A Garganta da Serpente
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Crianças...

(Tania Montandon)

Sentada na calçada, descalça e esfregando os olhos com as mãos sujas de terra, chorava, chorava, chorava por horas a fio a garotinha que parecia ter por volta de cinco anos de idade. Não, não era uma criança abandonada, espancada ou perdida. Estava bem em frente a sua casa e deixando os irmãos, pai, mãe, tios, primos, desorientados sem saber o que tinha acontecido e já tinha passado um bom tempo e nada da menina se cansar do choro sentido. É verdade também que a pequena já era famosa nessa área de manhas e choros. Então uma tia, a mais impaciente, andando de um lado para o outro da casa, decidiu que resolveria a situação. Sua testa não parava de suar de tanto caminhar pra lá e pra cá. Nessa época os refrigerantes e chocolates eram um luxo muito raro e somente oferecido em ocasiões especiais. Porém, essa tia impaciente trabalhava na fábrica de guaranás e sempre tinha prestígio com a garotada porque ela que distribuía os doces e refrigerantes nos aniversários e demais festas. Nesse dia, por impulso e contrariando as regras, pegou um guaraná pequeno, furou a tampa lavada, enfiou um canudinho e levou pra menininha chorando. A garota na mesma hora parou de chorar, soluçou, pegou a geladinha guaraná agradeceu e começou a beber. Ufa!!! Todos, antes contrariados, deram os parabéns para a sabida tia e até as outras crianças nem ficaram com ciúmes pedindo pra elas também, tamanho era o estresse geral na casa. Todos voltaram a rir, conversar e esperavam que ao terminar o refrigerante ela estaria de volta dentro de casa. Para a surpresa geral, a molequinha terminou calmamente seu guaraná, colocou-o ao lado com cuidado para deixar a garrafa em pé, lambeu os beiços e disparou a chorar mais alto que antes. Pronto! A confusão dentro da casa recomeçou, uns queriam ir lá gritar e mandar calar a boca, mas a maioria não deixou, afinal era uma criancinha pequena e claro que tinha suas razões pra tanta choradeira. Como o tempo não passava, os ponteiros do relógio pareciam congelados e os berros não diminuíram, o jeito foi usar a arma infalível, a carta que sempre se tem por baixo das mangas para emergências como essa. Foi a vez da tia mais adorada da criançada, porque ela era muito compreensiva, paciente e tinha muito carisma. Sentou-se ao lado da menina, tentou um cafuné e quase caiu pra trás com a altura que o berro chegou. Tudo bem, resolveu conversar. Puxa, você deve estar sentindo muita dor, coitadinha da sobrinha mais linda da titia. Quem ou o que foi que fez essa barbaridade com a minha princesa? Por que você está chorando? A menininha fez uma cara meio assustada, engoliu o choro, soluçando e com a face lambuzada de lágrimas, suor, terra e guaraná e foi se acalmando. Então, ainda soluçando alto, olhou para a tia e disse: nã...glup...o...n~.glupão..glup...não...glup..s..glup...seglup...sei..glup

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