A Garganta da Serpente

Juliana Valis

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SUUM CUIQUE TRIBUERE

Tu que escolheste a hora mais certa
No momento mais certo
Com as letras mais certas,

Tu que apreendeste o sentido das horas
Embora o sentido do mundo
Nunca houvesse proporcionado risos,

Tu que arriscaste a vida em prol do amor
Em tempos de estupidez e ganância
Ou em momentos sem fé e sem cor,

Tu que sempre procuraste a bondade
Apesar dos prós e dos contras
Da tristeza e de cada homem covarde,

Tu que nunca sucumbiste ao delírio
Das horas de dor e de angústia
E ao desalento de qualquer martírio,

Tu que anunciaste a esperança
Com a alma mais pura
Como se ainda fosses criança,

Tu que almejaste à felicidade
Embora apenas houvesse tristeza
Acompanhando teus passos,

Tu que lutaste contra a injustiça do mundo
Embora a guilhotina estivesse direcionada
Inexoravelmente contra ti mesmo,

Tu que sempre choraste
Tu que sempre pediste
Como se fosses um traste
Como se fosses tão triste,

Tu que sempre quiseste
Tu que sempre sonhaste
Com um idílio campestre
O próprio amor de guindaste,

Tu, cidadão de ferro e de fé,
Que sempre pagaste as contas em dia
Ainda que o dia apenas te trouxesse
Fome e lágrimas quaisquer,

Tu, cidadão de corpo e de alma,
Que nunca sucumbiste à maldade da noite
Ainda que a noite apenas te rendesse
Insônia e desilusão que não acalma,

Tu, cidadão da arte e do medo,
Que sempre foste ridicularizado
Por seres bom e diferente dos padrões
Que confrontam teu fiel segredo,

Tu, cidadão do sonho de agora,
Ainda que o mundo apenas te rejeite
E leve cada sentimento teu embora
Nunca faças do amor mero enfeite
Nunca percas o destino e a hora

Tu, cidadão desprezado e à margem,
Ainda que o mundo apenas te entristeça
E arranque de ti a dádiva e a coragem
Nunca percas o sentimento e a cabeça
Nunca desfaleças, em vão, na viagem

Tu, cidadão da arte e do bem gratuito,
Ainda que o mundo apenas te agrida
E te aflija em cada combate fortuito
Nunca te esqueças de teu amor pela vida
Nunca permitas que passe a fé num minuto

Tu, cidadão de bem e de paz,
Ainda que o mundo esteja em guerra
E te machuque de modo vil e voraz
Nunca destruas o que há de bom nesta Terra
Nunca corrompas o que a vida te traz

Pois um dia o amor reinará soberano
E fará da justiça a mais sábia rainha de luz
Dando a cada um o que é seu, sem engano,
Enaltecendo a verdade que a esperança conduz

E nesse dia em que o amor ocupar o seu trono
Será inútil todo o dinheiro ou título do mundo
Será inócua a vaidade e, enfim, o seu dono
Chorará todas as lágrimas do precipício profundo.


(Juliana Valis)


voltar última atualização: 14/10/2006
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