A Garganta da Serpente

Kátia Drummond

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MEU VERSO

Não sigo normas que sabotam a poesia.
Transgrido regras, leis gramaticais.
Rompo os grilhões que me amordaçam a língua.
E desaponto os que de mim esperam
preciosismos intelectuais.
Os que inventam versos, os que não criam.
Os que, acorrentados, não vadiam.
Impostores da frase e da expressão.
Os que maculam a alma do poeta.
Os que corrompem a língua da nação.

Meu verso vem da rua. Vem da praça.
Vem da criança esfomeada e nua.
Da adolescência triste, amortecida.
Meu verso vem da dor, vem da desgraça.
Do grito do mendigo na avenida.
Da mãe que chora a dor do filho morto.
Meu verso vem do povo, vem da vida.

Meu verso vem de pedro, de joão,
de lurdes, de joana, de maria.
Do bêbado cantando à luz do dia.
Do louco adormecido na calçada.
Vem do migrante, esperançoso e aflito.
Meu verso vem do coro dos sem-nada.
Daqueles que precisam do meu grito.

Meu verso vem dos negros, vem dos índios.
Do sertanejo. Vem dos favelados.
Vem dos idosos, dos abandonados.
Dos que vagabundeiam, andarilhos.
Vem dos malditos, amaldiçoados.
Do maluco de rua, dos drogados.
Das putas, dos ladrões, dos maltrapilhos.

Não vem do intelecto. Vem da alma.
Não vem dos livros. Vem do coração.
Vem da evidência. Da intuição.
Do dia-a-dia. Da observação.
É simples. É comum. É verdadeiro.
Meu verso é a voz do povo brasileiro.
O BÊ-A-BÁ da língua popular.
Sem lei. Sem regras. Sem erudição.

(Salvador, Bahia, Brasil)


(Kátia Drummond)


voltar última atualização: 30/12/2009
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