A Garganta da Serpente

Francisco Coutinho

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O corpo

A dança afortunada desta noite que me torna à raiz.
Te direi quem sou para te enfeitiçar,
Sou um xamã de brios em singe,
A vermelhidão das noites frias,
Tenho a garganta atada por desejos e caminho entre eles,
Nasce um madrigal laçado por bestas infernais,
Tais cães lazarentos que rosnam em tumbas do meu ego,
Bestialidades que atormentam meus cancros seres,
Pavilhões que desagregam as vidas ideais,
Vejo a morte no espaço cru de uma carranca pregada à cara,
Lúgubre fossa que cheira ocre e representa verminose,
Relicário de santos imorais, paladinos suntuosos, basiléias e vestais,
Tenho virgens que esporram sua seiva reprimida,
Vejo a estrela no ânus de uma jovem embevecida,
Em espasmos epiléticos que magnetizam o olhar,
Sou a forma esquizóide de um demônio atarefado,
Tablaturas de uma senha cabalística que decifro,
Passageira madrugada que esgarça a carne,
Ecos da noite que invade,
Não resta dúvida, o prazer é maior que o homem,
A tórrida catarata de desejos, a fúria dos planetas, o sangue de fraquezas endêmicas,
Estou em destroços e alabirintadamente atado,
A certeza do impossível e o nada que desmascara a pele enganadora me tornam são e voraz de viver,
Sou bruxo e xamã e assim tem de ser,
A noite que corrói a pele enganadora ecoa diante da fartura de pesares e pensamentos,
Sigo a rota sonora e danço como neófito na transgressão do verbo,
Vômito que liberta,
Frenesi do corpo telúrico,
Ao destino da chaga,
Ao inferno da realidade castrante,
Ao senhor patriarca de sete chifres que ri de mim e que me humilha em demasia,
Cuspo em tua face arauto de coisa nenhuma, e crio um deus pra mim mesmo para depois blasfemá-lo e matá-lo, pois assim tem de ser.


(Francisco Coutinho)


voltar última atualização: 05/11/2007
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