Olá a todos! Como vão? Para aqueles que não me conhecem
meu nome é John
kennedy
da Silva... e eu sou esse corpo ensanguentado
estirado no chão. O motivo para que eu esteja nessa situação?
Eu contarei mais tarde. Preciso me concentrar agora. Minha cabeça dói
muito. Muito mesmo. Nunca pensei que ferimento de bala ardesse. Mas arde. Mais
que merthiolate. Olha pra mim aqui avoado de novo. Onde eu estava mesmo? Ah,
sim! Minha atual situação. Bom, para entender o que aconteceu
comigo acho melhor vocês conhecerem um pouco sobre mim.
Meu nome, John kennedy da Silva. Ele é uma homenagem óbvia ao
famoso ex-presidente dos Estados Unidos na década de 60: JFK. O fato
mais marcante em relação à passagem de Kennedy pela Casa
Branca foi seu assassinato ocorrido no Texas, em 1963. O mais impressionante
é que, até hoje, não se sabe quem, de fato, o matou. Fala-se
em diversas conspirações, envolvendo desde terroristas até
o próprio governo americano. Chegaram a prender, inclusive, um bode expiatório
que, convenientemente, foi assassinado logo depois de sua prisão. Bom,
mas deixa isso pra lá. É passado. O que interessa é que
essa tragédia comoveu não apenas os americanos, mas milhares de
pessoas por todo mundo, e meu pai foi uma delas. Eu nasci em 23 de novembro
de 1963, um dia depois do assassinato. Foi quando meu nome, que já tinha
sido escolhido, foi trocado para JK da Silva. Meu pai dizia que eu teria o mesmo
sucesso que ele. Coitado. Se soubesse que a única semelhança entre
nós seria o tiro levado na cabeça, talvez me desse outro nome.
Se bem que Wellington era o nome preferido de minha mãe. Tava ferrado
de qualquer jeito.
Bem que eu podia ter tido uma vida parecida com a de John Kennedy. Dinheiro.
Fama. Inteligência. Mulheres. Ou alguém acha aqui que eu tive a
competência ou a sorte de traçar uma Marilyn Monroe? Acho que só
de vê-la eu já daria um tiro na cabeça. Que mulher. Por
falar em tiro e em cabeça, voltemos ao meu caso. Peço desculpas.
Está difícil controlar meus pensamentos. Sinto minha força
se esvaindo cada vez mais. Bom, a verdade é que JFK e eu não temos
nada em comum além do que já foi citado. O cara era carismático
demais, entrava em um salão e todos paravam para escutá-lo e admirá-lo,
já eu fiz mais inimigos que alguém pode querer em uma vida. Quando
eu entrava em um lugar, todos paravam também, só que para me xingar
ou me bater. Vida de pobre é difícil, quando esse não tem
caráter então, fica insuportável.
"Talvez por isso que você esteja aí quase se afogando em seu
próprio sangue", vocês devem estar pensando. E podem estar
certos de que é exatamente isso. Eu sempre busquei, inconscientemente,
um final trágico para mim eu acho. Só não imaginei que
seria dessa forma. Quantas vezes não me imaginei chegando em casa e recebendo
de minha "adorável" esposa uma xícara de café
banhada em arsênico. Vendo seu sorriso no rosto através de uma
visão já embaçada, enquanto cambaleava para o repouso final.
Algumas mulheres não perdoam traição. Vocês nem sabem
quantos cafés o Barnabé, nosso cachorro, tomou quando era vivo.
Tantos, que acabou morrendo. Coitado. Insônia crônica. Estivesse
vivo hoje, com certeza estaria me fazendo companhia nesse momento, enquanto,
claro, lambia todo o sangue espalhado à minha volta.
O Matos, meu sócio, então. Sempre esperei dele algo
bom,
na verdade, dele sempre esperei algo meio que parecido, meio traiçoeiro,
me atacando por trás com uma paulada na cabeça. O motivo seria
mais que óbvio, além de eu roubá-lo constantemente, minha
esposa, apesar de intragável, tinha uma bunda
Porra, posso falar
com tranquilidade
uma bunda que nem a Marilyn Monroe tinha! É
Sr. Kennedy, nessa particularidade aqui, seu genérico brasileiro deu
um banho em você. Olha, a bunda era tão boa, mas tão boa,
que eu to aqui deitado no chão com um tiro no cucuruto, e tô gastando
meus últimos respiros pensando nela. É, se meu sócio me
apagasse seria por causa daquele belo par de almofadas.
Outro que eu sei que adoraria me apagar era meu filho. Isso mesmo, meu filho.
Pra vocês verem só como minha vida não era a moleza da minha
versão americana. Claro que eu tenho minha parcela de culpa, afinal não
é todo mundo que come a própria nora. Mas chegar ao ponto de jurar
de morte o próprio pai por causa disso? Aí, acho que é
exagerar, vocês não concordam? Porra, mulher tem várias!
Pai é só um! Além disso, vocês não conheceram
o pedaço de mau caminho que era a Darlene, Deus a tenha. Aquela menina
tinha mais fogo no rabo que o diabo no inferno. Jesus. Cheguei até a
ter um taquicardia em um de nossos encontros. Devia ter morrido. Morrer com
o rosto enfiado em um par de seios seria bem mais prazeroso do que
GASP!
do que ficar aqui com esse sangue preso na língua. Já tentei me
virar, várias vezes, mas meu corpo não me obedece. Acho que é
o fim se aproximando.
Agora chega de falar
estou cansado
com sono
muito sono
sinto que chegou minha hora
droga! Cadê a Cida? Justo hoje a empregada
resolve atrasar! Queria ter forças para lhe contar tudo
Que cansaço
a cabeça não dói mais como antes
não acho
que isso seja bom
O que foi isso? Um barulho! Será que é
a Morte já vindo para ceifar minha alma? Ouço passos
é
ela
com certeza é ela
Ai! Minha cabeça! Quem que está
berrando desse jeito? Ai, minha cabeça de novo. Ué? A Morte não
grita. Deve ser outra pessoa então. Cida! Você chegou! Tento gritar
para chamar atenção: Cida! Cida! eu penso, mas a boca solta apenas
grunhidos sem sentido. Que triste é terminar falando a língua
dos porcos! Na mesa!
Olha na mesa!
eu tento alertar, mas não
tenho mais forças. Agora sim a Morte chegou. Cida, por que você
não fechou a porta, mulher de Deus? Céu ou inferno? Cara ou coroa.
Droga! Deu coroa.
A mulher de pele negra e enrugada ainda gritava em desespero pedindo socorro.
Os vizinhos começaram a aparecer enchendo a sala de curiosos que encaravam
aquele corpo sem vida. Um deles, fã incondicional de C.S.I., pedia aos
outros, cuidado com a cena do crime. Qualquer mudança poderia influenciar
diretamente as investigações policiais. Quem teria feito isso?
- ele se perguntou ao levar a mulher transtornada para sentar-se à mesa
da sala. Saiu em busca de uma água com açúcar e quando
voltou avistou um pedaço de papel em meio às frutas que decoravam
a mesa. Pegou o pedaço de papel e sentou. Certas notícias não
deveriam ser recebidas em pé. Já imaginava seu conteúdo.
Tomou coragem e abriu o papel:
QUANDO MUITOS O QUEREM MORTO, TALVEZ O MELHOR MESMO SEJA MORRER!
Nada mais.
Caso resolvido, concluiu, desapontado, o homem.