A cama estava fria, mas ainda assim ela sentou-se e espalhou as fotos todas
pela cama. Ao olhá-las um filme começou a passar na sua cabeça,
as lembranças vinham como um tufão que a deixava tonta a ponto
de quase desmaiar. As imagens das fotos se misturavam com os gritos de desespero
na sua cabeça. Começou a suar e a chorar. Chorava lágrimas
tão frias e salgadas que sentia a sua pele ressecar e agonizava pela
cama como um porco prestes a ser abatido. Parecia que mil facas entravam em
seu coração. O ar estava escasso. Podia ter a sensação
do sangue quente escorrendo pelas suas mãos.
Uma mão áspera e fria tocou de leve em suas costas e Rapina deu
um pulo. Virou para trás e a figura daquele homem desfigurado com uma
tesoura na mão fez seu corpo ficar tão branco quanto o lençol
da cama. Tentou gritar mas não conseguia, estava dura como uma rocha.
Seus únicos movimentos eram as tremedeiras involuntárias de todos
os músculos do corpo. Havia vários homens desfigurados e mutilados,
porém estranhamente seus olhos eram mais vivos do que um tigre a 120
quilômetros por hora.
Os homens estavam todos nus e seus olhares variavam. Alguns a olhavam com um
desejo que jamais vira. Eles tinham olhos queimando de tesão e suavam
testosterona. Rapina conhecia muito bem aquele cheiro.
Havia três homens na sua frente. Eles a olhavam como se quisessem pular
em cima dela e como cães ferozes, arrancar seu coração
e comê-lo. Tinham olhos vermelhos e a qualquer momento parecia que iam
estourar. Tinham garras com unhas enormes que pareciam querer entrar na sua
pele e rasgá-la. Rapina sentia seu rosto ressecar cada vez mais.
Sentiu seu lado direito ser tocado por outra mão gélida. Era outro
homem, este com um olhar de pena e ao mesmo tempo indiferença. Seu olhar
fazia o coração dela disparar tanto que parecia sair pela boca.
Todos eles começaram a se aproximar com sussurros de orgasmo que a excitavam
e ao mesmo tempo a apavoravam. Sentia incontáveis mãos tocando
seu corpo e a levando lentamente.
Quanto mais lento seu corpo era levantado mais tremia e sentia repúdio
de si mesma. As lágrimas salgadas escorriam e eram tantas que começaram
a ressecar os seus lindos seios.
Rapina foi colocada de joelhos em um chão de pedras perfurantes. Pressionaram
seu corpo para baixo com tanta força que ela foi pregada pelos joelhos
no chão como um quadro na parede. Os gemidos aumentavam ainda mais e
isto começou a esquentar seu corpo. A lágrima cessou.
Entrava em um êxtase emocional tão grande que não sentia
que haviam posto algo em seu pescoço. Começou a gemer ainda mais
alto que os homens. Tinha seus olhos fechados. O tremor de medo se fora e agora
experimentava o tremor do gozo.
Seus gemidos aumentavam. Estava tendo orgasmos que nunca havia tido antes. Foi
quando dois homens se olharam e sinalizaram.
Um homem com a boca desfigurada, sem um braço, com o nariz queimado e
de cabelo raspado puxou a corda.
Foram ouvidos, nos seguintes trinta segundos, ruídos das juntas do pescoço
se descolando. Havia um maremoto de sangue saindo da sua tão apreciada
carne.
Rapina acordou repentinamente e um pouco tonta. Que sonho esquisito, pensou
ela. Havia tido muito trabalho com aquele homem e se cansara a ponto de cochilar
um pouco. O que não era de costume.
Ela olhou para o lado e lá estava o corpo desfigurado em meio ao matagal
do Amazonas. Sentiu uma felicidade imensa nesse momento. Teve vontade de gritar,
havia feito um excelente trabalho com aquele homem. Tirou algumas fotos de vários
ângulos e guardou a câmera. Mais um. Sua coleção de
corpos vingados, como costumava chamar suas vítimas, estava aumentando.
Tirou seu pequeno espelho da bolsa e viu que seu rosto continuava de um anjo,
seu sorriso era de uma princesa pronta para ser cuidada. Olhou para os seios
só para ter certeza de que aquelas sensações não
passavam de ilusão e começou a sair da floresta. Até pensou
em pegar o mapa, mas havia estado lá tantas vezes que conhecia o caminho
de volta.
(2º lugar no concurso de contos da Faculdade de Tecnologia e Ciências, Salvador, 2007)