tempos febris
pedaços de sol sobre as costas marcadas
pedaços de trem entre as cabeças lotadas
homens apinhados de vento nas ventas,
a fumaça nas fuças: ônibus e cigarros
nada mudaria: reproduções, cópias baratas
nada mudaria porque a mudança é muda, fica engasgada
na garganta de uns poucos operários da razão quase desfalecidos,
mas o cansaço é doloroso demais e a burrice é um suspiro
a burrice é uma brisa amena, uma folha de sabor pingando néctar
artificial, porém doce, e não arderá o sol causticante
nas costas encurvadas de tanto apanhar
as sacolas apinhadas de reclamações, recomendações:
faça isso, não faça
aquilo,
seja assim ou assado
vão fixar o peso sobre as pestanas quando a noite prometer
mil mensagens esquecidas
fecharemos os olhos porque é inútil ver inatingível
não quereríamos o impossível porque é sempre muito
longe
e amanhã
pedaços de rodovias sobre as cabeças engarrafadas,
trânsito intenso de idéias rotineiras,
os transportes que não levam a lugar algum
a velha triste ladainha dos urbanóides ambulando
o cinza das esquinas é sempre mais agradável
do que qualquer revolução.
(Maiara Gouveia)
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