A Garganta da Serpente

Marcel Franco

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MENINO-BAMBU

Ele me contava histórias
Num tempo de eu moço
Tinha sonhos vazantes
E os olhos metidos no sol

Suas palavras cheiravam
Resina fresca das manhãs
E seu contar-cantar alegre
Me desfolhava risos

Ele tinha um nome
Que me fazia guardar silêncios
Que me perfumava a memória

Seu nome, no âmago terra, eu pus
E já não me lembro como ele se chamava
Nem em quantos florais seu nome ida hoje reverbera

Lembro-me dele como ponta de luz cristalina
Que faz furinho no lenço matinal
Ele era homem real sobre irrealidade
Sarça ardendo (sem se consumir) no fogo

Com-força, dia-a-dia, amiúde
Recordo uma coisa por ele dita,
Aliás coisa demais bendita:
"Vou subir bambu!"

E num dia-ido
Ele foi-se indo pelos astros
Sem que fosse percebido

Quando dei por falta
Já estava longe demais
Foi-se indo imerso em poesia

O menino subiu no bambu e abraçou o Sol
Deixando uma saudade difícil de dizer
E um amor mais torrencial
Que as muitas chuvas que choram comigo em janeiro

Menino-bambu, eu entendi tua vida
E tu me entendeste
E me fizeste amar
O risco das estrelas

Desculpa, amigo,
Eu sei que você não me ensinou
A contar saudade

(Belém/PA, 05.01.2010)


(Marcel Franco)


voltar última atualização: 19/04/2017
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