A Garganta da Serpente

Inaldo Tenório de Moura Cavalcanti

  • aumentar a fonte
  • diminuir a fonte
  • versão para impressão
  • recomende esta página

A Quatro Vozes

Para Elizete Galvão
Evenilde Veras
Raquel do Monte
Rosemary Carlos

Elevo meus olhos para o palco,
o arco onde se arma o relevo
caminhando livre para o deleite;
a vida regada a mel e leite.

A alma canta, a arte brinca
como um brinco a bailar em
viagem matutina no arco-íris
de cores e desejos infantis.

Ao monte subi na primeira
nota que acordou o momento:
céu formado de palavras-cimento,
cores água nas asas lépidas

de um pássaro encantado
soltando cores ao vento;
acendendo o canto no silêncio
neblinando o verde do mato.

Ah, canta pássaro livre
desnuda teu canto nos braços
abertos da luz, no cristal puro
da foz do brilho na escuridão.

Os olhos cantam em celeste
campo iluminado, iluminando
as almas agora prenhes de música,
rasgo no lume da criação.

Cria... sonho e realidade, concreto
no abstrato afago do Criador,
a reluzir em meio a chuva de ocasião:
pétalas umedecidas no orvalho da manhã.

Os pássaros cantavam a seu tempo,
fazendo escorrer gotas escarlate na
cachoeira de sons angelicais do âmago
límpido de criaturas divinas.

Uma chuva fina caía lá fora
(talvez fazendo silêncio para que
o universo bebesse o nécta do canto
a fazer rogos de pacificação).

Nos braços de Schumann me recostei
qual criança em doce acalanto;
e saltitei feliz a brincar descalço em
terreno no quintal de Amadeus.

Olhos fechados, ouvia instrumentos
e me sentia em um jardim imenso
onde floriam plantas melódicas
fazendo voltas na escala da criação.

A quatro vozes o concerto prosseguia:
Criador e cria de mãos dadas
corriam pela estrada abrindo espaço
para o homem sentir o cheiro puro da vida.

Espaço inebriado do doce afago da canção
despertava o coração em chamego de amor;
e o tempo, em risos infantis, contava
histórias de vozes em celebração:

do paraíso surgiam como relâmpagos
em compassos lentos a transpirar aroma
suave para o alimento vivo da alma humana
no templo santo da louvação.

Bebi o nécta e me deliciei...
A água correu mansa no rio da noite.
Foram quatro mulheres e uma voz:
a doce e terna voz da criação.


(Inaldo Tenório de Moura Cavalcanti)


voltar última atualização: 19/09/2006
11004 visitas desde 01/07/2005
Copyright © 1999-2020 - A Garganta da Serpente