Primeiro a conheci por acaso, ela se encontrava vestida singelamente num canto
da livraria onde eu costumava frequentar... passei a voltar lá todos
os dias para revê-la, cada dia com uma desculpa mais absurda. Dormia e
sonhava com ela, acordava suado e só sossegava com um banho de água
fria. E ela tomava conta da minha vida gradativamente... até que, cego
na minha obsessão, tirei-a daquela livraria e levei-a para minha casa.
Possuí-a ali mesmo, numa ânsia desesperada, querendo trazê-la
para dentro de mim...
Desde então não fazia mais nada se ela não estivesse comigo.
Passei a levá-la em todos os lugares e apresentá-la aos meus amigos.
Entretanto, quando notei que alguns se interessavam por ela, meu coração,
em vez de sangue, pulsava fel nas minhas veias, e passei a escondê-la
em locais sempre mais absurdos, de modo que só eu a visse. Comecei a
frequentar todas as livrarias e bancas onde ela poderia estar, entre um
copo de cerveja e uma música chula.Quando a avistava, uma cortina de
ódio me descia sobre os olhos e arrancava-a violentamente do lugar depois
de uma cena de escândalo. E quando alguém a mencionava, chegava
em casa irado e brigava com ela por horas...
Um dia, ela apareceu em um outdoor, inteira, nua, aos olhos de todos. Pontos
vermelhos espocavam nas minhas vistas. Enlouqueci. Delirei. Investia contra
todos que se atreviam a olhá-la - não podia, era minha!...Não
me lembro muito bem o que houve, só sei que minhas vistas escureceram
e apareci no céu... É muito bom aqui, só não gosto
de alguns remédios. Mas ninguém lê e isso me deixa satisfeito
porque ela é só minha, e só eu sei disso.