A Garganta da Serpente

Clayton Gustavo Granemann

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Veja só!

Perdido...
Sem rumo...
Descalço...
Faminto...
Sem eira nem beira!

Uma multidão passa ao meu redor!
E daí?
Ninguém tá preocupado comigo!

Sou o despido de cultura...
O desprezado de amor...
O infame coitado...
Um bandido em potencial!!!

Bandido?

É! Sou um bandido!
Eles têm razão!
Chega de ser honesto, agora vou me apropriar do que não é meu!

Estou decidido!
Agora sou ladrão...
E dos bons!

Mas o que roubar?

Ah! É claro...

O que "eles" mais têm de precioso...
O tempo!
O que "eles" mais têm medo de perder...
O amor!
O que "eles" mais sentem quando perdem...
A atenção!
O que "eles" mais dão valor...
A aparência!

Ficou fácil!

Pois, são muito vulneráveis estes seres "ilustres" !

Ou... eu é que sou esperto!

Bingo...!

Cheguei a conclusão que na verdade eu causo inveja a "eles" !

Vivem atropelados pelo tempo...
Ou a falta dele...
Correm em busca de um amor...
Ou ficam parados esperando... esperando... esperando...

Fazem tremendos alardes...
Para chamar a atenção...

Gastam o que não têm ...
Para manter a aparência...

Coitados!
Tenho dó!

E eu continuo aqui...

Perdido...

Ninguém me conhece...
Mas sei que somos irmãos!
Alguém já falou isto...
Mas nem todos se lembram!

Não tenho compromissos...
Portanto...
Mantenho-me perdido a pensar...a pensar... a pensar...

E eu continuo aqui...

Agora sem rumo...

Escutei uma vez...
Passando por uma casa...
Uma voz que dizia...
"se correr o bicho pega, se ficar o bicho come..."

Me apavorei!
Olhei pros lados e arregalei o olho!

Tratei rapidinho de decidir...
Preciso saber onde está este "bicho"!
E passei a viver escapando... Escapando...escapando...

Deste "marvado"!

E eu aqui...

Descalço...

Nossa!
Nunca tinha reparado...
Mas, é tão bom viver descalço!
Sabe por quê?
Porque não deixo rastros...
Tem coisa melhor?
Andar...andar...andar...
E ninguém saber por onde pisei!

E eu continuo aqui...

Faminto....

Isso é cruel!
A fome!
Que tristeza!
Tenho muita fome!

Vivo a procurar migalhas de pão do amor...
Não descanso enquanto não comer o bolo da paz...
Me esperneio pra encontrar a broa da felicidade...
Mantenho-me atento para o fermento da pureza...
Trato de me esforçar pra encontrar um restinho de suspiro da bondade...

Bah! Como é difícil passar fome...
Enquanto não encontro a vovozinha detentora desta receita...
Sobrevivo passando fome!
Procurando...procurando...procurando...

Sem desanimar!

E eu continuo aqui...

Sem eira nem beira...

É o que "eles" pensam...
Esta minha falta de eira e beira...
Que "eles" intitularam ...
Pra mim...
Isso tem outro nome!

Liberdade!

"Liberdade, liberdade, abre as asas sobre nós!"

Vou confessar que as vezes sinto falta de uma eira...
E sou louco por uma beira...

Minha casa é este mundão velho!
Meus amigos são os meus pensamentos...
Minha família são os bichos...
Menos aquele da música...
Este eu vivo atento!

Não tenho coberta...
Pois tenho calor!
Não tenho cama...
Pois tenho barrancos!
Não tenho pressa...
Pois tenho amor!

Ah!
Importante...
Quando me encontrar...
Pode cumprimentar!

Se tiver tempo...
Pare pra prosear!

Você ainda não me conhece?

É mesmo!
Esqueci de me apresentar...

Eu sou uma lâmina d'água parada!
Um vidro espelhado!
Um metal brilhante!

Qualquer coisa que reflita a imagem de quem me enxergar!

(7 de julho de 2005)


(Clayton Gustavo Granemann)


voltar última atualização: 09/01/2009
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