isolado em seus próprios pensamentos, ruminando as inumeráveis
vozes do passado, correlacionando ideias, impressões, sensações
atingindo ápices internos sutis e inenarráveis do mais puro prazer
intelectual, tão contrastante com o prazer mundano, o infinitamente desejado
e cada vez mais distante prazer do contato, do contágio, do externo que
se interioriza.
Abandonando-se diante dos outros, ouvia suas vozes, acompanhava os lábios
em seu frenético movimento de exteriorização das profundezas
íntimas complexamente traduzidas em palavras, frases, sentenças
linguagem
um texto solto ao vento, ansiando comunicação
mas não oferecendo mais do que facetas, pequenas, insuficientes
Não prestava mais atenção nas palavras, ficava atento
apenas aos lábios, à entonação, às delicadas
variações na postura, nas linhas do rosto, nas emanações
subjetivas que, na falta de melhor denominação, convinha chamar
de aura. Usava as palavras, tanto ouvidas quanto proferidas, apenas quando não
era possível o contato dos corpos e os demais detalhes revelavam-se insuficientes.
(E como lhe era precioso esse contato
esse encontro de corpos, essa intimidade
física que tanto comunicava, algo tão essencial e tão violentamente
carregado de significações arbitrárias quase impossíveis
de burlar, tanta sacralização para algo tão simples: corpos
se tocando, tornando aquela cansativa e desanimadora tradução
da linguagem tão desnecessária
)
Portanto pouco falava, cansava-se facilmente daquele ato maçante de
traduzir. Sabia que essa atitude condenava-o exatamente àquilo que mais
temia, mas aquele contato ineficaz das palavras chocando-se e dissipando-se
no ar, aqueles textos que melhor caberiam em paginas escritas do que entre dois
seres de carne e sangue, tampouco serviam para aliviar aquela sensação
terrível de isolamento
desejava comunicação, contato,
de uma forma tão intensa que as palavras, tão limitadas, jamais
poderiam traduzir.
Parecia frio e distante diante das pessoas que, intimamente, desejava, mas
essa frieza ocultava uma chama viva e radiante que ameaçava consumi-lo.
E como poderia explicar sem a abertura para o toque, a permissão do contato,
da intimidade física, da comunicação direta, sem intermediários?
Como poderia traduzir a magnífica complexidade que sentia em sua mente
e entranhas, todo aquele aterrador e esfuziante infinito que era o seu eu verdadeiro
e desprovido de máscaras, enquanto estivesse limitado ao ridículo
vocabulário verbal?
Melhor calar, então
ouvir, olhar, sentir
admirar o tocante
esforço das pessoas atrapalhando-se em traduções grosseiras
que pouco dizem, tecendo máscaras tão complexas e ilusórias,
falando e falando e falando incessantemente, enquanto seus olhos, seus corpos,
seus gestos e atos falhos revelam aquele desejo profundo e primordial: simplesmente
tocar, romper as fronteiras entre si e o outro diretamente, sem quaisquer intermediários,
deixar de ser apenas um indivíduo para se tornar parte de algo maior,
complexo, íntimo
impossível de traduzir nesse texto pobre,
feito de meras palavras