Helenice não sonhava mais em encontrar a felicidade plena. Ficar "contentinha"
já estava bom demais. Imaginar-se cara a cara com o gênio da lâmpada
era sua fantasia preferida. Três pedidos, e a certeza que "talvez"
viesse sua tranquilidade.
Certeza do talvez é dose, mas já é alguma coisa! Não
ia pedir nada mega. Sem essa de acertar os seis números na sena, sem
essa de ter o Brad Pitt.
Um homem fiel e viril, uma empregada que não fosse pra justiça
do trabalho e não engordar com absolutamente nada.
Nesses três englobava todos. Se o cara é fiel acabou a solidão
dos sábados à noite, se viril, supre o tesão mal resolvido,
se tem uma empregada, é óbvio que pintou uma "graninha",
se não engorda mais, pode entrar em butique, privilégio das astênicas,
sonho sonhado há anos.
A economia que faria com a terapia, com a munição de diet e light,
levaria a concretização do outro sonho, conhecer Miami. Deus salve
a América, né Deborah Secco?
Já era de vez a tal aspiração da anistia internacional
da mulher, anistia sim, pois até agora fomos exiladas neste planeta.
Ela era vinho da safra dos anos 50, onde o mundo se preparava para mudança
do milênio. Em 2000, "com certeza", a mulher não mais
seria alvo de tanta babaquice.
Cresceu com essa sensação, que a profecia do Nostradamus era
uma verdade parcial. Não acabaria o mundo, mas o domínio de um
sexo, o masculino, esse prenúncio sim, era líquido e certo.
Em 2001, seria mais uma lenda do folclore, que o sexo feminino foi frágil,
que felicidade feminina era casar e ter um monte de filhos, que mulher ideal
era exclusivamente do lar, que lavar e passar foi cargo de domésticas
vindas do interior, aliás, nem teria diferenças regionais, que
ter amantes em homem era qualidade de garanhão e em mulher defeito de
ser piranha, que para se ter equilíbrio emocional tinha-se que se equilibrar
na balança, de preferência manequim 38, e mais ainda, que para
se vencer na vida precisava-se contar com os favores do destino ou do patrão,
dono do destino.
Queimar sutiãs seria um fato histórico como as grandes cruzadas,
não de pernas à Sharon Stones, cruzadas da antiguidade, que mudaram
o mundo. Mudaram????
Este ano vai fazer cinquenta, esse escreve por extenso os algarismos.
Separada do Alfredo que a trocou pela secretária de 26, manequim 36,
que deu aquela cruzada pra ele.
Sozinha com sua caixa de bombom, (mais 3 quilos adquiridos), vendo América
na TV com a Secca, ops, Secco, espera os 3 filhos "aborrecentes"
chegarem da night, jogarem as roupas no chão, quem vai encarar o tanque
é ela, pois a doméstica tá na justiça, foi despedida
por ter queimado um sutiã, não como protesto, mas como desleixo.
Vidinha de merda essa. Sobrou-lhe, apenas, o direito de sonhar com o gênio
e mandar o Nostradamus pra puta que pariu. Por que o mundo não acabou?
Pelo menos Alfredo estaria morto.
Se profecia nenhuma ia ser cumprida, devia ter ficado calado, cara. Só
podia ter vindo de um homem. O Nostra era um tremendo de um machão.
(2005)