Letícia
Em meio aos delicados sons dos trovões,
aos gritos sussurrados de desespero
mórbido,
Letícia adormeceu.
Começou logo a sonhar.
Seus delírios apocalípticos
deixavam-na mais leve
leve, leve, leve...
Era uma borboleta de fogo
voando em direção ao
sol
perdendo-se na luz ofuscante.
Numa irresistível necessidade
de estar só
encontrou-se nua
num branco infinito
esparramada
olhando para o céu.
Sem noção começou
a cair
cair, cair, cair...
Flutuando em meio a músicas
filmes e imagens
pessoas e lugares.
Sentiu-se como uma navalha
rompendo a pele ainda quente
inaugurando a entrada da loucura
com brechas irrisórias e despretensiosas.
E no infinito branco
uma imagem pulsante
quente.
Assentou-se após a queda
e viu sua nudez pálida
num mar,
num mar de pétalas de rosa.
Vermelhas,
vermelhas como a paixão
vermelhas como o ódio
como a raiva.
Mas a floresta vermelha
começou a liquidificar-se
gota a gota
afogando Letícia
num mar de sangue.
A borboleta de fogo mergulhou,
tentou tirá-la daquele mar
de emoções contraditórias
mas Letícia deixava-se levar.
Pouco a pouco
os sons voltavam.
A água da chuva
com seu tilintar frio e compassado.
As sirenes
os gritos
e os passos apressados.
Letícia ia se despedindo
encerrando sua viagem insólita.
Com um leve sorriso nos olhos
e nos lábios.
Os pulsos abertos
o sangue na cama
e uma lágrima caindo
levando consigo
a alma de Letícia ..
(Jim Bates)
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