Crepúsculo
Eu sempre fui amigo dos estios,
Dos longos dias claros e sadios,
Da Cigarra, do Sol, que a vida encerra,
Que alegra a luz e que fecunda a Terra.
Mas estou hoje num estado d'Alma,
Tão de indolência e calma
E tão avesso às emoções bizarras,
Que não quero saber de sol nem de cigarras...
Nada de força, de vigor, de músculos,
De desejos agudos,
Nem dos desatinos
A que, às vezes, me atiro,
De alguma estranha fantasia nova;
Hoje de alegrias e vigores domo
E prefiro
À meia-tinta morna dos Crepúsculos,
Num macio carinho de veludos,
A plangência católica dos sinos,
Num fim de tarde, quando a luz repousa,
Ou então, qualquer coisa
Como
N'alma de um violoncelo a surdina da trova.
Olho este fim de tarde e esta sombra que desce
E em tudo alonga e tece
A trama tênue de seu véu de luto...
A alma sentindo evocativa e boa,
Emocionado, escuto
O saudoso rumor do dia que se extingue
E o dia azul que foi, apenas se distingue,
Por um resto de luz que nas alturas sobra,
Por um sino que dobra
Ou uma asa que voa.
(Mário Pederneiras)
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