A Garganta da Serpente
Entrevista com Cobra entrevista com nossos autores
Entrevista com:

Cláudio Alex

  • aumentar a fonte
  • diminuir a fonte
  • versão para impressão
  • recomende esta página

- Cláudio Alex -

Entrevista concedida a Rodrigo de Souza Leão nosso habitante para o Balacobaco


De onde tirou a idéia de criar um E-Zine no Brasil?
Antes de criar o Poesia Diária, em 1995, eu participava ativamente de diversos BBS. Entre eles estava o Centroin BBS. Havia no Centroin um grupo de pessoas que gostavam de poesia e era uma prática nossa divulgar poemas de nossa autoria e/ou poemas, textos, enfim, compartilhávamos coisas de nosso interesse e prazer com os demais. Fazíamos o mesmo com música, cinema e outros aspectos culturais.

Naquela época eu estava voltando a escrever poemas e contos. Vários aspectos de minha vida particular concorriam para que eu estivesse num momento de sensibilidade exacerbada e escrevi diversos poemas de amor. Também estava envolvido com a música e cantava em um bar no bairro de Laranjeiras, no Rio de Janeiro, onde muitos do BBS costumavam, também, freqüentar.

Naquela época ainda não havia a internet que há hoje, mas logo surgiu. E utilizando o próprio Eudora, antes mesmo de ter uma lista de discussão, eu distribuía poemas para e-mails de pessoas de meu relacionamento. E fui fazendo amigos.

Em 12 de agosto de 1996 surgiu o Poesia Diária. O Centroin BBS me deu uma lista de discussão e a partir dali comecei a enviar, todos os dias, uma coletânea de poesias para aqueles que assinavam o e-zine. O e-zine foi divulgado em quase todos os jornais do Brasil e em pouco tempo o Poesia Diária tinha mais de 5.000 assinantes.

Em agosto, agora, está fazendo 6 anos da criação do Poesia Diária.
Como surgiu o nome Poesia Diária?
O nome Poesia Diária surgiu expontaneamente na minha cabeça. O e-zine nunca teve outro nome. Sempre, desde o começo, teve esse nome. E, se um dia voltar a existir, terá esse mesmo nome. As vezes penso em retomar o Poesia Diária. Mas desanimo quando penso que a cultura neste País terceiro mundista é algo muito secundário. E acaba sendo para mim também, pois tenho que correr atrás da sobrevivência. Trabalho muito. Cerca de 18 hora/dia, sem fins de semana. E ainda vivo entre São Paulo e Rio. Vou e volto toda semana.
O que anda fazendo Claudio Alex?
Como muitos sabem eu sou professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas, entidade ligada oa IBGE. Além disso eu estou trabalhando em um projeto pessoal de educação utilizando a tecnologia computacional e redes de comunicação. O projeto chama-se Ponto-Futuro e quem quiser pode dar uma olhada no site http://www.pontofuturo.net . Estou desenvolvendo esse projeto há cerca de 3 anos.
Por onde anda o poeta Claudio Alex?
Não tenho a pretensão de ser um poeta. Um poeta é aquele que escreve continuamente. Eu nâo. Escrevo esporadicamente quando tenho uma motivação para tal. Isso vai e volta. No momento eu não ando escrevendo nada. Só textos didáticos e artigos técnicos sobre educação e sociedade do conhecimento.
Quais boas recordações guarda das listas de discussão e do PD?
Listas de discussão pertencem ao meu cotidiano. Ainda hoje participo de muitas, sobre os mais diversos temas, sempre culturais. Do Poesia Diária eu tenho recordações nostálgicas. Às vezes boas, às vezes ruims. Eu vivia aquilo de uma forma muito visceral. Entreguei-me completamente àquele trabalho, aliás, eu não sei trabalahr de modo diferente. Fiz amigos, conheci muitas pessoas. Muitas pessoas gostam e sentem saudades de mim. Outras, tenho certeza, me detestam. Eu me acostumei a ser assim em minha vida tenho amigos e pessoas que me detestam. Como sempre detestei a mediocridade, tenho poucas relações frias. Ainda bem.

Outro dia me colocaram em uma lista de discussão sobre erotismo. Caramba... prá quê! Era aquela coisa de sexualidade primária, sentimentos pueris e falta de percepção da amplitude maior que deve envolver os relacionamentos. A sexualidade não pode, jamais, tangenciar o vulgar. Deve ser um contato permanente com o divino, pois, afinal de contas, é através da sexualidade que se perpetua a nossa existência. A expressão de nossa sexualidade deve ser, assim, revestida de beleza e emoções positivas. Mas naquela lista tudo parecia sexualidade totalmente perversa. Foi uma experiência desagradável, pobre, e que me levou a cair fora.
Como encara os e-zines atuais e as formatações em html? Os emoticons vão morrer?
Olha... eu não tenho visto muitos e-zine atualmente. Apenas a família do Balacobaco é que eu mantenho, romanticamente, uma relação duradoura. Claro que as facilidade de edição em html e, melhor ainda, as novas plataformas dinâmicas e interativas, trazem novas dimensões que contribuem para a disseminação da beleza - ou da feiúra, depende da arte. Particularmente, eu sou adepto de tudo que crie facilidade de comunicação. Sou totalmente absorvido pela sociedade do conhecimento e, creio, ser através dela que irá se desenvolver uma sociedade mais equânime e desenvolvida. Hoje em dia podemos criar um CD em casa, podemos fazer artes visuais em nosso computador e colocar isso na Rede. E isso tudo não é mais de ninguém. É da sociedade,ou seja, da sociedade do conhecimento. Não tem sentido falar em direitos. Quem é dono de quê? Na verdade reproduzimos e desenvolvemos uma arte interativa. Uma arte em sociedade. E o mesmo vale para a ciência. Portanto, arte e ciência, são conhecimentos que não nos pertencem como indivíduos. Como Heráclito dizia, o tudo é nada e o nada é tudo. Ou seja, nada nos pertence e tudo nos pertence. A arte e a ciência são, pois, bens sociais.
Pra onde caminha essa tal de internet?
Para onde ela caminha? Ela nunca caminhou. Ela não tem pernas. É, no sentido estrito e amplo do termo, um meio. Nós é que caminhamos através dela. Nela temos noção do grande e do pequeno convivendo em nós. Nessa via nós temos oportunidade de crescer e diminuir. Podemos ampliar e estreitar nossos horizontes. Podemos amar melhor, podemos conhecer o universo numa abordagem holística. Podemos ser o que somos.

A internet não existe mais. Nós criamos uma rede ainda mais ampla e que nos levará, acredito, aos limiares de um universo sem fronteiras. Há, pois, uma incoerência maravlhosa em tudo isso. Estamos aprendendo a ser pessoas sem limites.
Quem é o poenauta brasileiro?
Não existe. Existem pessoas que se expressam e recebem feed-backs. Pessoas que procuram a sua identidade. E, quando alçam um vôo pleno, a perdem de vez. Afinal, identidade é um estereótipo imposto por uma cultura que já era e já foi. Libertar-se dos grilhões de ser alguma coisa para simplesmente ser é, talvez, a grande libertação. É uma verdadeira teologia.

O problema de todo iniciante é encontrar a sua identidade. E um dia descobre - de improviso - que nunca irá encontrá-la. E esse dia é o verdadeiro nascimento de um novo ser. Uma transformação dialética do sentido de existência. Identidade a gente não encontra nunca. Ainda bem, pois é na diversidade de ser é que se encontra a verdadeira riqueza. Quando nos livramos do fardo da identidade é que descobrimos o significado de ser. É uma libertação de nossa maior prisão: a prisão de nós mesmos.

E nesse dia surgirá um poeta, quem sabe.
O que deve ter um web site para que Cláudio Alex sempre volte a ele?
Não saberia dizer. Tem que ter alguma forma de riqueza e afirmar aquilo que eu não sou. Ou seja, tem que ser algo que me faça voar ou mergulhar. Conhecer estratosferas ou profundidades. Tem que ser beleza concreta ou abstrata. É uma relação de amor. A gente encontra e vive. E passa a ser nosso. A gente incorpora à nossa existência aquilo que a gente ama.
Quando volta o velho Poesia Diária?
Nunca. A gare a que se volta nunca é a mesma. Ali não estão as mesmas pessoas, nem as mesmas filosofias. É isso mesmo: um poema de Álvaro de Campos.

Mas, sempre haverá algo maior e melhor a ser feito.

(2002)

Copyright © 1999-2020 - A Garganta da Serpente