A Internet trouxe um tipo de dor nova. Implantada. De silício. Suplício
ainda mais paradoxal que a distância física. Uniu os semelhantes;
e os dessemelhantes também. Trouxe no seu bojo de bits, de bytes, homens
binários, recalques virtualmente quebrados, desassossegos potenciais,
e a prevalência da imagem sobre a sensação. Meu sorriso
se fez um caractere, e eu o acariciei com os meus dedos. Aliás, com eles,
exerci o meu tato, no mundo da mais real ilusão. Matrix. Senti e o senti
assim tão branco, desenhei meu abandono, digitei coragem... o fiz com
toda a emoção dos meus 20 gigabytes! A sensação
foi morna, e vibrante; real, virtual... fez-se encontro. Olhinhos acenderam
nos chats do coração. Então, a comunidade trouxe flanêur
novo. Cibernético. Que no começo do século anterior inebriava-se
da velocidade urbana. E se alimentava dela. Só que o mundo correu mais
que ele, e volatilizou... os sentidos. Homem perdido. Memória piscando....
minhas dores... ouço o barulho ao fundo: minha mp3 é que chora.
www.assimnaoda.com.br. Quis encontrar, tendo toda rede... eu virando peixe.
Quis fugir. Forçar o destino. Comprei umas cartelas da dor nova e mandei
que entregassem em casa. Fui no Google, pesquisei "cadê o homem?".
Encontrei monte deles. Mergulhei fundo, só que fora, dentro de mim. Alimentei.
O hd do meu fosso. Disco rígido compactando solidão. On line.
Out of me. A Internet trouxe um tipo de homem novo. O mesmo. Velhos, desvalidos,
famosos. Desempregados, workaholics. Os desolados. Mendigos sentimentais. Intelectuais,
políticos. De esquerda, de direita, centro-qualquer-coisa. Os que guerreiam.
Os que chacinam. Os que pacificam. Os românticos. Mentes brilhantes. Autistas.
Normais, anormais. Sem-rótulos. Os preconceituosos.Sem segmentos. As
crianças. Os que buscam. Encontram? E perdem. Tragam. E fumam. O acaso.
Espécie de fumaça, sem cheiro, e um pouco mais instante.
Hipertexto. Sem texto. Hipermídia. Sistemas de informação.
Departamento de Defesa norte-americano. Protegendo a guerra. Fria. No coração.
Tecnologia e rudimentos. Burguesia. Consumindo a enxaqueca. "Brinquedo
novo!" A dor no início. Janela se abrindo. Não sabia que
era ela. Eu virei peixe. Na rede.
Encontrei o desencontro. Eu precisava escrever. Deflagrei uma dor linda por
dentro. Usei o instinto. Os meus fios de silício. Sendo o meu outro tão
irreal no mundo, quis entendê-lo. Fora dele. Escrevi meus zeros, meus
uns, meus zunszunszuns... joguei minha rede. O mar todo convulso... de botos
humanos, sentindo a dor nova. Ela nem doeu, doeu no implante. Na máquina.
Nas interfaces gráficas. E o que acontece quando a dor nova da gente
se junta? Vira alegria doída? Dois peixes numa noite suja. Um teclando
o outro.