Alma? Que alma?
Tu entendes tua alma?
O que fazes calado num canto do mundo, observando o movimento estrapolado ao
teu redor?
Por que não abrevias esse caos sem membros que mesmo assim te envolve
de fora para dentro?
De fora para dentro, qual foi o último instante que nada te tocou intrinsecamente
ao ponto de inexistir mesmo fustigado pela insistente tentativa de troca de
outrem para contigo?
Com que astúcia foste ao âmago da tua miséria, contradizendo-te
no tufão que te encontras, sem a percepção e a compreensão
dos teus bombásticos templos silenciosos e reverteste uma situação
vil?
De teu sorriso amarelado, podes já, no reflexo de teu corpo te declarar
livre ao acordar para sentir o sabor de não precisar te explicar para
viveres intensamente?
Num vasto e óbvio clarão à tua frente, pudeste enxergar
ou foste ofuscado por tua própria ciência?
Sempre dividido - sem saber dividir - aprumou-te num rumo inimaginável
que te deixaria por inteiro tocar outra ou, até mesmo, tua alma?
Quando, mesmo tendo a resposta em tua carne, tiveste coragem de sugar o sumo
de teu próprio e de outros corações?
Quando dominaste - mesmo na derrota - aquilo que é proibido, inquestionável
e indizível?
Por que essa fera mórbida na jaula que se abriu, ao cair da noite, bem
quando acordavas?
Entendes já tua alma?
(João Cony)
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