. Um vento levantou
uma poeira fina e densa e partículas de pó dançaram rodopiando,
levantando folhas secas, arrancadas das encostas de arbustos, que estalavam
um som musical de assobio. A poeira fina entrava nos cantos todos. Colava na
pele, entranhava nos cabelos que se emaranhavam entrelaçando os fios
num trançado louco de carrapicho. Meus olhos se fecharam num desespero
de dor, pois tinha sido invadido pela poeira. Era só um cisco, mas valia
por mil. Por entre as pálpebras semisserradas, eu vi, ali de sentinela,
no meio da poeirada toda, uma figura desassossegada a medir-me e a rir de meu
medo. Eu estava ali, como uma criança apavorada, por não entender
de sombras e daquele risinho fino e constante que se mesclava com o vento. A
poeira chicoteava o ar, riscava minha pele já toda lanhada. Por medo
e precaução sussurrei engasgada: Valei-me meu Deus, abra esse
vento e espalha o pó no tempo!
E no meio daquele reboliço, vi com a certeza que carrego comigo, ali
no meio de tudo, ele, lindo, rindo para mim, descruzando os braços, que
pareciam dar muitas voltas em seu dorso. Foi estendendo lentamente suas mãos
de homem. Encolhi-me de pronto e fechei mais ainda os meus olhos que enxergavam
mesmo fechados. Quando criei coragem, abri os olhos ainda doloridos pela invasão
de poeira e vi naquela desordem de ventos, ele, pinoteando e rastejando no meio
de uma labareda de fogo, gritando o meu nome. Colei no chão, paralisada,
sem forças nem para respirar. Abri meus olhos que definitivamente se
livraram do cisco pelo bafejar daquela coisa estranha que agora era uma nuvem
de poeira a se diluir no vento. Foi sendo levado, dançando um balé
macabro e no instante exato de seu sumiço, vi o seu pé girando
em círculos. Era um casco de bode.