A Garganta da Serpente
Entrevista com Cobra entrevista com nossos autores
Entrevista com:

Agostina Akemi Sasaoka

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- Agostina Akemi Sasaoka -

Entrevista concedida a Rodrigo de Souza Leão nosso habitante para o Balacobaco


Agostina Akemi Sasaoka nasceu em Campinas, São Paulo em 1977. Começou a estudar desenho e pintura antes mesmo de se alfabetizar. Assim que aprendeu a ler e escrever, começou a devorar todos os livros que encontrou pela frente e começou a escrever seus primeiros poemas e canções. Estudou flauta doce e formou-se no curso técnico de piano.
Em 1995, mudou-se para a cidade de São Paulo, para cursar a Faculdade de Direito da USP, no Largo do São Francisco. Depois de formada, começou a trabalhar profissionalmente com a Internet, como webmaker e depois como webdesigner e arquiteta de informação.
Publicou seu primeiro livreto "Poros" no final de 1997 e desde fevereiro de 1999 administra o website literário "A Garganta da Serpente", dedicado à divulgação de novos talentos.


Como surgiu o site?
A Garganta se abriu na madrugada de 18 de fevereiro de 1999, trazendo a Serpente. Começou como um site estritamente pessoal, no intuito pretensioso de divulgar o que chamo de minha poesia. Fomos rastejando devagar, entre as hospedagens gratuitas, começamos a receber visitas e poemas de todos os cantos do Brasil (e até de outros países) e a necessidade de crescer foi tão natural quanto impossível de deter. Atualmente, o trabalho de divulgação literária está em primeiro plano.
Por que o nome e a temática do site tem a haver com as serpentes?
Digo no site que "o sol me fez taurina e a lua de 1977 me fez ofídio". Pois bem, a Astrologia diz que o principal órgão dos regidos pelo meu signo solar de Touro é a garganta. Por outro lado, no signo lunar do meu ano de nascimento (mais conhecido como horóscopo chinês), sou serpente (ou cobra, como queiram). Desde que andei estudando um pouco mais sobre meu signo lunar, acabei assumindo o símbolo milenar da serpente como meu animal protetor, talvez numa espécie de xamanismo inconsciente.
Na hora de fazer o site, fiquei dias e noites em crise pensando num nome, algo que me identificasse sem que incorresse naquelas obviedades do tipo "website pessoal da Agostina". O nome surgiu por acaso - talvez ele estivesse sempre ali, esperando que eu tropeçasse nele.
Nas primeiras versões do site, havia serpentes espalhadas por todos os lados. Recebi muitos e-mails de pessoas com pavor de répteis, cuja curiosidade precisou vencer o medo de explorar o site. Para não assustar mais as pessoas e tornar o site mais democrático e convidativo, as imagens de ofídios foram desaparecendo aos poucos. Afinal, "A Garganta da Serpente" não era mais um site pessoal, ou o meu site pessoal, já tinha se tornado uma entidade com vida própria, que periodicamente troca de escamas, de acordo com os desejos e anseios de nossos visitantes e hóspedes.
Para que serve a poesia?
Digo sempre que "ler" é inspirar, "escrever" é expirar. Eis a única maneira de manter-me viva.
A poesia, bem como a escrita em geral, serve talvez como meu melhor canal de comunicação como o mundo exterior.
A poesia lhe dá o direito de ser quem você quiser e permite que você se exponha com tal franqueza que o torna plural. Poesia serve para ousar, para opinar, para provocar, para questionar, para despertar algum tipo de reação em seu interlocutor (seja ela emocional ou intelectual)... Enfim, poesia, para mim, serve para viver.
O que é necessário para um texto fazer parte do seu site?
Na "Garganta da Serpente" impera o livre arbítrio. Prefiro que a triagem dos trabalhos seja feita pela autocrítica de cada um. Não me permito tais julgamentos subjetivos nem me considero apta ou suficientemente tola para fazer críticas literárias. Há muita qualidade embora também tenhamos começado a ter quantidade. E não me preocupo com isso: os autores têm absoluta liberdade para solicitar a publicação ou a exclusão dos seus trabalhos. Já tive alguns "habitantes" que pediram para retirar seu nome e seus textos do site e, meses depois, retornaram com um trabalho muito superior. Confio e acredito na evolução natural dos nossos autores e o fato de terem o trabalho publicado e submetido à apreciação popular faz com que cresçam - e essa é uma oportunidade preciosa para todos.
Por quais sites mais navega na internet?
Desde que me formei em Direito na USP, comecei a trabalhar profissionalmente com Internet. Inicialmente, como webmaker, montando as páginas dos sites. Depois de um tempo, tornei-me webdesign. Por causa da minha profissão visito todo tipo de site, de todo tipo de assunto. Todavia, obviamente, preferia ter mais tempo para navegar em sites literários e artísticos.
Como vê o fenômeno BLOG?
Tudo o que contribui para que as pessoas escrevam cada vez mais é muito bem-vindo. O exercício periódico da escrita parece funcionar muito bem para muitas pessoas, principalmente para àquelas que se julgam incapazes de uma boa redação.
O livro em papel será substituído pelo e-book?
Teimo em acreditar que não.
Não consigo imaginar a humanidade privada do prazer de folhear um bom livro, sentir a textura das páginas, os relevos da capa, o cheiro das tintas recentes ou do pó das bibliotecas, sem improvisar marcadores ou usar as "orelhas" dos livros... E por enquanto, os livros continuam sendo mais agradáveis e confortáveis aos olhos do que a tela dos computadores e podem ser levados sempre conosco, para qualquer lugar...
Qual o papel do escritor na sociedade?
Provocar sensações, subverter valores, questionar prazeres. A preocupação de um escritor não deve ser a brincadeira de expor-se, mas a delícia de desconsertar. Seu papel é escrever mais e melhor e sem censuras ou pudores. Os escritores devem ser as vozes inquietas da sociedade.
Você escreve? Quais são as suas influências literárias? Quem está lendo? Quem você leu?
Tento escrever (e ler) sempre que o tempo permite. É quase uma necessidade biológica. Quando me percebo imersa nessa correria louca, nessa falta de tempo quase crônica, confesso que me sinto um bocado "desnutrida"...
Como poemas são mais curtos e rápidos de escrever que contos ou romances, vou ajuntando milhares de papeizinhos com poemas e versos inacabados. De tempos em tempos, procuro colocar um pouco de ordem no caos. Mas confesso sentir falta de me dedicar mais à prosa.
Li muito, desde muito pequena: todos os livros infantis, infanto-juvenis e adultos que caíam em minhas mãos. De Rute Rocha, Marcos Rey, Ganymedes José e Rubem Alves a Fernando Pessoa, Maiakovski, Gorki, Youcenar, Clarice Lispector, Ítalo Calvino, Baudelaire, Ferreira Gulart, Edgard Alan Poe... Recentemente tenho lido pouco: há uma pilha de livros enviados pelos hóspedes e visitantes do site do lado da minha cama. Um dos últimos livros que comprei e gostei muito de ler foi "O Deus das pequenas coisas" da escritora indiana Arundhati Roy.
Para quem daria um nobel?
Provavelmente para ninguém.
Quem tem legitimidade suficiente para decidir quem merece um Nobel?
Acho que eu quisesse brincar de Deus e ter o poder de decidir e julgar, estaria usando meu diploma de Direito.
Qual a relação que você tem com Luz Del Fuego?
O que sei sobre Dora Vivacqua é que ela foi uma daquelas pessoas que precisavam ter nascido para sacudir as estruturas da sociedade.
Acho que minha relação com ela pode ser classificada como hereditária: minha mãe era chamada de Luz Del Fuego pela minha avó e pela minha bisavó, devido a sua incorrigível mania de ficar andando praticamente nua pela casa... Dessa maneira, cresci num ambiente onde o uso de pouca ou nenhuma roupa sempre foi permitido. Aprendi desde pequena a encarar a nudez com muita naturalidade. Obviamente, o fato de ir para a escola perturbou um pouco meus conceitos. É engraçado, mas as primeiras coisas que aprendi na escola diziam respeito a moral, convenções, discriminações, desigualdades e sobre como temos que viver dentro do "socialmente aceitável". As crianças aprendem logo que não somos todos iguais. Enfim... demorei um tempo para me refazer desse turbilhão de imposições e regras e voltar a ser eu mesma. De vez em quando, minha mãe me lembra de Luz Del Fuego, quando estou flanando nua pela casa (adoro ficar assim por um bom tempo depois de tomar banho).
Faz pouco tempo que fiquei sabendo que ela tinha um casal de jibóias (Cornélio e Castorina). Sinceramente? Não pretendo criar cobras em minha casa: de serpente já basta eu!
Tem algum mote ou epígrafe?
Sempre que estou esmorecendo, lembro-me de Ezra Pound (em "Canto 81"):
"O que amas de verdade permanece,
o resto é escória
O que amas de verdade não te será arrancado
O que amas de verdade é tua herança verdadeira
(...)"

(2002)

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