ENCONTRO DE RIOS
Tão doce quanto suas águas
que num antigo varadouro
abrigaram a Galeota,
se espraia o rio Beberibe...
Tem memórias de prisão:
sua rota limitada por pedra de cantaria
disfarçada por dez arcos
( que obra de engenharia!!! )
onde sua água escorria
por dezoito lindas bicas
e fugia em muitos barcos.
Se espraia o Beberibe
e corre, foge, liberto
em direção ao Recife;
seu roteiro não se inibe:
vai em busca de um encontro
( pois há muito marcou ponto )
com o rio Capibaribe.
Vai seguindo seu destino,
rente ao Forte do Buraco
e estanca em desatino:
apesar de tanto mato,
de tanta falta de trato,
se banhando em suas águas
revê Madame Bruyne
curtindo flamengas mágoas.
Atrás de si deixa morros,
beleza que nunca finda:
eterna Villa d'Olinda ...
Alcança em breve as areias
das terras Fora de Portas:
com tristeza repentina
pressente o sangue no chão,
vermelho, no pelourinho
chamado Cruz do Patrão.
Agita-se em desalinho :
malassombros vagam, choram,
gritam ais, estendem a mão...
e o rio, que nem um menino,
se assusta, molha o chão
onde foram espancadas,
torturadas e enterradas
as vítimas da escravidão!
Ferve a vergonha em seu peito,
e sonha ver branca vela
de barcaças noutro rio,
lá no Poço da Panela:
era o moço Mariano
defendendo os homens negros,
dando fuga e proteção,
pondo fim à humilhação ...
E surge o Capibaribe,
serpenteando, barrento,
se arrastando pelo mangue,
se torcendo, quase exangue,
apesar de ter bebido
todo aquele mar de sangue
que num passado perdido
jorrou de heróicas batalhas
(invasor e insurreto
em seu leito fez mortalha!)
Trombando em febril abraço
celebram aquele encontro
(há muito tempo agendado)
em toda sua grandeza:
bem no local que o Friburgo
virou Campo das Princesas...
Misturando as suas forças,
vem doçura, vem tristeza,
revivem tudo o que um dia
mergulhou na correnteza
e unidos seguem seu rumo,
como manda a natureza
e por viverem embalados
em doce e suave cântico
geram em seus ventres molhados
um mar, o oceano Atlântico.
(abril/2002)
(Flor)
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